O Estado de S. Paulo

Como prevenir novas chacinas

- NICOLAS KRISTOF / TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO

Depois do terrível assassinat­o em massa de Las Vegas, o impulso dos políticos americanos será o de colocar bandeiras a meio pau, sugerir momentos de silêncio e tomar a dianteira em um luto nacional. No entanto, os americanos precisam mais que tudo não é de lamentaçõe­s, mas sim de ação para reduzir a quantidade de armas nos Estados Unidos.

Simplesmen­te não precisamos aceitar esse tipo de massacre. Quando a Austrália foi vítima de um assassinat­o em massa em 1996, o país uniu-se em torno de leis mais rígidas para armas de fogo. Como resultado, a taxa de homicídios por armas caiu para quase a metade e o suicídio por armas caiu 50%, segun- do o Journal of Public Health Policy.

Céticos dirão que não existem soluções mágicas e as leis não poderão evitar as carnificin­as. Até certo ponto, eles estão certos. Alguns criminosos sempre conseguirã­o obter armas, especialme­nte num país como os Estados Unidos, inundado por cerca de 300 milhões de armas de fogo. Sempre temos a probabilid­ade de ter taxas de mortes causadas por armas mais elevadas do que a Europa.

No entanto, a escala é assombrosa. Desde 1970, mais americanos morreram por armas (incluindo suicídios, assassinat­os e acidentes) do que a soma total de todos os americanos que morreram em todas as guerras da história americana, desde a independên­cia. Todos os dias, 92 americanos morrem por armas e as crianças americanas têm 14 vezes maior probabilid­ade de morrer por arma de fogo do que crianças de outros países desenvolvi­dos, segundo David Hemenway, da Universida­de Harvard. Então, como não exis- tem soluções mágicas à disposição, eis alguns passos que os americano poderiam adotar e iriam, coletivame­nte, fazer uma diferença:

Antecedent­es. Impor uma checagem universal para qualquer pessoa que comprar uma arma. Isso porque quatro entre cinco americanos apoiam essa medida, para impedir que criminosos ou terrorista­s tenham acesso a armas de fogo.

Idade. Impor uma idade limite de 21 anos para a compra de armas. Isso já é lei para aquisição de revólveres ou pistolas em muitos Estados e reflete a mesma lógica da legislação sobre a compra de bebida alcoólica.

Violência doméstica. Forçar o cumpriment­o da proibição da posse de armas de fogo por pessoa sujeita a uma ordem de proteção por violência doméstica. Esse é o momento em que as pessoas estão perturbada­s e propen- sas à violência contra os seus ex-companheir­os.

Controle. Limitar a compra de armas, por qualquer pessoa, a não mais do que duas por mês e reforçar as normas de compras por terceiros, que adquirem armas para criminosos. Tornar os números de série mais difíceis de serem removidos.

Rastreamen­to. Adotar a tecnologia de identifica­ção balística de cartuchos, de forma que se possa rastrear a arma da qual foram disparados, útil na solução e crimes envolvendo armas. Além disso, investir na compra de “armas inteligent­es” pela polícia e pelos militares dos EUA, para promover seu uso. Tais armas exigem um PIN (um número pessoal de identifica­ção) ou só podem ser disparadas quando estiverem perto de um determinad­o bracelete ou outro equipament­o, de forma que crianças não poderão fazer mau uso delas e elas sejam menos vulnerávei­s a roubo. A indústria de armas fez uma arma à prova de crianças no século 19, mas agora resiste às armas inteligent­es. Armazenage­m. Exigir que as armas sejam bem guardadas, para reduzir roubo, suicídio e acidentes com crianças.

Ciência. Investir em pesquisa para ver quais intervençõ­es serão mais eficazes na redução de mortes por armas de fogo. Sabemos, por exemplo, que álcool e armas não devem se misturar, mas não sabemos exatamente quais os tipos de lei seriam mais eficientes para reduzir o número de mortes. Investimen­tos semelhante­s na redução de outros tipos de mortes acidentais foram bastante eficazes.

Todos esses passos são modestos e não posso garantir que tenham algum efeito extraordin­ário. No entanto, especialis­tas em saúde pública acreditam ser plausível que uma série de medidas de segurança bem elaboradas como estas possa reduzir as mortes por armas de fogo em um terço – ou mais de 10 mil por ano.

É COLUNISTA

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil