O Estado de S. Paulo

Livro sobre o roubo do Enem expõe omissões.

Obra relata que alertas sobre gráfica foram ignorados; ‘Estado’ revelou vazamento

- Luiz Fernando Toledo

No ano em que o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) vazou e a prova foi cancelada, em 2009, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educaciona­is Anísio Teixeira (Inep), órgão responsáve­l pelo teste, ignorou dois avisos de que a gráfica incumbida da impressão não tinha segurança suficiente. É uma das principais revelações de O Roubo do Enem, da jornalista e fundadora da Associação de Jornalista­s de Educação (Jeduca) Renata Cafardo. O livro será lançado no dia 30, na Livraria da Vila do Shopping Pátio Higienópol­is.

Renata foi a responsáve­l por revelar, nas páginas do Estado, o vazamento do exame. O problema prejudicou 4,1 milhões de estudantes inscritos em todo o País naquele ano.

O escândalo veio à tona depois de uma dupla de golpistas ter conseguido uma cópia da prova e tentado vendê-la, sem sucesso, para a jornalista. Em vez de pagar pela informação, o que é vetado pelo código de ética jornalísti­ca, a repórter marcou um encontro com os criminosos, viu a prova, memorizou parte das perguntas do exame e informou sobre o vazamento ao Ministério da Educação (MEC).

No livro, Renata mostra que, diferentem­ente do que foi divulgado à época pela imprensa, uma auditoria do Inep confirma que não houve falta de fiscalizaç­ão da gráfica que imprimiu o Enem. Mas sim omissão em relação aos avisos emitidos pelos órgãos técnicos.

Funcionári­os do próprio Inep que visitaram a gráfica em duas ocasiões, antes do roubo, disseram que “os procedimen­tos adotados não eram suficiente­s para garantir o sigilo da prova”, segundo nota técnica de 24 de agosto. Constatou-se que não havia câmeras em lugares estratégic­os nem pessoal suficiente para fazer a ronda e fiscalizar o movimento na gráfica.

A nota, enviada ao Inep, recomendav­a ao órgão que outros servidores fizessem, “até o término de toda a impressão das provas em São Paulo, a supervisão dos trabalhos, em regime de revezament­o, para garantir maior segurança de todo o processo”.

Dois ex-diretores do Inep, Heliton Ribeiro Tavares e Dorivan Ferreira Gomes, foram condenados pelo Tribunal de Contas da União (TCU), à época, a pagar multas de R$ 5 mil e R$ 3 mil. O ex-presidente do Inep, Reynaldo Fernandes, e o então ministro da Educação, Fernando Haddad, não sabiam da existência das notas técnicas. “Clara- mente não havia condições de se fazer a prova naquele momento”, lembra Renata.

O Estado não conseguiu contato com os ex-diretores. Já Fernandes destacou que o Inep não teve participaç­ão na contrataçã­o da gráfica. “Evidenteme­nte, conhecendo o resultado final, é fácil propor mudanças. Mas, tendo as informaçõe­s que tinha na época, acho que tomaria as mesmas decisões.” Revelações. O Roubo do Enem traz uma série de fatos inéditos sobre o episódio que alavancou o jornalismo de educação no País, com sucessivas manchetes dos principais jornais. Renata conta, por exemplo, como o ex-secretário de educação superior do MEC, Luiz Cláudio Costa, usou a prova de uma bolsa de iniciação científica para “esconder” o pré-teste do Enem e, assim, evitar o vazamento da pro-

va, como em anos anteriores.

O livro destaca a trajetória do exame, antes e depois do vazamento, e a dura relação entre imprensa, polícia e Ministério da Educação para solucionar o caso. “Imagino que um grande vazamento desses não possa mais acontecer. Fizeram muitos aperfeiçoa­mentos”, afirma a autora, que recebeu prêmios pelo trabalho, como o Ayrton Senna, e foi finalista do Esso.

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GABRIELA BILÓ / ESTADÃO Investigaç­ão. ‘Claramente não havia condições de se fazer a prova naquele momento,’ diz

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