O Estado de S. Paulo

Em ‘A Trama’, Cantet expõe as tensões da sociedade francesa

Filme encerra a 41ª Mostra após a cerimônia de premiação, hoje às 20h no Cinearte 1 do Conjunto Nacional

- Luiz Zanin Oricchio

A Mostra chega ao fim e, depois da cerimônia de premiação, marcada para 20h desta quarta, 1º, no Cinearte 1, apresenta um filme muito especial – A Trama, do francês Laurent Cantet. O longa mostra a capacidade do cineasta em reunir um grupo de pessoas e, dele, fazer um microcosmo da sociedade francesa, com suas contradiçõ­es espalhando-se pelas bordas.

No caso, trata-se de um grupo de jovens, reunido em torno de uma escritora famosa para um workshop de literatura. A ideia é escrever um thriller em conjunto, sob orientação da professora. O grupo é representa­tivo da multiplici­dade étnica e cultural da França contemporâ­nea. Como costuma aconte- cer nesse tipo de proposta, a trama ficcional mantém contatos estreitos com a realidade. Engloba elementos da vida real e, deformando-os, expressa com mais clareza tensões acomoda- das e muitas vezes reprimidas. Sobressai, em particular, o relacionam­ento da escritora famosa, Olivia (Marina Foïs) e o mais rebelde dos alunos, Antoine. Uma França fustigada pelas tentações da extrema-direita emerge dessa ficção que se aproxima bastante da realidade. Faz também lembrar o Brasil contemporâ­neo.

O último dia de Mostra reserva ainda uma série imperdível de atrações. Além de A Trama, o cinéfilo não deve perder de vista o iraniano Sem Data, Sem Assinatura, de Vahid Jalilvand. É uma história de dilema ético como só eles sabem fazer. Um médico, o doutor Nariman, acaba envolvido num acidente com um motociclis­ta e sua família. Uma criança fica ferida. Nada muito grave. Ele presta assistênci­a, quer levá-la a um hospital, mas o pai resolve ir embora com o filho. No dia seguinte, a criança aparece morta, vítima de botulismo, segundo autópsia realizada. Nariman não se conforma. O menino morreu por envenename­nto ou o acidente teria sido a causa? A história tem desdobrame­ntos imprevisív­eis e nos deixa sempre em suspenso. Diante de nós, surge o Irã em toda sua complexida­de e não com a simplifica­ção, como é visto pela mídia ocidental.

Outra atração é A Hollywood de Hitler, de Rüdiger Suchsland. O foco é a indústria cinematogr­áfica montada para promover a grandeza do III Reich. Entre 1933 e 1945, a Alemanha produziu cerca de mil filmes, muitos de ótima qualidade técnica. Formou seu star system e não se limitou a obras de propaganda sob o comando de Goebbels. Essa filmografi­a torna-se um filão de extraordin­ário valor para compreende­r o inconscien­te coletivo de um país que conduziu Hitler ao poder e provocou uma guerra fatal.

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ARCHIPEL 35 Grupo. Longa traz a multiplici­dade étnica e cultural francesa

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