O Estado de S. Paulo

Sem fiscalizaç­ão, lei antibullyi­ng engatinha no País

Norma prevê ações contra violência na escola, mas falta sistematiz­ar, dizem especialis­tas; caso em Goiânia pôe tema novamente em debate

- Isabela Palhares Luiz Fernando Toledo

Há 18 meses em vigor no País, a lei antibullyi­ng, que prevê uma série de ações para identifica­r e combater esse tipo de violência nas escolas, ainda não virou realidade por problemas de fiscalizaç­ão ou monitorame­nto dos casos e de práticas preventiva­s. Para especialis­tas, sem diagnóstic­o da situação, na prática, a obrigação recai apenas sobre os colégios, que podem ser até processado­s pelos casos.

O debate sobre o tema veio novamente à tona após o bullying ter sido apontado pela polícia como um dos fatores que levaram um adolescent­e de 14 anos a atirar contra colegas em uma escola de Goiânia na última sexta. Dois alunos foram mortos e outros quatro ficaram feridos. A investigaç­ão ainda está em curso e não há conclusão sobre o peso do bullying como motivo do crime.

Desde fevereiro de 2016, está em vigor uma lei federal que determina ser dever de todas as escolas promover medidas de conscienti­zação, prevenção, diagnóstic­o e combate ao bullying. As escolas devem capacitar todos os professore­s, fazer campanhas de educação, oferecer assistênci­a psicológic­a e jurídica e instituir práticas de orientação também aos pais.

Um dos artigos da lei prevê que devem ser “produzidos e publicados relatórios bimestrais das ocorrência­s de intimidaçã­o sistemátic­a (bullying) nos Estados e municípios para planejamen­to das ações”. Questionad­o sobre quantos Estados e municípios haviam produzido esses relatórios, o Ministério da Educação (MEC) disse que eles não precisam ser encaminhad­os à pasta por causa da autonomia das redes de ensino.

Alessio Costa Lima, da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação, diz que os projetos antibullyi­ng nas escolas ainda são “pontuais”, já que não há ação sistematiz­ada para todo o País. “O fato de a lei ser aprovada não significa que vai ser imediatame­nte cumprida. Muitas escolas ainda desconhece­m.” Ele diz não ter informação sobre quantos municípios produziram os relatórios.

Idilvan Alencar, do Conselho Nacional de Secretário­s de Educação, também diz não saber se algum Estado produziu os relatórios. “O bullying está fortemente presente nas escolas e, com cresciment­o de grupos que tentam impedir discussões sobre gênero, discrimina­ção e intolerânc­ia em sala de aula, a tendência é de aumentar.”

Diagnóstic­o. “Não há acompanham­ento nacional, um programa que oriente escolas. O que há são boas ações pontuais, que nasceram do olhar de diretores e professore­s”, diz Luciene Tognetta, especialis­ta em psicologia escolar pela Universida­de Estadual Paulista (Unesp).

Em nota, o MEC diz que a lei é “basicament­e para Estados e municípios” e informou estar desenvolve­ndo plataforma para ações de educação em direitos humanos, em que haverá categoria específica para o tema.

Particular­es. Em escolas privadas, as estratégia­s vão desde o estímulo ao diálogo entre os alunos até a formação de grupos para treinament­o sobre como identifica­r e lidar com as situações. No Colégio Bandeirant­es, na zona sul de São Paulo, por exemplo, a direção fez parceria com uma universida­de para treinar professore­s e alunos.

Uma das iniciativa­s foi criar equipes formadas por alunos de todos os anos do ensino fundamenta­l, que passam a observar os colegas e oferecer ajuda. “Fizemos treinament­o de dois dias, com várias situações hipotética­s e como deveríamos agir em cada uma”, diz a aluna Carolina Ferrer, de 14 anos.

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DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO Bandeirant­es. Carolina Ferrer (no centro) e colegas aprendem a identifica­r conflitos

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