EI assume autoria, FBI rejeita hipótese
Grupo jihadista não apresenta provas e divulga um comunicado incomum, no qual sustenta que atirador havia se convertido ao Islã
O Estado Islâmico chegou a reivindicar ontem a autoria do ataque em Las Vegas, mas o FBI e especialistas que monitoram as atividades do grupo consideraram remota a possibilidade. Diferentemente de outros atentados, quando é comum a publicação de vídeos com juras de lealdade ao EI, desta vez os jihadistas não divulgaram nada.
Segundo o FBI, também não há indícios de interação entre militantes em fóruns jihadistas nas primeiras horas que se seguiram ao atentado. Além disso, o grupo terrorista não publicou nenhum documento que comprovasse a ligação de Paddock com suas atividades.
Logo após reivindicar a autoria do ataque, por meio da agência Amaq, seu veículo oficial na internet, o EI divulgou um segundo texto no qual afirmou que Paddock havia se convertido recentemente ao Islã. Esse esclarecimento também é incomum, segundo especialistas.
Para Rita Katz, que monitora as atividades jihadistas, era muito difícil que Paddock tivesse alguma relação com o EI em razão de seu histórico associado ao álcool e ao jogo – vícios duramente condenados pelo Islã. Por isso, de acordo com ela, o grupo teria divulgado um comunicado sobre a suposta conversão de Paddock. Assim, aos olhos dos militantes islâmicos, seu comportamento pregresso estaria isento. “O ataque em Las Vegas foi conduzido por um soldado do Estado Islâmico e foi realizado em resposta ao chamado para que alvos da coalizão sejam atacados”, escreveu o grupo, se referindo à coalizão internacional liderada pelos americanos que combate os extremistas na Síria e no Iraque.
De acordo com Aaron Rouse, agente especial do FBI, responsável pelas investigações do caso, Paddock não tinha conexões com grupos terroristas internacionais. Além de Rouse, duas outras autoridades graduadas do governo americano disseram de forma anônima à agência Reuters que não havia evidên- cias de que o atirador estivesse ligado a qualquer grupo militante internacional. A principal suspeita, segundo eles, é a de que o atirador sofra algum distúrbio psicológico. Caso o envolvimento de Paddock com o terrorismo seja oficialmente descartado, não será a primeira vez que o EI tenta se aproveitar para reivindicar um ataque. Em junho, um viciado em jogo abriu fogo e incendiou um cassino em Manila, nas Filipinas.
O grupo reivindicou a autoria do ataque e disse que o responsável, Jessie Javier Carlos, tinha se convertido ao Islã sem comunicar ninguém – o que acabou sendo desmentido pelas investigações da polícia filipina.
Analistas veem riscos na aposta do EI em reivindicar o atentado. “Se Paddock não tiver se convertido ao Islã, mas for um cristão fundamentalista, ou um alcoólatra viciado em jogo com garrafas espalhadas pelo quarto de onde atirou, o EI perde a credibilidade”, escreveu Graeme Wood, na revista Atlantic. “Além do álcool e do jogo, ele também cometeu suicídio, o que não é uma coisa bem vista pelo islamismo.” Terroristas suicidas usam a morte para causar baixas no inimigo.
Para alguns analistas, a intenção do EI era causar uma primeira impressão, mesmo que depois o fato fosse negado. “Para aqueles que pensam que o EI será ridicularizado em razão da falsa reivindicação, saibam que o impacto inicial, por mais falso que seja, é o que ficará marcado para sempre”, disse Patrick Skinner, ex-agente de contraterrorismo da CIA.