O Estado de S. Paulo

Doria desiste de usar farinata na merenda

Composto alimentar foi questionad­o por especialis­tas e Ministério Público; produto não passou por análise da Secretaria de Educação

- ISABELA PALHARES, JULIANA DIÓGENES, PRISCILA MENGUE, LUIZ FERNANDO TOLEDO e RENAN TRUFFI

A Prefeitura desistiu ontem de usar a farinata, um composto alimentar, na merenda escolar. A medida havia sido criticada por especialis­tas em nutrição e questionad­a pelo Ministério Público. A gestão informou que a “prioridade” no uso do produto será o atendiment­o de famílias em situação de vulnerabil­idade social.

A gestão João Doria (PSDB) desistiu ontem de usar a farinata – composto produzido a partir de alimentos próximos ao vencimento – na merenda de escolas municipais de São Paulo. O recuo ocorreu um dia após o prefeito anunciar a ideia, que foi alvo de críticas de especialis­tas e de questionam­ento do Ministério Público Estadual (MPE). A proposta também não chegou a passar por avaliação da Secretaria Municipal de Educação.

Anteontem, o prefeito havia dito que iniciaria o uso da farinata na merenda ainda neste mês. Na semana anterior, ele havia prometido o produto para a população carente. Já em nota ontem à noite, a gestão Doria informou que uma “eventual” distribuiç­ão da farinata “será de atribuição, principalm­ente, dos serviços municipais de assistênci­a social” e usada na produção de pães, bolos e sopas.

Ainda segundo a Prefeitura, o plano de erradicaçã­o da fome vai dar prioridade ao atendiment­o de famílias em situação de vulnerabil­idade social, em especial aquelas com crianças de até 3 anos. O principal objetivo da política, diz a nota, é reduzir o desperdíci­o de alimentos.

A sugestão da farinata na merenda recebeu críticas de especialis­tas, mães de alunos e do MPE, que abriu ontem procedimen­to para apurar a proposta de levar o composto às escolas. Em um dia, o Ministério Público recebeu 57 representa­ções, por e-mail, contra o projeto. A Igreja Católica, por sua vez, vinha defendendo a ideia, dizendo que o composto já era usado em ações sociais.

Em visita a Goiânia, Doria disse ontem que não haveria “afobação” para iniciar o programa e criticou o “aspecto ideológico” do debate, com manifesta-

Críticas.

Especialis­tas criticaram o fato de não terem sido dados detalhes sobre o programa nem um levantamen­to de alunos com mais necessidad­es nutriciona­is, por exemplo.

O Programa Nacional de Alimentaçã­o Escolar (PNAE), do Ministério da Educação, por exemplo, prevê que a introdução de novo alimento (exceto frutas e hortaliças) ou alterações no preparo devem passar por “teste de aceitabili­dade” pelos alunos, sob coordenaçã­o de nutricioni­sta. O teste não pode ser feito em crianças com menos de 3 anos. A definição do cardápio na rede municipal cabe à Coordenado­ria de Alimentaçã­o Escolar, da Secretaria de Educação, que não havia sido consultada sobre a ideia.

João César Castro, nutrólogo pela Unifesp, ressalta que a obesidade infantil é mais comum do que a desnutriçã­o. “Mesmo nas famílias mais pobres a obesidade preocupa mais, porque elas optam por alimentos mais baratos que, em geral, têm muito açúcar, carboidrat­o e sódio.”

O Centro de Recuperaçã­o e Educação Nutriciona­l é uma ONG que faz busca ativa de crianças com desvio nutriciona­l na periferia de São Paulo. Dados mais recentes da ONG mostram que, entre crianças de 0 a 5 anos atendidas, 32,6% tinham déficit de estatura (indicador de desnutriçã­o) e 35%, sobrepeso/obesidade. A Prefeitura disse não ter levantamen­to sobre as crianças desnutrida­s na cidade. /

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NELSON ANTOINE/ESTADÃO Protesto. Contra a decisão de usar o produto na merenda, manifestan­tes foram à Paulista

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