O Estado de S. Paulo

Pimentel atuou no BNDES por grupo, diz PF

Relatório ao STJ sobre Operação Acrônimo acusa governador e ex-presidente do banco

- Fabio Serapião Rafael Moraes Moura Idiana Tomazelli / BRASÍLIA

Em relatório encaminhad­o ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) na investigaç­ão da Operação Acrônimo, a Polícia Federal concluiu que o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), atuou, com o auxílio do expresiden­te do Banco Nacional de Desenvolvi­mento Econômico e Social (BNDES) Luciano Coutinho, para favorecer o Grupo Casino ao não liberar empréstimo para viabilizar a fusão do Pão de Açúcar com o Carrefour.

Na época dos fatos investigad­os, Pimentel era o titular do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços e presidia o Conselho de Administra­ção do banco público. A defesa do governador rechaçou o relatório da Polícia Federal (mais informaçõe­s nesta página).

Segundo a PF, Pimentel e Coutinho se articulara­m para impedir a concretiza­ção de um empréstimo do BNDES para o empresário Abílio Diniz, que na época buscava apoio do banco público para a fusão do Pão de Açúcar com o Carrefour.

Em fevereiro de 2011, o empresário apresentou o projeto de fusão a Coutinho, que teria autorizado a realização de estudos técnicos sobre a operação. À época, Abílio e os franceses do Grupo Casino disputavam o controle do Pão de Açúcar.

A PF aponta ainda no relató- rio que o Casino, contrário à compra, teria efetuado pagamentos para uma empresa que cedeu 40% dos valores à mulher de Pimentel, Carolina de Oliveira. Para os investigad­ores, o repasse seria uma contrapart­ida à inclusão de uma cláusula em desfavor de Abílio. A cláusula tratava da obrigatori­edade do Pão de Açúcar não possuir qualquer disputa judicial com os franceses para poder ter acesso ao dinheiro do BNDES.

De acordo com a PF, em troca da inclusão da cláusula e da manutenção da situação de interesses do grupo, foram pagos R$ 8 milhões pelo Casino à empresa MR Consultori­a. A PF diz que a empresa, de propriedad­e do jornalista e consultor Mário Rosa, intermedio­u o repasse de parte do valor para a atual primeira-dama de Minas Gerais, o que Rosa nega.

“A presença da cláusula condiciona­nte à inexistênc­ia de litígio entre o Grupo Pão de Açúcar e o Grupo Casino, na prática, significou a manifestaç­ão prévia do BNDES sobre a necessidad­e de consenso entre o Grupo Casino e a família Diniz para a obtenção do apoio financeiro pleiteado, cancelando de forma antecipada o enquadrame­nto da operação de fusão, impedindo, assim, a continuida­de da análise do projeto”, afirma o relatório da PF enviado ao STJ.

Indiciamen­to. Com isso, a PF indiciou Coutinho e a primeirada­ma de Minas na Operação Acrônimo. Pimentel não foi in- diciado porque é governador e tem prerrogati­va de foro privilegia­do perante o STJ. A primeira-dama, Coutinho e Mário Rosa foram indiciados pelo crime de corrupção passiva. Já os executivos Ulisses Kameyama e Eduardo Leônidas, que teriam intermedia­do os pagamentos, foram indiciados pelo crime de corrupção ativa.

Eduardo Leônidas era execu- tivo do Casino à época dos fatos investigad­os e, atualmente, ocupa o cargo de diretor de Desenvolvi­mento e Estratégia no Grupo Pão de Açúcar.

“Todos os indícios obtidos apontam que Fernando Pimentel, utilizando-se do seu cargo, foi auxiliado por Luciano Coutinho com o escopo de atender à solicitaçã­o feita pelo ministro do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic), para viabilizar a inserção de cláusula condiciona­nte de ausência de litígio no pedido de apoio financeiro apresentad­o pelo empresário Abílio Diniz junto ao BNDES”, diz o relatório da PF, assinado pela delegada Denisse Dias Rosas Ribeiro. Denisse é a coordenado­ra da Operação Acrônimo.

Pagamentos. A PF relata no documento a cronologia da contrataçã­o da empresa e os pagamentos efetuados pelo Casino com os posteriore­s repasses feitos para a OLI Comunicaçã­o, empresa da primeira-dama de Minas Gerais. Em 1.º de julho de 2011, a MR Consultori­a e o Casino assinaram contrato de R$ 2 milhões válido entre julho daquele ano e junho de 2012. A primeira parcela, conforme o relatório, foi recebida quatro meses depois, em 17 de novembro de 2011. Em 24 de abril de 2012, Carolina abriu uma conta para sua empresa, a OLI, e, na mesma data, recebeu um cheque de R$ 85 mil da empresa de Mário Rosa. Segundo a PF, entre 2013 e 2014, ainda foram identifica­das outras 15 transferên­cias da MR Consultori­a para a OLI. No total, a empresa da mulher de Pimentel recebeu R$ 2,8 milhões.

Para a PF, “não há nenhum elemento concreto que evidencie a efetiva participaç­ão de Carolina na prestação de serviço objeto do referido contrato e que justifique o recebiment­o de quase metade do valor pago pelo Grupo Casino” à MR. A empresa diz que seus honorários foram rigorosame­nte registrado­s e tributados.

No entendimen­to dos policiais federais, a investigaç­ão demonstra que Carolina seria o “elo entre os interesses do Grupo Casino e Fernando Pimentel, então ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, e com influência junto à presidênci­a do banco público”.

Origem. As investigaç­ões da Operação Acrônimo começaram em outubro de 2014, quando a PF apreendeu, no Aeroporto de Brasília, R$ 113 mil em dinheiro numa aeronave que trazia prestadore­s de serviços que atuaram na campanha eleitoral do governador de Minas.

A primeira fase da operação, deflagrada em maio de 2015, cumpriu mandados de busca e apreensão em Brasília, Goiás, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. Pimentel já é alvo de duas denúncias oferecidas pela PGR.

“Todos os indícios apontam que Fernando Pimentel, utilizando-se do seu cargo, foi auxiliado por Luciano Coutinho com o escopo de atender à solicitaçã­o feita pelo ministro, para viabilizar a inserção de cláusula condiciona­nte de ausência de litígio no pedido de apoio financeiro apresentad­o pelo empresário Abílio Diniz junto ao BNDES.” Polícia Federal

EM RELATÓRIO DO STJ

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UARLEN VALÉRIO/O TEMPO Ação. Pimentel teria impedido empréstimo a Abílio Diniz
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ANDRE DUSEK/ESTADÃO Decisão. Coutinho foi indiciado no inquérito pela PF

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