Doria desiste de usar farinata na merenda
Composto alimentar foi questionado por especialistas e Ministério Público; produto não passou por análise da Secretaria de Educação
A Prefeitura desistiu ontem de usar a farinata, um composto alimentar, na merenda escolar. A medida havia sido criticada por especialistas em nutrição e questionada pelo Ministério Público. A gestão informou que a “prioridade” no uso do produto será o atendimento de famílias em situação de vulnerabilidade social.
A gestão João Doria (PSDB) desistiu ontem de usar a farinata – composto produzido a partir de alimentos próximos ao vencimento – na merenda de escolas municipais de São Paulo. O recuo ocorreu um dia após o prefeito anunciar a ideia, que foi alvo de críticas de especialistas e de questionamento do Ministério Público Estadual (MPE). A proposta também não chegou a passar por avaliação da Secretaria Municipal de Educação.
Anteontem, o prefeito havia dito que iniciaria o uso da farinata na merenda ainda neste mês. Na semana anterior, ele havia prometido o produto para a população carente. Já em nota ontem à noite, a gestão Doria informou que uma “eventual” distribuição da farinata “será de atribuição, principalmente, dos serviços municipais de assistência social” e usada na produção de pães, bolos e sopas.
Ainda segundo a Prefeitura, o plano de erradicação da fome vai dar prioridade ao atendimento de famílias em situação de vulnerabilidade social, em especial aquelas com crianças de até 3 anos. O principal objetivo da política, diz a nota, é reduzir o desperdício de alimentos.
A sugestão da farinata na merenda recebeu críticas de especialistas, mães de alunos e do MPE, que abriu ontem procedimento para apurar a proposta de levar o composto às escolas. Em um dia, o Ministério Público recebeu 57 representações, por e-mail, contra o projeto. A Igreja Católica, por sua vez, vinha defendendo a ideia, dizendo que o composto já era usado em ações sociais.
Em visita a Goiânia, Doria disse ontem que não haveria “afobação” para iniciar o programa e criticou o “aspecto ideológico” do debate, com manifesta-
Críticas.
Especialistas criticaram o fato de não terem sido dados detalhes sobre o programa nem um levantamento de alunos com mais necessidades nutricionais, por exemplo.
O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), do Ministério da Educação, por exemplo, prevê que a introdução de novo alimento (exceto frutas e hortaliças) ou alterações no preparo devem passar por “teste de aceitabilidade” pelos alunos, sob coordenação de nutricionista. O teste não pode ser feito em crianças com menos de 3 anos. A definição do cardápio na rede municipal cabe à Coordenadoria de Alimentação Escolar, da Secretaria de Educação, que não havia sido consultada sobre a ideia.
João César Castro, nutrólogo pela Unifesp, ressalta que a obesidade infantil é mais comum do que a desnutrição. “Mesmo nas famílias mais pobres a obesidade preocupa mais, porque elas optam por alimentos mais baratos que, em geral, têm muito açúcar, carboidrato e sódio.”
O Centro de Recuperação e Educação Nutricional é uma ONG que faz busca ativa de crianças com desvio nutricional na periferia de São Paulo. Dados mais recentes da ONG mostram que, entre crianças de 0 a 5 anos atendidas, 32,6% tinham déficit de estatura (indicador de desnutrição) e 35%, sobrepeso/obesidade. A Prefeitura disse não ter levantamento sobre as crianças desnutridas na cidade. /