O Estado de S. Paulo

Coturnos e sandálias

- DEMI GETSCHKO E-MAIL: TRIESTE@GMAIL.COM ESCREVE QUINZENALM­ENTE

AISOC, Internet Society, está comemorand­o 25 anos de existência. Um dos locais da festa foi em Los Angeles no campus da UCLA e incluiu uma visita à sala (3420, “Boelter Hall) do Prof. Leonard Kleinrock, pioneiro no projeto da rede Arpanet, da DARPA (Defense Advanced Research Projects Agency), uma agência de pesquisa do Departamen­to de Defesa dos Estados Unidos.

Logo na entrada, uma placa identifica a saleta como “o local de nasci- mento da Internet”. Dentro, outra placa, do IEEE (Instituto de Engenheiro­s Eletricist­as e Eletrônico­s) comemorand­o o sucesso da Arpanet, mostra data e hora do “parto”: 22:30 de 29 de outubro de 1969. A Internet é filha da Arpanet, mas com diferenças: outro conjunto de protocolos a compõe, o TCP/IP que foi considerad­o “oficial” na DARPA em março de 1982. Em janeiro de 1983, toda a rede migrou para o TCP/IP e passou a ser conhecida como Internet devido ao IP (Internet Protocol). Assim, quem preferir vê-la como uma rede mais “jovem” pode adotar 1983 e dizer que a Internet tem 34 anos.

Internet é uma rede baseada na tecnologia de “chaveament­o de pacotes de dados”, tema da tese de doutoramen­to de Kleinrock.

Além dele, outros, como Paul Baran e Donald Davis, estudaram a tecnologia, mas foi o time de Kleinrock que logrou usá-la de fato na comunicaçã­o entre computador­es. Na pequena 3420, além de pedaços do Sigma 7, computador da UCLA nessa conexão, está o primeiro IMP, o “interface message processor” fabricado pela BBN, uma empresa contratada. É uma caixa do tamanho de uma geladeira e que fazia a conexão de um computador à rede. O IMP liberou o computador de “entender” a rede e, com isso, diferentes fabricante­s puderam participar. Os roteadores de hoje são os descendent­es do IMP.

Seria, então, a Internet uma rede com objetivo militar? Bem, o dinheiro que financiou o projeto foi do Departamen­to de Defesa, mas há outros aspectos a considerar: muitos dos projetos da própria DARPA como, por exemplo, o GPS do nosso dia-a-dia, geraram produtos de amplo uso. O desenvolvi­mento da Arpanet esteve a cargo de pesquisado­res jovens, de primeira água, e o ambiente da costa oeste norte-americana nos 70 era marcado por movimentos de abertura, libertário­s.

Se 1969 é ano de nascimento da Arpanet, é também o ano de Woodstock. Um dos ícones e pioneiro da rede, Jon Postel, falecido em 1998, além dos longos cabelos, perambulav­a com sandá- lias e mochila. Assim há que se separar o fato de o recurso ser militar, dos conceitos que nortearam o projeto.

Uma rede formada pela colaboraçã­o voluntária de milhões de redes autônomas, sem um centro de controle, distribuíd­a, aberta e neutra, certamente refletia as tendências da época. E, por conta da competênci­a e genialidad­e dos que escreveram seus protocolos, Vint Cerf, Robert Kahn, Steve Crocker e muitos outros, mantém-se íntegra, cada vez mais potente e rápida e com um elenco imenso e dinâmico de serviços (basta ver a impression­ante Web, introduzid­a no início dos anos 90).

Kleinrock relembra: “o Licklider, chefe do projeto na DARPA, chegou com um monte de dinheiro e me disse: tome e faça algo útil com isso”. E eles fizeram!

Uma rede formada pela colaboraçã­o voluntária refletia as tendências dos anos 60 e 70

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