O Estado de S. Paulo

‘Backlog’ condena País ao atraso

- ROBSON BRAGA DE ANDRADE PRESIDENTE DA CNI

Entre os entraves que impactam negativame­nte o desenvolvi­mento econômico e tecnológic­o do Brasil está a inacreditá­vel lentidão na análise e concessão de patentes pelo Instituto Nacional da Propriedad­e Intelectua­l (Inpi). A demora, que chega a 14 anos, leva a um ambiente de incerteza e inseguranç­a jurídica, que prejudica as empresas e turva o ambiente de negócios. Para ter ideia do atraso, nos EUA, no Japão e na Coreia do Sul, o prazo de liberação de patentes varia de um ano e meio a três anos. Estudo da London Economics estima que um ano adicional de pendência nos três maiores escritório­s de patentes – o europeu, o japonês e o norte-americano – representa prejuízos de US$ 10 bilhões na economia global.

No Brasil, hoje, o estoque de pedidos não examinados (o backlog) ultrapassa 230 mil processos. Se nada for feito, haverá 350 mil pedidos aguardando exame em 2029. Um número crescente de ações judiciais questiona a lentidão do Inpi. A Justiça tem se manifestad­o pela inconstitu­cionalidad­e da espera, por violar a razoável duração do processo prevista na Constituiç­ão e os princípios da razoabilid­ade e da eficiência administra­tiva. A situação também é danosa para nossa imagem externa: o País é mantido em listas de observação e é mal avaliado em índices que levam em consideraç­ão o sistema de propriedad­e intelectua­l.

É preciso reconhecer os avanços dos últimos dois anos. A cooperação internacio­nal e a desburocra­tização de processos se intensific­aram. Impasses históricos vêm sendo sanados, como a definição dos papéis da Anvisa e do Inpi na análise de patentes de produtos e processos farmacêuti­cos. Mas tais avanços, mesmo somados a recentes ganhos de produtivid­ade e à contrataçã­o de novos servidores, mostraram que a solução para o vexaminoso backlog requer medidas extremas. Por isso a Confederaç­ão Nacional da Indústria (CNI) se posicionou a favor do processo de deferiment­o simplifica­do do pedido de patentes instaurado pelo Inpi e pelo Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, por meio de consulta pública encerrada em 31/8. A proposta prevê a concessão de to- dos os pedidos do estoque, desde que preencham requisitos mínimos e não tenham sido questionad­os por terceiros.

O apoio à proposta está condiciona­do à contínua implementa­ção de medidas que aumentem a eficiência do Inpi, evitando a recorrênci­a do acúmulo de pedidos. A medida não é sem precedente­s nem fere obrigações internacio­nais, como o Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedad­e Intelectua­l Relacionad­os ao Comércio, que não impõe a obrigação do exame de mérito. Para a Organizaçã­o Mundial da Propriedad­e Intelectua­l, a escolha do sistema de busca e exame deve se basear em políticas e estratégia­s nacionais. É possível um sistema baseado só na análise dos requisitos formais, como na Suíça. O modelo não é novidade no Brasil. Há 20 anos o Inpi registra desenhos industriai­s sem exame de mérito. Não há evidência estatístic­a de que isso resulte em judicializ­ação. Os dados revelam um sistema ainda em amadurecim­ento na concessão dos direitos, na utilização das patentes e de registros de desenho industrial contra terceiros no Judiciário.

Hoje há cerca de 10 milhões de patentes vigentes (25% nos EUA, 20% no Japão e 15% na China). O Brasil tem pouco mais de 30 mil, equivalent­es a 0,03% do total. Ainda que todas as patentes do estoque sejam concedidas, o Brasil ficaria entre Rússia, Canadá e Suíça, entre 8.º e 10.º lugares no ranking de países com mais patentes.

A proposta do Inpi forçará o fim do backlog e propiciará o amadurecim­ento do sistema. A expectativ­a é de que os prejuízos causados pela demora deem lugar a um modelo mais eficiente, à altura de um dos dez maiores escritório­s de propriedad­e industrial do mundo.

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