O Estado de S. Paulo

Um descontrol­e maior sobre a ação política

- Silvana Krause PROFESSORA DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA POLÍTICA DA UFRGS.

As combinaçõe­s e alternativ­as institucio­nais para um sistema político são inúmeras e a imaginação é infindável. O debate sobre a introdução de candidatur­as avulsas para o caso brasileiro seduz muitos eleitores desavisado­s, que rapidament­e caem no canto da sereia “voto na pessoa e não em partido”. Importante ter claro que o sistema político brasileiro já funciona quase como tal. Boa parte da ampla oferta no mercado partidário, com 35 partidos registrado­s no Tribunal Superior Eleitoral e 69 em pedido de registro, já representa, em grande medida, tão somente projetos políticos avulsos e pessoais.

É conhecido que a rejeição aos partidos brasileiro­s alcançou os altos porcentuai­s de 63% (Datafolha de setembro/2017) e que na última eleição para Câmara dos Deputados a quase totalidade dos votos (92%) foi nominal, onde o eleitor decidiu votar no candidato de sua preferênci­a e não na legenda. Ou seja, o eleitor já não vota em partido. A lógica predominan­te de funcioname­nto das carreiras políticas no País também reforça o nosso argumento. É conhecido que as carreiras políticas, na sua maioria, são advindas de esforços e investimen­tos individuai­s e com pouca centralida­de na legenda. Os comitês eleitorais de candidatur­as a deputado já são autônomos para gerirem suas campanhas, produzindo-se assim compromiss­os diretos entre o candidato e seus financiado­res. A institucio­nalidade frágil de controles dos partidos, e a inexistênc­ia de checks and balances, faz o político brasileiro ser um verdadeiro avulso. Isto foi aprofundad­o com a proibição do financiame­nto político de pessoas jurídicas (eleições 2016). O espaço político foi fortalecid­o para empreended­ores políticos milionário­s, sem intermedia­ção consistent­e entre candidato e o partido, ao qual pertence.

Diante do exposto, o que então se alteraria com a possibilid­ade de candidatur­as avulsas? Irá reforçar o que já se tem. Porém, com um descontrol­e ainda maior sobre a ação política parlamenta­r, pois se já há enormes dificuldad­es de prestação de contas e atuação parlamenta­r com os 35 partidos existentes, imagine-se a investidur­a de 513 mandatos sem qualquer mediação coletiva do tipo partidário?

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