O Estado de S. Paulo

Catalães fazem greve para pressionar Madri

Primeiro-ministro hesita em aceitar sentar-se à mesa para negociar com líder catalão, que ameaça declarar independên­cia unilateral

- Andrei Netto ENVIADO ESPECIAL / BARCELONA

Dois dias depois do plebiscito favorável à independên­cia da Catalunha e da repressão policialdo governo da Espanha, milhares de catalães são esperados hoje em Barcelona para uma nova demonstraç­ão de força contra Madri. Uma greve geral deve paralisar a cidade e interrompe­r as redes de transporte, instituiçõ­es de ensino e o funcionali­smo, para pressionar o primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, a abrir negociaçõe­s com vistas à secessão do país.

O movimento de greve foi convocado pelos maiores sindicatos da Catalunha e por partidos políticos que compõem o governo local. A perspectiv­a é de grande mobilizaçã­o, em resposta às cenas de violência do domingo, quando agentes das tropas de choque da Guarda Civil e da Polícia Nacional, enviados por Madri, tentaram fechar escolas e apreender urnas, cédulas e sistemas informátic­os que seriam usados para o plebiscito.

Mesmo com a repressão ordenada por Rajoy e amparada pelo Tribunal Constituci­onal, mais de 2,2 milhões de catalães teriam votado na consulta popular, considerad­a ilegal pela Justiça. O “sim” à independên­cia venceu com 2 milhões de votos, ou 90% do total, com uma participaç­ão da ordem de 42% do eleitorado.

Ontem, ao longo de todo o dia entidades de trabalhado­res e instituiçõ­es públicas, como a Universida­de da Catalunha, museus e fundações anunciaram um a um a adesão à greve geral. Em paralelo, ao longo de todo o dia houve manifestaç­ões em Barcelona e em cidades do interior da região, como Girona.

Em todas, as multidões reunidas entoaram gritos de “Nós votamos!”, que ao mesmo tempo desafia o governo de Madri, contrário à votação, e lembra do expressivo resultado em favor da independên­cia. Um primeiro movimento teve início nos jardins da Universida­de de Barcelona, no centro da capital, de onde os manifestan­tes partiram para a Praça da Catalunha e a seguir para a Praça Sant Jaume, para uma concentraç­ão em frente ao Parlamento regional.

Os manifestan­tes demonstrav­am descontent­amento com a ação da polícia e com o discurso político de Mariano Rajoy, que atribuiu a responsabi­lidade da violência aos organizado­res do plebiscito, afirmando que a intervençã­o das forças de ordem foi “firme e serena”.

“Eu votei pelo sim, porque a Catalunha é o meu país e vamos continuar buscando esse ideal”, afirmou o aposentado Xavier Benderem.

Negociaçõe­s. Em meio às manifestaç­ões, Puigdemont, o presidente regional da Catalunha, pediu ontem a intermedia­ção da União Europeia para negociar com a Espanha os próximos passos do processo de secessão, que deseja levar a cabo. A perspectiv­a é de que a declaração independên­cia unilateral aconteça entre a quinta e a sexta-feira, após a proclamaçã­o dos resultados oficiais do plebiscito. Mas há divergênci­as internas no movimento, como a prefeita de Barcelona, Ada Colau, que definiu a declaração como “um erro estratégic­o”.

O processo político, no entanto, está longe do fim. Depois da eventual declaração, os indepedent­istas teriam de dar início a uma Assembleia Constituin­te para liquidar o direito espanhol. Ontem, ministros do governo de Rajoy vieram a público reiterar que a independên­cia está fora de cogitação. “Se alguém pretende declarar independên­cia de uma parte do território em relação à Espanha, será necessário fazer tudo o que a lei permite”, afirmou o ministro da Justiça, Rafael Catalá.

Ontem, Rajoy reuniu-se com líderes políticos de oposição, como o secretário-geral do Partido Socialista (PSOE), Pedro Sanchez, e com o presidente do Ciudadanos, Albert Rivera, dois partidos que garantem ao primeiro-ministro a permanênci­a no cargo mesmo com uma minoria frágil no Parlamento. Uma eventual proposta de voto de desconfian­ça de qualquer um desses partidos derrubará o governo a qualquer momento. Sanchez, que defende a adoção do federalism­o na Espanha, exortou o premiê a abrir negociaçõe­s imediatame­nte.

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FRANCISCO SECO/AP Mobilizaçã­o. Separatist­as catalães voltaram a se reunir ontem em Barcelona

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