O Estado de S. Paulo

Sob escombros

Selton Mello e a minissérie de Luciano Moura que você já pode ver no GloboPlay, ‘Treze Dias Longe do Sol’

- Luiz Carlos Merten

Selton Mello faz o sobreviven­te de um desabament­o em minissérie.

Desde a 0h desta quinta, 2, encontram-se disponívei­s no Globo Play os dez episódios de Treze Dias Longe do Sol. A minissérie de Luciano Moura, escrita por Elena Soárez e estrelada por Selton Mello, deveria estrear somente em janeiro, na TV aberta, mas aí a Globo achou que precisava de uma grande atração para comemorar o segundo aniversári­o de sua plataforma digital de streaming. Moura precisou dar um pau, mas, ufa!, conseguiu. Na terça, 31, acompanhad­o pela roteirista, ele mostrou ao Estado os dois primeiros episódios.

Selton Mello faz Saulo, o engenheiro responsáve­l pela construção de um prédio enorme. O primeiro episódio chama-se Falha Estrutural e, de cara, Saulo, que está sendo cobrado para inaugurar logo o prédio, pede ao operário que coloque mais argamassa para tapar aquela rachadura no pilar. ‘Já colocamos’, diz o mestre de obras. ‘Coloquem mais’, insiste Saulo. O horror, o horror, o prédio vem abaixo. A partir daí, a narrativa desenvolve-se em duas frentes. No subsolo do prédio, onde estão os poucos sobreviven­tes, incluindo Saulo e a filha do dono do prédio, que veio fazer a vistoria – Carolina Dieckman –, e na superfície, onde os responsáve­is pela firma buscam um bode expiatório, a quem culpar pelo desabament­o.

Para todos os efeitos, o povo lá embaixo está morto. Fazendo a ligação entre as duas partes, está o herói da história – Saulo é o anti-herói. Tão obsessivo quanto ele, o chefe dos bombeiros não desiste de escavar nos escom- bros buscando sobreviven­tes. Fabrício Boliveira é quem faz o papel. “P... ator, não é?”, comenta o diretor Moura. “É uma das coisas de que mais me orgulho nesse trabalho. Ter colocado o Bolívar nesse grande papel. Estamos vivendo um momento de afirmação das identidade­s e é bom que nosso herói seja um homem negro.” Selton Mello não chega a ser um anti-herói, mas ele transgredi­u uma linha e foi num caminho sem volta que resultou na implosão. “A situaçãoli­mite faz com que apareça o melhor e o pior das pessoas. Vamos saber mais sobre o Saulo, o que o levou a cruzar essa linha, mas lá embaixo, ao iniciar a subida, ele estará buscando a remissão”, explica a roteirista Elena Soárez.

E Selton Mello? “E aí, gostou?” é a primeira coisa que ele quer saber, numa entrevista por telefone, de Roma. Selton está na capital italiana participan­do do Festival de Roma com O Filme da Minha Vida. “Nunca estive num festival como Cannes e isso aqui está sendo um barato. O Festival de Roma é bem grande. Estamos participan­do da mostra principal, competitiv­a, com os Irmãos Taviani e Steven Soder- bergh. O Filme da Minha Vida já teve sua sessão oficial, com direito a Q&A ( pergunta e resposta) no fim da exibição. Deu para sentir que o público ficou motivado.”

Num ano difícil para o cinema de autor brasileiro, Selton Mello comemora como uma vitória os

300 mil espectador­es que conseguiu com sua adaptação do livro do chileno Antonio Skármeta, de

O Carteiro e o Poeta. “É muito menos que os 600 mil de O Palhaço, mas neste ano não dá para ficar reclamando. O filme já está nas plataforma­s de streaming, e a resposta do público é muito boa. As pessoas se ligam nas questões propostas pelo filme. Família, paternidad­e ( o livro chama-se ‘Um

Pai de Cinema’). Embora os números não sejam espetacula­res, o feedback para a gente sempre foi muito bom.” E o Treze Dias Longe

do Sol? “Cara, voltei a trabalhar muito como ator recentemen­te, mas nunca tinha feito nada parecido. Um filme com muita ação física e elementos de disaster movie, embora não seja realmente um filme-catástrofe.”

Ele considera Luciano Moura “um grande diretor”. Elena Soárez “é essa super-roteirista. Fizeram um trabalho muito bonito”. Mesmo assim, Mello vacilou. “Sentei-me com ele mais de uma vez para longas conversas. O Selton temia até pelo risco físico, mas gostava do roteiro, e isso foi fundamenta­l. Quando entrou, veio de cabeça, como todo o mundo”, conta o diretor. E Selton – “O Luciano tinha uma consciênci­a muito grande do que estava fazendo. A Elena, também. Ela pesquisou muito para criar esses personagen­s, as situações. As curvas ( dramáticas) são muito fortes.” Para o público que começa a ver Treze Dias, será difícil não fazer a liga. O prédio que implode é o Brasil, a subida pelos escombros tem a ver com o esforço ético de reerguer essa nação. O segundo episódio é Tem Saí

da. O País tem saída? “Olha, não vou dizer que a gente fez para refletir sobre isso, mas essas coisas estão no ar. A Elena define essa situação como um caldo que entranhou na gente e do qual não conseguimo­s fugir”, reflete Moura. Há uma gama muito rica e variada de personagen­s secundário­s. São interpreta­dos por atores recrutados de todo o Brasil. Os temas não são só a sobrevivên­cia, a corrupção. Tem gente saindo do armário, casais implodindo com o prédio. Por que Selton Mello? “Porque eu precisava de um ator que segurasse a complexida­de do personagem”, diz Moura. E Selton, não tem vontade de dirigir na Globo? “Eles vivem me convidando, e acho que agora vai. Apresentei a sinopse de O Alienista, de Machado de Assis, que quero muito fazer. Vai ser uma minissérie também de dez capítulos.”

Nunca tinha feito nada parecido. Um filme com muita ação física e elementos de disaster movie, mas que não é de catástrofe”

Estou em Roma com ‘O Filme da Minha Vida’, que está tendo uma resposta muito boa do público no festival de cinema”

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FOTOS RAMÓN VASCONCELO­S/GLOBO O ator. Como Saulo, engenheiro responsáve­l pela construção do prédio que desaba
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Dupla. O diretor Luciano Moura e a roteirista Elena Soárez

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