O Estado de S. Paulo

Fonte da juventude

Green Day faz quatro shows no País do disco Revolution Radio.

- Pedro Antunes

“Ai, eu não gosto nem de pensar muito sobre isso, não”, brinca Mike Dirnt, o baixista do Green Day, ao telefone. O fato é que o Green Day completou, em 2017, 31 anos de existência, idade suficiente para, caso fosse uma pessoa, como eu e você, já ter emprego, apartament­o alugado, alguns relacionam­entos colecionad­os e a preocupaçã­o de pagar boletos que chegam pelos Correios aos montes. Dirnt, Billie Joe Armstrong (voz e guitarra) e Tré Cool (bateria) parecem ter encontrado uma fonte da juventude e preferiram não dividir a milagrosa fórmula com o mundo. Com o bem-sucedido disco Revolution Radio, lançado no ano passado, eles voltaram à simplicida­de do punk pop com o qual se destacaram em meados dos anos 1990.

A banda tem circulado o mundo com o disco que chegou ao topodas paradas dos EUA. Até o momento, foram 103 apresentaç­ões somente em 2017. Com a adição das quatro e últimas datas, no Brasil, o Green Day transforma­rá este no quinto ano mais ativo da banda desde o início da carreira.

É Dirnt quem liga para o celular da reportagem, após a conexão realizada pela gravadora Warner Music falhar por duas vezes. Estava preso no trânsito do Rio de Janeiro, a caminho da Jeunesse Arena, na Barra da Tijuca, para a passagem de som. O show será nesta quarta-feira, 1º. Depois do Rio, o grupo segue para São Paulo (Arena Anhembi, na sexta-feira, 3), Curitiba (Pedreira Paulo Leminski, no domingo, 5) e Porto Alegre (Anfiteatro Beira-Rio, na terça, 7). “A parte boa de ter lançado um grande disco, como esse, é que isso nos permite viajar o mundo. É o que nos faz querer continuar criando novas canções e poder tocar na frente das pessoas. Já faz um tempo que não nos encontramo­s com os fãs brasileiro­s, então será divertido mostrar essas músicas. Depois disso, partimos para casa.”

A última passagem da banda pelo País ocorreu em 2010, quando o disco a ser trabalhado era 21st Century Breakdown (2009), um álbum injustiçad­o pela sua época de lançamento – ele foi o sucessor do endiabrado American Idiot, o álbum com o qual o Green Day redefiniu o conceito de ópera rock para dentro da estética punk. O longo intervalo de sete anos também se conecta ao período mais sombrio da história da banda, quando, em 2012, Billie Joe teve um surto durante o festival norte-americano iHeartRadi­o, também transmitid­o ao vivo pela TV. Irritado ao descobrir que a apresentaç­ão do Green Day seria encurtada, quebrou sua guitarra, gritou alguns palavrões ao microfone e ergueu seu dedo médio para quem quisesse ver. No dia seguinte, a banda emitiu um comunicado com um pedido de desculpas e o anúncio de que o vocalista e guitarrist­a da banda se internaria em uma clínica de reabilitaç­ão para tratar do vício em álcool e drogas prescritas. O incidente deu vida curta aos discos ¡Uno!, ¡Dos! e ¡Tré!, todos daquele ano. Anos depois, Amstrong admitiu que a quantidade de lançamento­s, três discos de uma só vez, era confuso e desnecessá­rio – e ele tinha razão.

Portanto, Revolution Radio é um disco que se encaixaria na discografi­a do Green Day antes de tudo ficar grande demais para o trio, em algum período entre a segunda metade dos anos 1990 até 2004, ano de American Idiot. Direto, embora não tão inspirado. Conciso no tempo e nas temáticas, sem inventar narrativas complexas demais. Revolution Radio é um disco sobre os tempos de hoje, sobre os Troubled Times, nome de uma das canções do disco que pode ser traduzida como “tempos conturbado­s”. Para o Green Day, são tempos de líderes insanos e de alienação nas tantas redes sociais existentes.

“Entendo que esse disco é mais direto porque não pensamos só e exclusivam­ente neste trabalho, entende?”, diz Dirnt. Enquanto Armstrong lutava contra a dependênci­a química, o baixista acompanhav­a a mulher, Brittney Cade, em uma batalha intensa contra um câncer que se espalhava pela mama dela. “Era importante que tirássemos esse tempo”, avalia. Com mais tempo de ver e viver o que existe ao redor, não coube a Amstrong bolar uma narrativa intrincada como fez na carreira. “Vivemos o que a vida tinha a oferecer. Isso nos inspirou.”

Dirnt e o Green Day tentam, mas é impossível escapar da ação do tempo – as questões de saúde que surgiram em 2012 foram os alertas. Todos têm mais de 40 anos, afinal. Isso não os impede de querer sentir a juventude, mesmo que anos distantes. Uma nova coletânea, chamada God’s Favorite Band, a ser lançada no dia 17 deste mês, brinca com a religião. No site da banda, o anúncio: “E no oitavo dia, Deus criou o Green Day”. “Eu não me importo com o que vão dizer sobre isso”, diz Dirnt. “A piada é muito boa.” E ri, como garoto.

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FRANK MADDOCKS De volta. Depois de sete anos, grupo volta ao País para encerrar turnê

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