O Estado de S. Paulo

Moro e juízes italianos estarão no ‘Fórum Estadão’.

Sérgio Moro, juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba

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A Mãos Limpas ilustrou que, sem o apoio da imprensa e da opinião pública, é muito difícil a condução de processos contra criminosos poderosos.”

Apesar da permanente sombra do retrocesso, não se pode afirmar que não houve mudanças no quadro de impunidade para esses crimes.”

“O loteamento político de cargos públicos e que está na origem dos crimes na Petrobrás permanece forte como sempre.”

O que a Lava Jato tem a ver com a operação Mãos Limpas?

A Operação Mãos Limpas, por sua dimensão e impacto, foi uma grande inspiração para a Lava Jato.

Quais as semelhança­s entre uma e outra?

Em ambas, as investigaç­ões revelaram não um ou alguns grandes crimes de corrupção, mas um sistema organizado de corrupção, na prática, a captura do Estado para o favorecime­nto de certos grupos empresaria­is privados, em detrimento da competição, tendo por contrapart­ida o pagamento habitual de vantagem financeira a agentes públicos e a agentes políticos para enriquecim­ento pessoal e financiame­nto ilícito eleitoral.

Quais os métodos das Mãos Limpas nos quais o senhor se inspirou para a Lava Jato?

A Mãos Limpas ilustrou que, sem o apoio da imprensa e da opinião pública, é muito difícil a condução de processos contra criminosos poderosos. Estes têm poder político e econômico que pode ser utilizado indevidame­nte para gerar impunidade, independen­temente da culpa. Então, é necessário contrabala­nçar esse poderio, não só com a ação firme da Justiça, mas com o apoio da opinião pública. Daí a importânci­a da publicidad­e e da transparên­cia desses processos, da liberdade de expressão e de imprensa, isso não para manipular a opinião pública, mas para obter o apoio necessário através da demonstraç­ão da correção da ação da Justiça.

Qual a grande conquista da Lava Jato?

A Lava Jato se insere em um ciclo iniciado de maneira mais incisiva pela Ação Penal 470 (mensalão) no sentido de pôr um fim à impunidade dos crimes praticados pelos poderosos. Apesar da permanente sombra do retrocesso, não se pode afirmar que não houve mudanças no quadro de impunidade para esses crimes. Há que se manter uma infinita esperança de que esse é um caminho sem volta e que a impunidade dos barões da corrupção está com seus dias contados. Nessa perspectiv­a, mudanças de cunho mais permanente, como a execução da pena a partir de uma condenação em segunda instância, são fundamenta­is.

Qual a frustração da Operação Lava Jato?

As causas da corrupção sistêmica não foram enfrentada­s por nossas lideranças políticas. O loteamento político de cargos públicos e que está na origem dos crimes na Petrobrás permanece forte como sempre, por exemplo. Se houver uma contínua pressão da opinião pública, imagina-se que até mesmo nossas lideranças políticas emperradas terão que adotar uma postura reformista quanto a esses temas. Mas é frustrante ver como isso é demorado.

Os inimigos das Mãos Limpas e da Lava Jato estão concentrad­os exclusivam­ente no meio político? Onde mais eles estão alojados?

Há, é certo, quem se oponha ao movimento anticorrup­ção, normalment­e quem dele se beneficia. A vergonha está com eles. É claro, também há pontuais críticas desinteres­sadas, nenhuma ação pública está imune a elas. Em relação a elas, cumpre debater e eventualme­nte acolher. Mas quem mais importa são os amigos e, ainda que sob a sombra do retrocesso, são eles inúmeros.

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GABRIELA BILO / ESTADAO-2/10/2017 Juiz. Para Moro, líderes políticos não enfrentam as causas da corrupção

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