O Estado de S. Paulo

24 empresas são condenadas por poluir Cubatão

Ação levou 31 anos para ser julgada em 1ª instância e ainda cabe recurso; entre os responsabi­lizados no processo está a Petrobrás

- Giovana Girardi

Em uma ação que levou 31 anos para ser julgada, 24 empresas do polo petroquími­co e siderúrgic­o de Cubatão – incluindo Petrobrás, Rhodia, Cosipa (hoje Usiminas) e unidades que hoje fazem parte da Bunge e da Votorantim – foram condenadas pela Justiça na semana passada pela poluição ambiental e danos à Serra do Mar provocados ao longo das décadas de 70 e 80 por atividades exercidas sem cuidado com o ambiente.

A juíza Suzana Pereira da Silva, da comarca de Cubatão, estabelece­u que as 24 empresas terão de pagar uma “indenizaçã­o correspond­ente ao custo integral para a completa recomposiç­ão do complexo atingido a fim de que este readquira os atributos que possuía antes do proces- so de poluição”. O valor, porém, não foi estabeleci­do, e a expectativ­a é de que essa definição pode levar alguns anos.

Ela atendeu a uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público de São Paulo e pela ONG Oikos – União dos Defensores da Terra, no início de 1986, quando Cubatão sofria, havia alguns anos, um quadro de desolação. No início dos anos 1980, o ar do município do litoral sul paulista era denso, tinha cheiro e cor. Pássaros e peixes desapareci­am. Os poluentes emitidos pelas empresas, depois de subirem para a atmosfera, retornavam na forma de chuva ácida, matando a rica vegetação de Mata Atlântica da Serra do Mar que, no entorno de Cubatão, ficava careca. As árvores viravam paliteiros sem folhas.

A Organizaçã­o das Nações Unidas (ONU) havia decretado que a cidade era a mais poluída do mundo. A relação causal entre a poluição – ou um poluente específico – e casos de anencefali­a, naquela época, apesar das fortes suspeitas, eram mais difíceis de comprovar, mas o impacto ao ambiente era evidente. E, ao demandar a reparação pelos danos da poluição ao ambiente, os ganhos humanos viriam em consequênc­ia: era a expectativ­a dos propositor­es da ação.

O ambientali­sta Fábio Feldmann, que na época era presidente e advogado da Oikos, lembra que a ação é anterior à Constituiç­ão de 1988, quando os direitos ambientais foram mais bem estabeleci­dos, e foi a primeira grande investida contra empresas que na época estavam entre as maiores do País.

“A sentença é um marco na história do direito ambiental, pondo fim a um clamor da sociedade cubatense represado por décadas pela reposição dos danos ambientais decorrente­s da poluição causada pelo polo in- dustrial”, comentou a promotora Nelisa Olivetti de França Neri de Almeida, que liderava o caso recentemen­te.

Empresas. Petrobrás e Rhodia disseram que aguardam a notificaçã­o para se pronunciar­em. A Votorantim disse que apresentar­á o recurso cabível e “reforça seu compromiss­o com o aprimorame­nto constante da gestão ambiental em seu processo produtivo”. A Bunge disse que “o cuidado com os recursos naturais e o respeito ao meio ambiente conduzem as ações” da empresa, lembrou que a senten- ça é em primeira instância e poderá ser objeto de recurso.

O Centro de Integração e Desenvolvi­mento Empresaria­l da Baixada Santista (Cide), que fala em nome das 24 empresas, afirmou que vai “alinhar os respectivo­s recursos visando a esclarecer os pontos levantados na decisão”. Informou também que, “ao longo das últimas décadas, as empresas promoveram diversos investimen­tos em medidas de cunho ambiental que hoje transforma­ram a Serra do Mar em exemplo de programa de manejo e recuperaçã­o ambiental no Brasil e no mundo”.

Problema existente

“A vegetação acabou voltando, mas a decisão é importante porque a ação tinha o propósito de reconhecer a poluição. Na época, as empresas negavam até que a poluição existisse.” Fábio Feldmann

AMBIENTALI­STA

 ?? ALFREDO RIZZUTTI/ESTADÃO-1/4/1982 ?? Fumaça à vista em 1982. A cidade recebeu da ONU o título de a mais poluída do mundo
ALFREDO RIZZUTTI/ESTADÃO-1/4/1982 Fumaça à vista em 1982. A cidade recebeu da ONU o título de a mais poluída do mundo

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