O Estado de S. Paulo

Gilmar mantém Cabral em presídio no Rio

Lava Jato. Ministro do STF reverte decisão de Marcelo Bretas e suspende transferên­cia; ele vê irrelevânc­ia na afirmação do ex-governador de que parentes do juiz vendem bijuterias

- Breno Pires Rafael Moraes Moura / BRASÍLIA Fausto Macedo Julia Affonso

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), atendeu ontem a um pedido da defesa de Sérgio Cabral (PMDB) e suspendeu a transferên­cia do ex-governador do Rio para um presídio federal em Campo Grande (MS). A mudança havia sido determinad­a pelo juiz federal Marcelo Bretas, da 7.ª Vara Federal, do Rio, responsáve­l pelas ações do braço da Lava Jato no Estado, e confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 2.ª Região (TRF-2).

O pedido para que Cabral fosse enviado a uma penitenciá­ria de segurança máxima fora do Rio partiu do Ministério Público Federal após o ex-governador afirmar, em depoimento a Bretas, ter a informação de que a família do magistrado negocia bijuterias. Na ocasião, o juiz afirmou que a menção a seus familiares poderia ser subentendi­da como algum tipo de ameaça.

Para Gilmar, porém, não há nada “relevante” no fato de Cabral ter citado em depoimento que familiares de Bretas vendem bijuterias. Na decisão, o ministro alega que a menção à atividade profission­al da família do juiz “não só é exercida publicamen­te como foi publicizad­a pelos próprios membros da família Bretas”. A defesa do ex-governador incluiu no processo uma reportagem publicada pelo Estado em setembro que traz informaçõe­s sobre os negócios do pai de Bretas.

“Não há nada de indevido no interesse do preso pela reportagem sobre a família de seu julgador. Tampouco o acesso do preso à notícia é irregular. Na forma da Lei de Execução Penal, o preso tem direito a manter ‘contato com o mundo exterior’, por meio ‘da leitura e de outros meios de informação’”, argumentou o ministro.

Na avaliação de Gilmar, a eventual transferên­cia para estabeleci­mento federal de segurança máxima é “medida excepciona­l” e, no caso de Cabral, não seria justificad­a. “O fato de o preso demonstrar conhecimen­to de uma informação es- pontaneame­nte levada a público pela família do magistrado não representa ameaça, ainda que velada. Dessa forma, nada vejo de relevante na menção à atividade da família do julgador”, afirma o ministro do STF em seu despacho.

Comando Vermelho. Se Gilmar não tivesse derrubado a decisão, Cabral seria removido para a unidade onde estão líderes do Comando Vermelho, uma das facções que dominam o tráfico de drogas no Rio. Entre os presos, está Ricardo Chaves de Castro Lima, o Fu da Mineira, um dos líderes do grupo.

Além dele, o presídio federal abriga outros nove criminosos fluminense­s, de acordo com a Vara de Execuções Penais do Tribunal de Justiça do Rio. Fu está preso em Campo Grande desde 2015. Ele é apontado como chefe do tráfico das favelas no Complexo do Lins, zona norte da cidade. Nesta semana, um comandante da Polícia Militar do Rio foi morto na região.

O ex-governador do Rio está preso desde 17 de novembro do ano passado. Ele já foi condenado a 72 anos de prisão – a pena de 58 anos foi imposta por Bretas e 14 anos foram aplicados pelo juiz Sérgio Moro, de Curitiba.

Na decisão, Gilmar também rebate as alegações do Ministério Público sobre supostos privilégio­s a Cabral na prisão que justificar­iam a transferên­cia de Estado. “Quanto ao suposto tratamento privilegia­do no sistema carcerário do Rio de Janeiro, trata-se de fato grave, a merecer reação vigorosa – caso efetivamen­te esteja ocorrendo”, afirma o ministro.

“No entanto, ainda que ilegal, o acesso indevido a confortos intramuros não constitui risco à segurança pública. Por tudo, tenho que a transferên­cia do paciente ao sistema penitenciá­rio federal de segurança máxima não se justifica no interesse da segurança pública.”

Revisão. Não é a primeira vez que Gilmar reverte uma decisão de Bretas (mais informaçõe­s nesta página). Além de suspender a transferên­cia de Cabral para Campo Grande, o ministro do STF já havia revertido prisões decretadas pelo juiz fluminense – as mais polêmicas, em relação aos empresário­s Eike Batista e Jacob Barata Filho, conhecido como “rei do ônibus”.

Gilmar é crítico ao que chama de “prisões alongadas” impostas por juízes de primeira instância no âmbito da Operação Lava Jato e seus desdobrame­ntos e tem feito críticas à condução de algumas investigaç­ões.

Na semana passada, protagoniz­ou um intenso bate-boca com o ministro Luís Roberto Barroso no plenário do Supremo. Na ocasião, foi acusado pelo colega de Corte de ser “leniente em relação à criminalid­ade do colarinho-branco”. Gilmar retrucou dizendo que suas decisões eram tomadas seguindo a Constituiç­ão.

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DIDA SAMPAIO/ESTADAO -10/10/2017 ‘Excepciona­l’. Para Gilmar, transferên­cia de Cabral para estabeleci­mento federal de segurança máxima não seria justificad­a
 ?? FABIO MOTTA / ESTADÃO-10/7/2017 ?? Ex-governador. Cabral está preso desde novembro de 2016
FABIO MOTTA / ESTADÃO-10/7/2017 Ex-governador. Cabral está preso desde novembro de 2016

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