Anatel troca multa por investimento
Telefonia. Parecer foi feito especificamente para um acordo firmado entre a agência reguladora e a Telefônica, mas abre espaço para que a Anatel feche negociações do mesmo tipo com as demais empresas do setor; para tribunal, decisão favorece consumidor
O Tribunal de Contas da União decidiu que a Anatel poderá trocar as multas aplicadas às operadoras de telefonia por investimentos no setor.
O Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) poderá trocar as multas aplicadas contra as operadoras de telefonia por investimentos no setor. A decisão da Corte foi tomada a partir do termo de ajuste de conduta (TAC) que havia sido firmado entre a agência e a Telefônica, negociação que envolve investimentos que podem chegar a R$ 4,8 bilhões, em vez das multas que chegavam a R$ 2,2 bilhões.
O voto relatado pelo ministro Bruno Dantas e acompanhado pelos demais membros do TCU abre espaço para que a Anatel firme o mesmo tipo de acordo com as demais operadoras. A decisão é vista pelo tribunal como favorável para usuários de telefonia, uma vez que o pagamento efetivo de multas pelas empresas é irrisório, por conta de infindáveis questionamentos administrativos e judiciais.
Havia dúvidas se o tribunal deveria, de fato, deliberar sobre acordos firmados entre a agência e as empresas do setor. “O tribunal entendeu que, como se trata de um processo de negociação bastante complexo, é preciso estabelecer salvaguardas para que, não apenas se faça com que o interesse público se- ja satisfeito, mas também que haja mais transparência e fundamentação técnica no processo decisório da Anatel”, comentou Bruno Dantas.
A liberação para que a agência faça seus acordos com as operadoras veio acompanhada de dezenas de determinações e recomendações de mudanças no processo de negociação e fiscalização dessas transações.
O TCU quer que a Anatel estabeleça “cláusulas com pontos de controle periódicos ao longo da vigência do TAC”, com metas e indicadores de acompanhamento e “previsão de aplicação de sanções por descumprimentos dessas metas parciais e em caso de retrocessos persis- tentes”.
O tribunal deu prazo de 30 dias para que a agência faça os ajustes previstos nos acordos já firmados, submetendo essas mudanças à aprovação pelo conselho diretor da Anatel. “Tendo em vista a baixa efetividade na arrecadação de multas aplicadas pela Anatel, tanto no âmbito administrativo quanto na fase de execução fiscal, a celebração de TAC pela agência com previsão de conversão de mul- tas em apuração por obrigações de investimentos atende ao interesse público”, declarou Bruno Dantas em seu voto. O ministro acrescentou, porém, que a conversão só terá êxito se “precedida de estudos técnicos sólidos, da definição fundamentada do ajuste de conduta pretendido e do rol de obrigações assumidas, e de análise de custo-benefício do instrumento.”
Suspensão. Em maio do ano passado, a Anatel aprovou uma proposta de TAC para a Oi, permitindo a troca de R$ 1,2 bilhão em multas por R$ 3,2 bilhões em investimentos. A proposta foi suspensa pelo TCU logo após o pedido de recuperação judicial da companhia. O total de dívidas da companhia com o órgão regulador seria de R$ 20,2 bilhões, de acordo com a Anatel. A Oi, por sua vez, calcula que deve R$ 11 bilhões.
Segundo o TCU, os dados disponibilizados pela Anatel e atualizados até 2016 apontavam que estava em tramitação na autarquia um total de 37 pedidos de celebração de TAC, envolvendo vários processos administrativos da agência relacionados a multas. A primeira rodada de acordos será alvo de acompanhamento do tribunal. Procurada pela reportagem, a Anatel não se manifestou sobre o assunto até a publicação deste texto.
Por meio de nota, a Telefôni-
“Tendo em vista a baixa efetividade na arrecadação de multas (...) a celebração de TAC pela agência com previsão de conversão de multas por investimentos atende ao interesse público” Bruno Dantas
MINISTRO DO TCU
ca Brasil informou que acompanhará as determinações do TCU. “A empresa acredita que a decisão tomada hoje pelos conselheiros do TCU é mais um passo na direção da assinatura do TAC, que contribuirá para reduzir a desigualdade digital no Brasil”, declarou a empresa.
Para Eduardo Tude, presidente da consultoria Teleco, especializada no setor, o principal ponto da decisão é a mudança de postura do TCU, “mais adequada ao momento atual”. Segundo o analista, a resolução do caso sinaliza que o TCU pode não barrar outros processos importantes para o setor.
Um deles é a análise da reversão das concessões de telefonia fixa, previstas caso a reforma da Lei Geral de Telecomunicações seja aprovada no Congresso. Atualmente, o projeto está parado no STF, por conta de uma liminar. “É um processo que pode destravar investimentos ainda maiores”, alega Tude. /