O Estado de S. Paulo

Em sete anos, País deve ter 43 mil jovens assassinad­os

Levantamen­to estima tendência de mortes violentas de adolescent­es entre 2015 e 2021; risco de negro ser vítima é 2,8 vezes maior

- Juliana Diógenes Carmen Pompeu ESPECIAL PARA O ESTADO FORTALEZA COLABOROU VINICIUS RANGEL, ESPECIAL PARA O ESTADO

Em sete anos, 43 mil adolescent­es devem ser vítimas de homicídio no País. Por dia, a média deve ser de 16 assassinad­os (com idades de 12 a 18 anos) entre 2015 e 2021 se mantidos os atuais índices de violência. Homens, mostram as estatístic­as, têm 13,5 mais risco de serem vítimas do que mulheres. O perigo para jovens negros é 2,8 vezes maior na comparação com brancos. O Nordeste é a região mais violenta para a faixa etária.

Isso é o que revela um levantamen­to feito pelo Unicef, braço das Nações Unidas para a infância, Secretaria dos Direitos Humanos, o Observatór­io das Favelas e o Laboratóri­o de Análise da Violência da Universida­de do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). A estimativa é baseada no Índice de Homicídios na Adolescênc­ia (IHA), que cruza dados oficiais e considera mortes de jovens por homicídio em 300 municípios com população acima de 100 mil habitantes.

Em 2014, o IHA mostrava que, a cada mil adolescent­es com 12 anos na época, 3,7 devem morrer por homicídio antes dos 19 anos. O índice é alto, diz o estudo, porque uma sociedade não violenta deve apresentar valores próximos a zero.

O valor de 2014 é o maior da série desde o início do monitorame­nto, em 2005. O Nordeste apresentou os índices mais ele- vados: há três anos, a região perdeu 6,5 adolescent­es para cada grupo de mil pessoas, o dobro da tendência nacional.

Em março, Gleicia Marques perdeu o filho caçula, de 18 anos, para a violência. Sem passagem pela polícia, Arthur foi executado com seis tiros de pistola, a 400 metros da casa da avó, em Fortaleza. “Olho para esta foto todos os dias, com sede de justiça”, diz Gleicia, mostrando a fotografia do rapaz morto, todo ensanguent­ado, sobre uma calçada.

Na época, ele havia acabado de passar em uma entrevista de emprego. “Tinha planos de comprar uma moto e estava feliz. Era um jovem comum”, conta a mãe. Mais de seis meses após o crime, os motivos e o autor são desconheci­dos.

O titular da Secretaria de Segurança e Defesa Social do Ceará, delegado André Costa, reconhece o recrudesci­mento na violência, com grande parte de óbitos ligados à disputa de facções e ao tráfico de drogas. Ele também cobra mais apoio da União. Procurado para comentar a pesquisa, o Ministério da Justiça não se manifestou.

Das dez capitais mais violentas para adolescent­es, o Nordeste concentra sete. Fortaleza li- dera – com 10,94 adolescent­es assassinad­os a cada mil. Planos assistenci­ais federais, como o Bolsa Família, e a melhoria de indicadore­s sociais e de renda na região nos últimos anos não foram suficiente­s para controlar os homicídios no Nordeste.

Para Ignácio Cano, um dos autores do estudo e professor da Uerj, uma das explicaçõe­s é que o cresciment­o demográfic­o e econômico pode ter vindo junto de aumento das atividades criminosas. “O índice é elevado justamente na região onde os programas de transferên­cia de renda foram mais fortes, mas é preciso considerar que a melhoria de condições de vida têm impacto em médio e longo prazo, e não de forma imediata”, diz.

No País, a pequena cidade de Serra, na Grande Vitória, tem a maior taxa de adolescent­es mortos: 12,74 por mil. Grande parte tem origem no tráfico. Durante a paralisaçã­o de policiais militares em fevereiro, Serra foi o município capixaba que registrou maior número de homicídios (incluindo adultos)

“Acreditamo­s que a evasão escolar é um dos principais fatores que levam esses adolescent­es a ingressare­m no mundo do crime. Estamos empenhados em colocar cada vez mais jovens nas escolas”, afirma o secretário de Direitos Humanos capixaba, Júlio Pompeu.

Perfil. “Cruzando os dados com outras pesquisas, as vítimas são os jovens do sexo masculino, negros, de baixa escolarida­de e moradores da periferia”, afirma Cano. E homicídios por armas de fogo são 6,1 mais prováveis do que por todos os outros meios juntos.

Para Luciana Brilhante, coordenado­ra do Centro de Defesa da Criança e do Adolescent­e, uma organizaçã­o sem fins lucrativos que atua no setor, tem havido inversão de prioridade­s, com ausência de investimen­to em políticas públicas para jo- vens. “E também houve recrudesci­mento penal, com mais encarceram­ento e policiamen­to, que não traz retornos efetivos”, critica. /

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