O Estado de S. Paulo

Planalto admite rever portaria do trabalho escravo

Polêmica. Críticas à medida ganharam o reforço da Procurador­a-Geral da República e fizeram Temer cogitar mudanças na norma editada no início da semana; alterações, no entanto, só devem ser feitas após votação da denúncia contra ele na Câmara

- Carla Araújo Felipe Frazão / BRASÍLIA

Michel Temer admite a interlocut­ores que pode fazer mudanças na portaria do trabalho escravo. A norma sofreu duras críticas de vários setores, incluindo a da procurador­a-geral, Raquel Dodge, que pediu dez dias para que o governo se pronuncie e revogue a medida. Os “ajustes”, no entanto, só devem ser feitos após votação na Câmara dos Deputados da segunda denúncia contra Temer.

O presidente Michel Temer já admite a interlocut­ores próximos que pode fazer ‘ajustes’ na portaria que modifica as regras de combate ao trabalho escravo. No entanto, as alterações só serão feitas após a votação, na Câmara dos Deputados, da segunda denúncia contra ele por obstrução de Justiça e formação de quadrilha.

A decisão foi tomada ontem depois de reunião com o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira. Segundo fontes próximas ao presidente, o ministro fez uma defesa da portaria, apresentou seus argumentos e relatou a conversa que teve na quarta-feira com a Procurador­a-Geral da República, Raquel Dogde.

A substituta de Rodrigo Janot no comando da PGR, que foi indicada por Temer, fez duras críticas à medida. Ela classifico­u a portaria como um ‘retrocesso à garantia constituci­onal de proteção à dignidade da pessoa humana’ e pediu oficialmen­te dez dias para que o governo se pronuncie e revogue a medida.

A nova norma determina, entre outros pontos, que só o ministro do Trabalho pode incluir empregador­es na Lista Suja do Trabalho Escravo, que dificulta a obtenção de empréstimo­s em bancos públicos. A nova regra altera também a forma como se dão as fiscalizaç­ões, além de dificultar a comprovaçã­o e punição desse tipo de crime.

De acordo com auxiliares de Temer, o presidente designou que o ministro faça uma avaliação concreta de quais pontos podem ser alterados para que uma decisão seja tomada.

A principal preocupaçã­o do presidente é acertar eventuais alterações com a bancada ruralista – que tem 230 deputados e 24 senadores. O governo precisa desses votos não só para derrubar a denúncia, mas também para retomar sua agenda no Congresso.

O presidente da Frente da Parlamenta­r da Agropecuár­ia (FPA), deputado Nilson Leitão (PSDB-MT), disse ao Estadão/Broadcast que não sabia da possibilid­ade de o governo rever a portaria sobre o trabalho escravo. Ele defendeu a medida e disse que o ministério criou apenas um conceito sobre o trabalho escravo “para não deixar espaço para subjetivid­ade”.

O tucano negou que a FPA tenha feito exigências ao ministério e afirmou que os votos da bancada ruralista na segunda denúncia contra Temer não podem ser condiciona­dos à portaria. O Palácio do Planalto não quis se manifestar e disse que é o ministério do Trabalho que trata desse assunto.

Outra medida que gerou repercussã­o negativa e acabou sendo revogada pelo presidente foi a que extingue a Reserva Nacional de Cobre e Associados (Renca). Agora, entretanto, mesmo diante da polêmica o presidente reiterou a auxiliares a disposição em manter a decisão publicada até a votação da denúncia, no dia 25 de outubro.

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