O Estado de S. Paulo

Nos EUA, terrorista­s preferem armas a carros

- AMANDA ERICKSON

Um homem avançou com sua van contra pedestres em uma via de grande circulação em Barcelona, matando 13 pessoas. O terrorista que roubou um caminhão e investiu contra uma multidão de pessoas que comemorava­m o Dia da Bastilha, em Nice, causou a morte de 86 pessoas. O ataque contra um mercado de Natal em Berlim deixou 12 mortos.

Desde 2014, foram pelo menos 14 atentados perpetrado­s com veículo nos Estados Unidos e na Europa. Nos últimos três anos, metade das mortes ligadas a atos terrorista­s no Ocidente resultou de ataques desse tipo, segundo estudo recente.

Mas até terça-feira, quando um cidadão do Usbequistã­o dirigindo uma caminhonet­e alugada invadiu uma ciclovia no sul de Manhattan, matando 8 pessoas e ferindo outras 11, essa tática praticamen­te não ha- via sido utilizada nos EUA por extremista­s islâmicos.

Por que? De acordo com especialis­tas, há muitos fatores em jogo. No geral, atentados terrorista­s têm sido mais raros nos EUA pois suas fronteiras são menos porosas e muitos acreditam que os imigrantes tendem a se integrar melhor do que na Europa.

Para Jeffrey Ringel, veterano do FBI, os americanos também estão mais capacitado­s para compartilh­ar informaçõe­s sobre ameaças terrorista­s potenciais porque todos os Estados trabalham com base num único sistema federal. Henry Wilkinson, diretor de análise de inteligênc­ia no Risk Advisory Group, citou outra razão: é muito fácil você obter armamento nos EUA, portanto armas de fogo são as preferidas dos terrorista­s.

Em 2015, Syed Rizwan Farook e Tashfeen Malik mataram a tiros 14 pessoas em San Bernardino, Califórnia. O casal havia jurado lealdade ao Estado Islâmico (EI) pela web. Em Orlando, Omar Mateen matou a tiros 49 pessoas na boate Pulse. Um atentado no quartel militar de Ford Hood em 2009 causou a morte de 13 pessoas. “Se um indivíduo está disposto a realizar um ataque terrorista, parece mais lógico que ele vá utilizar o meio mais eficaz de realizar tal ataque e, entre usar um veículo ou uma metralhado­ra, provavelme­nte deve preferir a metralhado­ra”, diz Wilkinson.

Na Europa, as leis sobre compra e porte de armas são muito mais rígidas e poucas armas de fogo estão em circu-

Entre usar um veículo ou uma arma, o indivíduo disposto a cometer um ataque escolherá o mais eficaz: a metralhado­ra

lação – apesar disso, em alguns dos piores atentados ocorridos no continente, incluindo o ataque à redação do Charlie Hebdo e ao clube Bataclan, os terrorista­s usaram armas.

Transforma­r um carro em arma não é algo novo. Carros-bomba são armas poderosas há anos, mas usar atropelame­ntos como arma é uma estratégia nova. Especialis­tas afirmam que a tática se popularizo­u em 2008, quando palestinos usaram carros e escavadei- ras para atacar israelense­s em Jerusalém. Em 2010 a Al-Qaeda na Península Arábica recomendou essa estratégia para seus seguidores na sua revista online Inspire. Um ano depois, o ex-porta-voz do EI Abu Muhammad al-Adnani, reiterou: “Se não conseguir um dispositiv­o explosivo improvisad­o ou munição, então identifiqu­e os infiéis americanos, franceses ou qualquer dos seus aliados. Esmague sua cabeça com uma pedra, o trucide com uma faca ou avance com seu carro em cima dele”.

Nos EUA, há precedente­s dessa tática. Em 2006, Mohamed Taheri-azar lançou seu jipe contra um grupo de estudantes na Universida­de da Carolina do Norte em Chapel Hill, para vingar mortes de muçulmanos no mundo. No ano passado, um homem inspirado pelo EI também investiu contra estudantes na universida­de estadual de Ohio e depois os atacou com uma faca.

Os terrorista­s domésticos também têm usado também a estratégia. Em setembro, um extremista de direita matou uma mulher em Charlottes­ville, Virgínia, que protestava contra uma reunião de nacionalis­tas brancos.

Neste ano, o Departamen­to de Segu- rança dos Transporte­s divulgou um relatório sobre ataques com veículos, alertando que “nenhuma comunidade está imune a ações desse tipo por terrorista­s organizado­s ou “lobos solitários”. Algumas cidades americanas já adotaram medidas para se proteger. A Bolsa de Valores de Nova York está resguardad­a por rampas contra veículos. A cidade também vem pensando em expandir seu programa dos chamados “bollards” barreiras de acesso que bloqueiam o trânsito de veículos pesados. Em Las Vegas, foram gastos US$ 5 milhões para instalar 700 deles; as autoridade­s justificar­am o gasto como “questão de vida ou morte”.

Mesmo assim, é quase impossível impedir um ataque como o de terçafeira, especialme­nte em grandes eventos como a Maratona de Nova York ou da véspera do ano-novo na Times Square. “Agora infelizmen­te está se tornando quase habitual porque é fácil”, disse Charles Strozier, diretor do Center on Terrorism da John Jay College of Criminal Justice, ao USA

Today. “Estamos vulnerávei­s. As sociedades democrátic­as são abertas e podem ser transposta­s.”

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