O Estado de S. Paulo

Texto ainda em discussão

Refis dá desconto a suspeitos de corrupção

- Igor Gadelha / BRASÍLIA

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou ontem que, se houver acordo, será possível retirar do texto da medida provisória (MP) que criou um novo Refis o trecho que permite a suspeitos de corrupção parcelar e ter descontos ao devolver à União dinheiro desviado dos cofres públicos. “Não olhei o texto ainda. Mas com acordo, sempre tem caminho”, disse.

Na semana passada, deputados aprovaram em votação simbólica o texto-base da MP do Refis. No primeiro artigo da proposta, que prevê a criação do programa, parlamenta­res incluíram permissão para contribuin­tes parcelarem dívidas com a Procurador­ia-Geral da União (PGU), órgão ligado à Advocacia-Geral da União (AGU) responsáve­l por executar as cobranças de dívidas de autuações, como mostrou O Globo no sábado.

Na avaliação de procurador­es, isso permite, na prática, que corruptos possam usufruir dos descontos em multas e juros previstos pelo programa ao devolver recursos desviados dos cofres públicos.

O texto original enviado pelo governo previa parcelamen­to com desconto nos juros e multas apenas para dívidas com a Receita Federal e a Procurador­ia-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Na discussão da MP em uma comissão mista do Congresso Nacional, o relator da proposta, deputado Newton Cardoso Júnior (PMDB-MG), incluiu a PGU. A inclusão foi aprovada tanto no colegiado quanto no plenário da Câmara.

Para retirar o trecho polêmico, é necessário um acordo entre lideranças partidária­s na Câmara para reabrir o prazo de apresentaç­ão de destaques (sugestões de mudança). Esse prazo se encerrou na semana passada, antes da votação do texto-base da MP na Casa.

Caso o trecho não seja retirado pela Câmara, o Senado poderá fazer isso quando estiver analisando a matéria. O problema, dizem deputados, é que, caso senadores alterem o texto aprovado pelos deputados, a MP terá de retornar para nova votação na Câmara. A articulaçã­o, porém, pode inviabiliz­ar a conclusão da votação da proposta nas duas casas legislativ­as até 11 de outubro, quando a medida provisória perde a validade.

Veto. Para evitar que a MP não seja votada a tempo, o deputado Alfredo Kaefer (PSLPR) defende que Câmara e Senado aprovem a proposta com o trecho que beneficia corruptos e o presidente Michel Temer se comprometa, antes da votação, a vetar essa parte.

Kaefer disse ser contra permitir parcelamen­to, com desconto em multas e juros, de dívidas com a Procurador­iaGeral da União. Ele afirmou que votou a favor do texto-base sem atentar para o texto polêmico: “Passei batido nisso. Se tivesse visto, não teria aprovado”.

Em nota, o relator afirmou que incluiu o trecho polêmico com aval do Palácio do Planalto para permitir que partidos pudessem parcelar suas multas eleitorais, “demanda legítima do Congresso e do Executivo”. Como o Estado mostrou em julho, o deputado é ligado a empresas que juntas devem à União R$ 51 milhões.

Cardoso Júnior rebateu tese de procurador­es de que a inclusão da PGU permite parcelamen­to de multas relativas a atos de corrupção e acordos de leniência. Segundo ele, pagamentos devidos em razão de acordos de leniência, inclusive reparações à União, são “claramente insuscetív­eis” de parcelamen­to. “Seria o descumprim­ento do acordo firmado pe-

los órgãos de controle e retiraria o direito aos benefícios da pessoa física ou jurídica beneficiad­a. O único órgão que parcelou um acordo de leniência até agora foi a PGR (Procurador­ia-Geral da República), dando à JBS o direito de pagar em 25 anos uma multa de R$ 11 bilhões”.

O peemedebis­ta afirmou que a apresentaç­ão ou não de

Cenário “Passei batido nisso. Se tivesse visto, não aprovaria.” Alfredo Kaefer (PSL-PR) DEPUTADO

destaque para retirar o trecho depende da deliberaçã­o da Mesa Diretora da Câmara.

“Pagamentos em razão de acordos de leniência são insuscetív­eis de parcelamen­to.” Newton Cardoso Jr. (PMDB-MG) DEPUTADO, RELATOR DA PROPOSTA

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ANDRE DUSEK/ESTADÃO Regra. Rodrigo Maia, presidente da Câmara, diz que com acordo texto pode mudar
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Governo. Está se esgotando fôlego para negociação
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NA WEB Governo. Está se esgotando fôlego para negociação estadao.com.br/e/cenario

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