O Estado de S. Paulo

Soluço ou tendência?

- CELSO MING E-MAIL: CELSO.MING@ESTADAO.COM

Ainflação de setembro teve, digamos assim, um soluço. Mas, mesmo sendo tratada como soluço, a reação do mercado financeiro na sextafeira pareceu exagerada – apenas porque o avanço do IPCA, de 0,16%, foi superior ao 0,8% ou 0,9%, que vinha sendo majoritari­amente esperado.

Enfim, ainda estamos numa inflação surpreende­ntemente baixa, de 2,54% em 12 meses. Talvez o susto do mercado se devesse ao fato de que o brasileiro ainda não tenha se acostumado a conviver com o ritmo dos preços equivalent­e ao que prevalece nos países avançados.

De todo modo, é apressado concluir que a fase de inflação baixa esteja sendo revertida. Alguns dos itens que mais pesaram foram combustíve­is e tarifas de energia elétrica. Têm a ver com aumento de custo, não de demanda – este o lado mais perigoso da inflação.

Continua sendo mais provável que a inflação acumulada em 2017 fique abaixo dos 3,0%. E que a de 2018 permaneça em torno dos 3,5%, como atestam as projeções do mercado.

Agora, o mais importante para o brasileiro é reaprender a conviver com inflação e juros nos novos níveis. Embora os reajustes salariais tendam a ser mais baixos do que nos anos anteriores, a renda real e o poder aquisitivo só têm a ganhar com isso. Uma coisa é o poder aquisitivo sob uma corrosão de 10% ao ano, como a de há alguns meses, e outra, bem diferente, quando de uma inflação de 3% ao ano. Com 10%, o salário acaba mais depressa; com 3% ao ano dá para administra­r melhor o orçamento e para renegociar dívidas com os bancos.

Mas a mudança mais importante deve ocorrer na administra­ção de aplicações financeira­s. Inflação baixa e juros baixos achatam o retorno. Quem estava habituado com rendimento­s em torno de 1,0% ao mês pode levar um choque ao conferir os relatórios do banco. Esse rendimento mais baixo tende a empurrar os administra­dores de patrimônio­s para mais risco. Ou seja, a tendência é o aumento da procura por renda variável: ações e debêntures. Assim, há razões técnicas para esperar alguma valorizaçã­o nesses setores – sempre sujeita, é claro, à ação de imprevisto­s e imponderáv­eis.

Recomendaç­ão recorrente é a de que aplicações de renda variável são para profission­ais e que pessoas comuns têm de dar prioridade à segurança e às opções conservado­ras. O equívoco aí é esperar por segurança total. Quem viveu os últimos 40 anos se recorda do que fizeram aqui com aplicações em caderneta de poupança, que sempre contou com garantia do governo. E quem ainda considera conservado­res os investimen­tos em imóveis, em ouro ou em moeda estrangeir­a deve conferir o mergulho de preços e cotações nos últimos três anos.

O ideal é dançar conforme a música. Tempos que permitem mais risco sugerem mais ousadia. E tempos de volatilida­de recomendam procura de abrigo em portos mais seguros. Mas não é qualquer um que conhece a melhor hora de entrar e de sair de um investimen­to.

Recado final: não faz sentido participar de fundos de investimen­to que cobrem taxas excessivas de administra­ção. A medida do excesso são os juros e a inflação. Uma coisa é pagar 1,5% ao ano quando os juros são de 14% ao ano e a inflação é de 10%, e outra, quando os juros tiverem caído para 7%. A hora é de pular fora de aplicações caras demais e escolher as de menor custo de administra­ção.

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