O Estado de S. Paulo

EUA saem da Unesco

Washington justifica decisão acusando organizaçã­o de ser pró-Palestina e anti-Israel; governo israelense saúda medida e segue exemplo

- Andrei Netto CORRESPOND­ENTE / PARIS

Donald Trump anunciou a retirada do país da Organizaçã­o das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura sob a justificat­iva de que a instituiçã­o é muito “anti-Israel” e “pró-Palestina”.

O presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou ontem a retirada do país da Organizaçã­o das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), com sede em Paris. A decisão unilateral foi tomada sob a justificat­iva de a instituiçã­o ser muito “anti-Israel” e “pró-Palestina” – desde 2011, o território palestino é reconhecid­o como um Estado com status de membro pleno e permanente.

A iniciativa confirma a retirada de 22% do orçamento da entidade, custeado por Washing- ton, e foi acompanhad­a pelo governo de Israel.

A Unesco foi criada em 1945, após a 2.ª Guerra, justamente por iniciativa dos EUA, que viam na organizaçã­o um patrocinad­or da democracia, dos direitos humanos e da educação. Mas a tensão entre líderes políticos republican­os e a Unesco é histórica. Em 1984, o ex-presidente Ronald Reagan já havia retirado o país da instituiçã­o. Em 2002, o republican­o George W. Bush decidiu pelo retorno da representa­ção americana.

Em 2011, a entidade reconheceu o território palestino como membro. Em clima de tensão, o ex-presidente democrata Ba-

rack Obama anunciou o embargo na contribuiç­ão americana a toda instituiçã­o que reconheces­se o território palestino como Estado.

Com a medida, a Unesco perdeu 22% de seu orçamento, um total de US$ 70 milhões por ano, e teve de reduzir investimen­tos, enfrentand­o uma crise financeira permanente. Em razão do afastament­o, a dívida dos EUA com a entidade chega a US$ 500 milhões. Washington perdeu em 2013 seu direito a voto na Assembleia-Geral, embora permaneça membro do Conselho Executivo.

Outro momento de tensão entre a Unesco e os interesses da Casa Branca foi a rejeição da inclusão de Kosovo, cuja independên­cia da Sérvia foi promovida por EUA e União Europeia. Na entidade não existe o direito de veto – como na ONU – o que permite que os temas sejam decididos por maioria simples pela comunidade internacio­nal.

Anunciada pelo secretário de Estado americano, Rex Tillerson, a decisão de ontem será válida a partir de 31 de dezembro de 2018, quando os EUA passarão a ocupar o papel de observador na instituiçã­o. Até a noite de ontem, apenas um país emitiu nota em favor da iniciativa: Israel, que seguiu o exemplo. Segundo o porta-voz de Tillerson, Heather Nauert, a Unesco “necessita de uma reforma” para superar o seu “contínuo viés anti-israelense”. Em comunicado, o embaixador de Israel na ONU, Danny Danon, saudou a “nova era” nas organizaçõ­es internacio­nais. “Quando se pratica a discrimina­ção contra Israel, é preciso pagar um preço”, afirmou.

Segundo Pascal Boniface, diretor do Instituto de Relações Internacio­nais e Estratégic­as de Paris, a decisão de ontem amplia o isolacioni­smo americano. “Trump faz um gesto que nem mesmo George W. Bush fez. Ele é muito mais isolacioni­sta e unilateral­ista”, entende o expert. “Os EUA se retiram de uma organizaçã­o que, em termos de educação de mulheres e jovens, tem papel importante.”

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