O Estado de S. Paulo

Servidor é exonerado após queixa de falta de verbas

- Lu Aiko Otta / BRASÍLIA

O governo exonerou ontem o servidor André Esposito Roston do posto de chefe da Divisão de Fiscalizaç­ão para Erradicaçã­o do Trabalho Escravo e com isso provocou forte reação de entidades ligadas à defesa dos direitos humanos e da transparên­cia no governo, além do Ministério Público.

Segundo fontes, o ato teria si- do uma represália a queixas feitas pelo funcionári­o à falta de recursos para fiscalizaç­ão. Mas a motivação principal teria sido sua atuação pela divulgação da lista de empresas acusadas de utilizar trabalho escravo. Uma nova edição dessa relação, que ficou pronta na última sexta-feira, teria desagradad­o a integrante­s da base governista no Congresso, bem às vésperas da votação da segunda denúncia con- tra o presidente Michel Temer.

“A fiscalizaç­ão do trabalho escravo estava estrangula­da”, disse o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), Carlos Silva. Dois cortes promovidos no orçamento, um em março e outro em julho, haviam reduzido os recursos da área a 70% do valor original.

Essa situação foi discutida no final de agosto, numa reunião da Comissão de Direitos Humanos do Senado, por iniciativa do senador Paulo Paim (PT-RS). Designado para representa­r o Ministério do Trabalho, Roston disse na reunião que não dispu- nha de recursos para executar uma fiscalizaç­ão programada para a semana seguinte. Na ocasião, ele dispunha de apenas R$ 6.000,00, para uma ação que custaria dez vezes mais. “Essa fala desagradou ao governo”, disse Silva. “Ele foi cobrado.”

Levantamen­to da organiza-

Repúdio A nota de repúdio à exoneração de André Roston é assinada por sete entidades como, por exemplo, a Comissão Pastoral da Terra e o Instituto Ethos de Empresas e Responsabi­lidade Social.

ção Contas Abertas mostra que, de janeiro a setembro deste ano, foram gastos R$ 1,960 milhão em ações de fiscalizaç­ão para erradicaçã­o do trabalho escravo. É um nível semelhante ao de 2013, mas ainda assim superior aos R$ 1,212 milhão gastos em igual período de 2016.

Desgaste. Segundo fontes próximas a Roston, a queixa sobre escassez de recursos, feita há mais de um mês, foi só a ponta mais visível de um processo de desgaste e constrangi­mento que se arrastava desde o ano passado, por causa da publicação da chamada “lista suja”, com empresas acusadas de utilizar trabalho escravo.

A pedido de empresas da construção civil ao Supremo Tribunal Federal, a lista chegou a ficar suspensa entre o final de dezembro de 2014 e maio de 2016, quando foi liberado pela ministra Carmén Lúcia. Contudo, o governo Temer não voltou a publicá-la, o que só veio a acontecer em março deste ano.

Questionad­o sobre a demissão, o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, negou que ela tenha relação com a falta de dinheiro: “Nada a ver.”

O Estado não conseguiu falar com André Roston.

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