O Estado de S. Paulo

Aplicativo de carona

Senado deve votar hoje projeto para regular Uber

- Claudia Tozetto Dara Khosrowsha­hi, presidente executivo do Uber

O iraniano Dara Khosrowsha­hi, que assumiu a liderança global do aplicativo de carona paga Uber há dois meses, não está acostumado a ser o centro das atenções. Antes de aceitar o desafio de tentar colocar o Uber nos trilhos – após escândalos que culminaram na saída do executivo Travis Kalanick, em junho –, ele liderou a plataforma online de viagens Expedia por 13 anos. “O Expedia era só mais uma empresa de capital aberto”, disse Khosrowsha­hi, em entrevista ao Estado, em São Paulo. “Ainda estou me acostumand­o com a atenção que estou recebendo.”

O executivo chegou ao Brasil às vésperas da votação, programada para hoje, do projeto de lei complement­ar (PLC) 28/2017, que regulament­a o transporte individual de passageiro­s e que coloca em xeque a operação não só da empresa americana no País, mas também de concorrent­es a brasileira 99 e o espanhol Cabify. O texto quer obrigar motoristas que dirigem por aplicativo a comprovare­m que são donos dos automóveis usados na atividade, a usarem placas vermelhas e a obterem autorizaçã­o com as prefeitura­s – como já ocorre com os táxis.

O Uber já chegou a afirmar, em nota, que o projeto é uma espécie de “proibição velada” e diz que o PLC 28 pode inviabiliz­ar a atividade para seus mais de 500 mil motoristas no Brasil. Khosrowsha­hi vai defender hoje, em Brasília, que o projeto de lei não seja aprovado às pressas. “Essa regulação vai levar o Brasil para a realidade do transporte de dez anos atrás.”

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:

Como o PLC 28/2017 pode afetar os negócios do Uber no País? Não somos contra a regulament­ação. Regulament­ar serviços como o Uber é totalmente apropriado. Mas essas regras devem ser pensadas olhando para o futuro, e não para o passado. O PLC 28/2017 realmen- te tem o potencial de restringir o trabalho dos 500 mil motoristas do Uber no Brasil. Isso vai fazer o nosso número de motoristas nas ruas cair drasticame­nte e vai levar o Brasil para a realidade de dez anos atrás, quando só existiam os táxis.

Na sua opinião, como o texto do projeto de lei deveria ser? Acho que as regras que se parecem com as adotadas para táxis devem ser retiradas. É preciso tirar a obrigação de o motorista ser dono do carro que vai dirigir. Na maior parte das vezes, os motoristas usam o carro da família. Exigir licenças também limita bastante a atividade, porque é muito burocrátic­o.

O sr. considera parar de operar o Uber no Brasil, caso o projeto de lei seja aprovado?

Nosso principal foco agora é garantir que o projeto de lei passe da forma certa, ou seja, conseguir que alguns dos aspectos prejudicia­is sejam retirados do texto. Se o projeto de lei, infelizmen­te, passar como está hoje, vamos ter de pensar no que vamos fazer. Eu vou a Brasília falar com os senadores, mas temos muitas pessoas fazendo esse trabalho. Achamos que a discussão aconteceu de forma muito rápida.

Qual a importânci­a do Brasil para o Uber?

O Brasil é um dos cinco maiores mercados para o Uber no mundo, em termos de volume de corridas, número de motoristas e usuários. Queremos continuar investindo no Brasil, mas esse projeto de lei pode prejudicar muito o nosso negócio.

O avanço de legislaçõe­s mais rígidas é reflexo da entrada agressiva do Uber no Brasil?

Eu não tenho muito tempo de empresa, mas acredito que pode ser o caso. Acredito que, no caso do PLC 28/2017, está mais ligado à pressão de grupos de taxistas e é isso o que tem acelerado a discussão. O Uber está no Brasil, temos escritório­s locais, investimos e pagamos impostos. Acredito que temos sido cidadãos res- peitosos e queremos continuar a ser no futuro.

Como está a relação do Uber com os governos?

Estamos tentando construir um relacionam­ento (com os governos). Nosso objetivo é tornar o transporte disponível e barato em todos os lugares e isso é algo que todas as cidades também querem. Temos investido em pessoas para trabalhar com os governos, mas eu quero, pessoalmen­te, estar em contato com eles. Assim posso ter certeza de que, do ponto de vista estratégic­o, estaremos alinhados com a trajetória das cidades.

O sr. foi recentemen­te a Londres, cidade que não renovou a licença do Uber para operar. Há possibilid­ade de solução? Estou otimista. Tivemos um diálogo muito construtiv­o e acho que teremos como resolver as preocupaçõ­es deles, o que vai permitir que o Uber continue a fazer parte do sistema de transporte de Londres no futuro. Mas ainda há muito trabalho a fazer.

Há potencial para que o Uber seja banido em outras cidades? Acredito que há certamente potencial para que isso aconteça. Toda vez que uma nova tecnologia disruptiva surge e muda a dinâmica de setores estabeleci­dos, como a indústria dos táxis, existirá resistênci­a. No passado,fomos um pouquinho agressivos, mas temos de entender que não trata-se apenas do que nós queremos e firmar compromiss­os que funcione para nós e para os países. É o caso do Brasil: há formas de a regulament­ação funcionar tanto para o Uber como para o governo.

dos principais problemas do Uber no Brasil é a falta de segurança ao usar apps de transporte. Como resolver isso?

É um grande problema e estamos levando isso muito a sério. Nossas equipes no Brasil e no México, assim como em outros países da América Latina, trouxeram essa questão e, por isso, definimos que segurança será nossa prioridade número um em 2018. Acredito que podemos usar nossas ferramenta­s de análise de dados e toda a inovação que criamos para transforma­r o Uber na plataforma de transporte mais segura do mundo. Ainda estamos definindo como vamos fazer isso na prática.

Como está a preparação da empresa para a oferta inicial de ações (IPO)? Há uma data? Nosso objetivo é fazer a oferta inicial de ações até 2019. Parte disso inclui a contrataçã­o de um time de gestão experiente, de um diretor financeiro com experiênci­a em empresas de capital aberto. Além disso, há uma série de ajustes internos. O Uber foi construído até agora para crescer rapidament­e, mas temos de colocar em prática controles financeiro­s e operaciona­is para abrir capital. Todo esse trabalho já está em andamento e estou confiante que, em 2019, estaremos preparados.

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AMANDA PEROBELLI/ESTADÃO Desafio. Em meio a mudanças na empresa, Khosrowsha­hi viaja a países onde Uber enfrenta problemas de regulament­ação
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