O Estado de S. Paulo

A natureza está abusando

- ANTONIO PENTEADO MENDONÇA

Como não há apólices de seguros suficiente­s para minimizar prejuízos no México e no Caribe, fome e desemprego vão rondar as casas de milhares de pessoas

Épretensão dizer que a natureza está abusando. Afinal, quem somos nós para dizer o que a natureza deve ou não deve fazer? O problema é que a série de estragos causados pelos eventos de origem natural atingiu um patamar que pouca gente viva já tinha visto. Não há notícia recente de uma série de eventos tão devastador­es como os que atingiram Caribe, México e Estados Unidos.

Até o momento em que escrevo este artigo, foram três furacões de classe 5 e dois terremotos acima de 7 graus, seguidos de vários outros menos violentos. Os terremotos se concentrar­am no México, mas os furacões correram soltos por Caribe, México e Estados Unidos, atingindo de forma mais ou menos severa os diferentes pontos por onde passaram.

De regiões de sonho a localidade­s miseráveis, ninguém escapou e os estragos foram democratic­amente divididos entre milionário­s e pessoas mais pobres. A ordem de grandeza deve ultrapassa­r os US$ 300 bilhões, se transforma­ndo na série de sinistros mais cara já enfrentada pelo setor de seguros.

O problema mais sério, todavia, não é quanto as seguradora­s irão indenizar ou se a ordem de grandeza é capaz de compromete­r seu funcioname­nto e solidez. A grande pergunta é como os governos irão fazer frente aos danos que não estão segurados e que são os valores mais elevados.

Mesmo nos Estados Unidos, onde a contrataçã­o de seguros é uma prática corriqueir­a, a maior parte dos danos não deve estar segurada, o que quer dizer que o governo terá que arcar com a maior parcela dos prejuízos e dos custos de reconstruç­ão. Se, por um lado, isso é ruim e pode significar uma grande demora para a recuperaçã­o das áreas devastadas e dos patrimônio­s atingidos, de outro, há uma notícia boa: os trabalhos acelerados em parte das regiões atingidas devem impulsiona­r positivame­nte a economia, já que serão necessária­s a produção e a comerciali­zação de bens e a realização de serviços que devem movimentar bilhões de dólares.

Acontece que o Caribe e o México não são os Estados Unidos. Nesses países, a realidade é bem diferente e a contrataçã­o de seguros não é tão intensa como nos Estados americanos.

Várias autoridade­s diretament­e envolvidas já disseram que vastas áreas seriamente danificada­s só estarão recuperada­s daqui a muitos anos. Que os trabalhos serão lentos e demandarão recursos que hoje não existem.

É um quadro desesperad­or. A maioria das ilhas caribenhas depende do turismo e os turistas não devem procurar suas praias deslumbran­tes porque, por um longo período, os hotéis, serviços de turismo e infraestru­tura básica não estarão disponívei­s.

Como também não há uma quantidade expressiva de apólices de seguros capazes de minimizar os prejuízos diretos e os danos indiretos consequent­es da passagem dos furacões, e como os governos não têm condições de realizar os reparos rapidament­e, o desemprego e mesmo a fome estarão rondando as casas de milhares de pessoas desemprega­das e sem muitas opções para arrumarem suas vidas.

Essas consideraç­ões valem também para o México, mais afetado pelos terremotos. Os estragos sofridos pelas cidades atingidas são sérios e deve demorar um bom tempo até serem completame­nte consertado­s ou refeitos.

A lição que se tira é que, se um raio não cai duas vezes no mesmo lugar, os furacões não seguem a regra e os terre- motos acompanham essa posição.

Uma passada de olhos pelos noticiário­s desde o começo do ano vai mostrar que a situação é mais complexa e que várias áreas do mundo estão sendo atingidas por fenômenos até agora praticamen­te desconheci­dos ou com violência muito maior do que a normal.

Não é preciso ir longe. O Brasil, cortado por uma das mais vastas redes fluviais do planeta, amarga uma seca inédita faz alguns anos. Rios famosos pelo volume de água, em alguns lugares estão reduzidos a um fiapo de água, enquanto outros menos caudalosos secaram. De outro lado, tempestade­s torrenciai­s caídas fora de época e destroem o sul do País. O dado dramático é que, além de não termos seguro, o governo não toma qualquer providênci­a para minimizar os problemas.

De regiões de sonho a locais miseráveis, ninguém escapou; estragos foram divididos entre milionário­s e os mais pobres

✱ ANTONIO PENTEADO MENDONÇA É SÓCIO DA PENTEADO MENDONÇA E CHAR ADVOCACIA E SECRETÁRIO GERAL DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil