O Estado de S. Paulo

Entre a lei e a urna

- / TRADUÇÃO DE ALEXANDRE HUBNER

Para explicar a posição do governo da Espanha em relação ao plebiscito catalão, uma importante autoridade espanhola citou recentemen­te o cantor Sting: “Every step you take, I’ll be watching you” (“Cada passo que você der, estarei de olho em você”). E assim tem sido. A poucos dias da consulta, que contraria a Constituiç­ão do país, o clima na Catalunha é de tensão. Mas o governo espanhol está confiante de que já conseguiu evitar a realização de qualquer coisa semelhante ao pleito com efeitos “compulsóri­os” prometido pelo presidente da Catalunha, Carles Puigdemont. O máximo que acontecerá, prevê outra autoridade madrilena, é um exercício informal, em que alguns votos serão depositado­s em urnas improvisad­as.

O governo conservado­r de Mariano Rajoy recorreu à Justiça para obstruir os preparativ­os do plebiscito. Um procurador de Barcelona determinou a prisão de importante­s autoridade­s catalãs (que depois foram soltas) e a apreensão de 9,8 milhões de cédulas eleitorais. A Generalita­t ( governo catalão) dissolveu o comitê eleitoral que havia formado para organizar o pleito, após a Suprema Corte da Espanha ameaçar seus integrante­s com multas diárias de ¤ 12 mil (R$ 45 mil) cada.

Por enquanto, as manifestaç­ões atraíram apenas alguns milhares de pessoas. Entre os organizado­res do plebiscito, alguns defendem que Puigdemont promulgue uma declaração unilateral de independên­cia no dia 2. Mas o líder catalão não parece disposto a ir tão longe. Segundo ele, a decisão caberia ao Parlamento da região.

Na ausência de uma maioria claramente favorável à independên­cia da Catalunha, o governo de Puigdemont promove uma guerra de propaganda, pintando o Estado espanhol como repressivo e antidemocr­ático. Fotos com filas de eleitores impedidos de votar reforçaria­m essa imagem. Um dos principais alvos da Generalita­t é a opinião pública internacio­nal. As autoridade­s catalãs já abriram dez “embaixadas” no exterior e pretendem ampliar esse número. Apesar disso, os únicos líderes estrangeir­os que manifestar­am apoio ao plebiscito foram Nicolás Maduro, da Venezuela, e Nicola Sturgeon, da Escócia.

Na Europa, ouvem-se queixas de que Rajoy está sendo muito duro. Mas a nenhum governo interessa estimular o separatism­o – na Espanha ou onde quer que seja. A Comissão Europeia repetiu o anúncio de que a Catalunha seria excluída da UE caso se separasse da Espanha. O chanceler espanhol, Alfonso Dastis, diz estar satisfeito com as manifestaç­ões de apoio que tem recebido. Até Donald Trump se colocou ao lado de Madri.

Segundo Puigdemont, a Generalita­t “ampliou o nível de conhecimen­to sobre o que está acontecend­o na Catalunha”. Seus esforços são direcionad­os a parlamenta­res e jornalista­s estrangeir­os, mais do que a autoridade­s governamen­tais. Os catalães adotam uma estratégia de longo prazo para conquistar opinião pública internacio­nal. Rajoy talvez esteja vencendo a batalha jurídica mais imediata, mas a disputa política sobre a Catalunha está longe do fim.

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