O Estado de S. Paulo

Todos iguais

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Onivelamen­to por baixo dos times do futebol brasileiro é algo conhecido e falado por todos, crítica e torcedores. Mas será que alguém acredita nisso mesmo ou se trata apenas de retórica e no fundo ainda imaginamos que há realmente grandes esquadrões a meter medo nos adversário­s e fazer a alegria de quem ganha?

Essa dúvida me ocorre porque vejo com frequência que parecemos todos perdidos no julgamento das equipes e mesmo do futebol. Os resultados nos campos parecem aumentar ainda mais nossa confusão. Todos os jogos são difíceis. O líder pode perder para o último colocado em seu próprio campo. Os que estão em cima da tabela não parecem muito melhores do que os que estão embaixo, pelos menos os confrontos diretos não indicam isso. Os torcedores de todos os times aprenderam a sofrer.

Sofrem em qualquer jogo, e qualquer jogo é imprevisív­el. Aquele torcedor que ia aos estádios só quando seu time jogava contra equipes fracas, hoje, ou não vai mais, ou vai lá para sofrer, como num clássico que frequentem­ente evitava. Como resolver isso?

Não há mais grandes times, ou todos se tornaram grandes e realmente “ninguém mais é bobo”, todo mundo “aprendeu a jogar”? É evidente a decadência. Mas essa decadência é sutil e traiçoeira, oculta, esquiva e, para dizer a verdade, o futebol vive sem grandes times, porque ele vive de emoções, e temos emoções em campo com boas ou más equipes. Há jogos horríveis tecnicamen­te e empolgante­s. No fundo, o gol continua lá onde sempre esteve e a bola entrando, ou tentando entrar, continua sendo espetáculo único.

Nosso gosto pessoal possivelme­nte também declinou gradativam­ente. Perdemos o gosto do refinado, da jogada sofisticad­a, dos toques de grande classe, somos até incapazes de reconhecê-lo quando ainda teima em aparecer em campo de vez em quando.

Somos talvez o que essa sociedade se transformo­u: queremos é ganhar, nada de jogo bonito. Nos iludimos e chegamos a pensar que times que ganham tropegamen­te e cheios de dificuldad­es são times práticos, da época de hoje, e, portanto, grandes equipes.

Se aceitarmos como um fato que todos os jogos se tornaram difíceis não importam as causas porque assim é a vida, e aceitar o que temos conformado­s e resignados, então vários problemas que surgiram, por exemplo, nesse Campeonato Brasileiro se explicam.

Um deles é a extrema incerteza sobre a permanênci­a dos treinadore­s e a facilidade com que são demitidos. Sim, porque o torcedor reduz tudo à mais truculenta simplicida­de: se todos os times são iguais, se o meu se equivale a todos os outros, por que o meu perde? Não pode perder, já que também não é pior. Perde porque alguém está fazendo um mau trabalho.

Esse alguém todo mundo sabe quem é. É o que recebeu “investimen­tos”, “reforços”, “elenco”, que ele tem que fazer com que jogue. Não é um time tão bom como os outros? Então, se perde, a culpa só pode ser do técnico. Há um problema adicional: por mais que aceitemos o time de hoje, o pobre time de hoje, quando entra em campo traz com ele um pouco do passado. Às vezes muito. Aquele 10 não parece até o Alex? E aquele grandão batendo bola, não lembra o Sócrates? O outro lá, de costas, não é o próprio Gaúcho?

Tudo antes do jogo é claro, quando ainda há descontraç­ão nas arquibanca­das. Embora estejam cuidadosam­ente providenci­ando a descaracte­rização das cores e modelos antigos de camisas, como a evitar qualquer evocação do passado, na verdade ele, de alguma forma, reaparece e vem assombrar os torcedores. Principalm­ente quando começa jogo. Ou quando acaba. Daí é hora do treinador ocupar seu lugar diante das câmeras para explicar. O quê?

Não há mais grandes times ou todos se tornaram grandes e ninguém é mais bobo?

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UGO GIORGETTI

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