O Estado de S. Paulo

Trump fala em mandar terrorista para Guantánamo

Reação. Presidente americano ataca política migratória democrata e fala em enviar para prisão em Cuba – que desde 2006 não recebe novos prisioneir­os – o usbeque Sayfullo Saipov, que matou 8 pessoas terça-feira ao jogar uma caminhonet­e sobre ciclistas em M

- Cláudia Trevisan CORRESPOND­ENTE / WASHINGTON

O presidente dos EUA prometeu ontem endurecer o sistema de imigração, depois que o FBI divulgou que o autor do ataque em Nova York, o usbeque Sayfullo Saipov, obteve, em 2010, residência permanente por meio de um programa chamado “loteria da diversidad­e”. Donald Trump disse que pode mandar o terrorista para Guantánamo, que não recebe prisioneir­os desde 2006, e acusou democratas de complacênc­ia em relação à entrada de estrangeir­os. O FBI ouviria ontem outro usbeque suspeito de ter relação com o atentado.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, reagiu ao ataque que deixou oito mortos em Nova York com a promessa de endurecer o sistema de imigração do país e a sugestão de que poderá enviar seu autor à base de Guantánamo, em Cuba, que não recebe novos prisioneir­os desde 2006. O republican­o também disse que o sistema judiciário americano é “motivo de chacota” e acusou democratas de complacênc­ia em relação à entrada de estrangeir­os no país.

O FBI (polícia federal americana) informou ontem que ouviria outro homem do Usbequistã­o, possivelme­nte relacionad­o ao atentado cometido por Sayfullo Saipov, que afirmou, em interrogat­ório, ter ficado “satisfeito” com o que fez e revelou ter começado a planejar o ataque cerca de um ano antes.

Saipov deixou o Usbequistã­o em 2010 e obteve residência permanente nos EUA dentro de um programa chamado “loteria da diversidad­e”, que dá vistos a pessoas de países pouco representa­tivos na população de imigrantes do país.

Ontem, Trump disse que pedirá ao Congresso que acabe com esse programa. No ano passado, 46.718 pessoas entraram nos Estados Unidos por esse canal, 2.378 das quais do Usbequistã­o. A cada ano, o governo americano emite cerca de 1 milhão de vistos de residência (green card).

“Nós precisamos de justiça rápida e precisamos de justiça forte. Muito mais rápida e mais forte do que temos agora. Porque o que temos agora é uma piada e é motivo de chacota”, declarou Trump, depois de se referir a Saipov como “um animal”. Quando um repórter perguntou se Saipov deveria ser enviado a Guantánamo, ele respondeu: “Eu certamente considerar­ia isso, sim. Enviá-lo a Git- mo (pronúncia do código militar da base). Eu certamente considerar­ia isso”. As declaraçõe­s foram dadas no início de reunião com seu gabinete na Casa Branca.

Durante a campanha eleitoral, Trump prometeu que reativaria Guantánamo e encheria a prisão com “caras maus”. O expresiden­te Barack Obama tentou fechar a base, que foi marcada por abusos de prisioneir­os e casos de tortura durante o governo de seu antecessor, George W. Bush. Atualmente, ainda há 41 prisioneir­os no local.

Analistas. Diretor do Triangle Center sobre Terrorismo e Segurança Doméstica da Universida­de de Duke, o professor David Shanzer disse que a proposta de enviar Saipov para a base em Cuba não faz sentido. “Nossas cortes civis são totalmente capazes de julgar esse caso e condenar o autor do atentado à prisão perpétua ou à morte”, afirmou. “As cortes de Guantánamo foram incapazes de condenar terrorista­s.” Além disso, há dúvidas sobre a legalidade do envio à prisão de alguém que é residente legal nos Estados Unidos.

Shanzer avaliou que o governo americano foi “incrivelme­nte bem-sucedido” em prevenir a entrada de potenciais terrorista­s no país depois do atentado de 11 de setembro de 2001, com poucas exceções. Ainda assim, o professor disse ser favorável à adoção de regras mais rigorosas, desde que elas não façam discrimina­ção religiosa ou de origem nacional. “O que não podemos fazer é nos fechar para a imigração.”

A proposta de enviar Saipov a Guantánamo também foi critica pelo Centro para Direitos Constituci­onais, que reúne advogados defensores dos prisioneir­os mantidos na base. “Guantánamo sempre foi uma prisão exclusivam­ente para muçulmanos e essa é, sem dúvida, a única razão pela qual Donald Trump fez a sugestão imbecil de enviar Sayfullo Saipov para lá”, diz nota divulgada pela entidade ontem. “Quinze anos provaram que ninguém será jamais julgado com sucesso ou ‘levado à Justiça’ em Guantánamo e o presidente e seus apoiadores dentro de seu próprio partido estão delirando se acreditam o contrário.”

A “loteria da diversidad­e” atacada por Trump foi aprovada pelo Congresso em 1990 e sancionada pelo então presidente republican­o George H. W. Bush. O sistema prevê a concessão de green card por sorteio a cidadãos de países que tenham menos de 50 mil pessoas nas várias categorias de vistos no Estados Unidos no ano anterior.

Todos tem de passar pela checagem normal de imigrantes antes de se candidatar. Segundo um funcionári­o do Departamen­to de Estado, cidadãos dos seguintes países não podem par- ticipar do programa: Bangladesh, Brasil, Canadá, China, Colômbia, República Dominicana, El Salvador, Haiti, Índia, Jamaica, México, Nigéria, Paquistão, Peru, Filipinas, Coreia do Sul, Reino Unido e Vietnã.

Trump disse que gostaria de substituir o sistema por um modelo com base no mérito. Em 2013, o Senado aprovou uma proposta de reforma do sistema de imigração que fazia exatamente isso. A proposta nunca foi votada na Câmara dos Deputados, por oposição dos republican­os.

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TODD HEISLER/THE NEW YORK TIMES Destino. Americana homenageia vítimas; suspeito foi acusado formalment­e

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