O Estado de S. Paulo

Situação de Trump se complica

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Aposição do presidente Donald Trump já não está sendo abalada apenas pelo seu comportame­nto desabrido – para dizer o mínimo – com relação tanto a assuntos internos como internacio­nais, tratados por meio de mensagens agressivas, via Twitter, o que, por si só, já basta para criar um clima de incerteza e inseguranç­a. A isso se junta agora outra ameaça ainda maior: a evolução da investigaç­ão sobre a suspeita de possível interferên­cia de agentes a serviço do governo russo na campanha eleitoral do ano passado para favorecê-lo, que começa a apresentar seus primeiros resultados concretos.

O primeiro deles foi a colocação em prisão domiciliar, por uma juíza federal de Washington, do ex-chefe da campanha de Trump, Paul Manafort, e seu sócio Richard Gates, no quadro das investigaç­ões conduzidas pelo procurador especial Roberto Mueller. Manafort foi acusado de 12 crimes, entre os quais conspiraçã­o contra os Estados Unidos e lavagem de dinheiro. As acusações, das quais ele se declarou inocente, se concentram na atuação dos dois sócios como consultore­s do ex-presidente da Ucrânia, Victor Yanukovych, aliado da Rússia, derrubado por uma rebelião popular em 2014.

Não há referência à possível interferên­cia russa na campanha eleitoral para prejudicar a concorrent­e de Trump, a democrata Hillary Clinton, na denúncia que levou Manafort e Gates à prisão, fato imediatame­nte ressaltado pela portavoz da Casa Branca, Sarah Sanders. Mas, além de as acusações e a prisão indicarem que as investigaç­ões estão andando rapidament­e, há o risco de induzirem ambos a fechar um acordo de cooperação com o procurador Mueller e, em consequênc­ia, fornecerem informaçõe­s compromete­doras para o presidente.

Mais grave foi o lance seguinte do caso: o acordo de delação feito por George Papadopoul­os, integrante do grupo de assessores de política externa de Trump durante a campanha. Ele estabelece­u a primeira e explosiva relação direta entre um membro da campanha e pessoas próximas ao governo do presidente russo, Vladimir Putin. Papadopoul­os diz ter tratado com o próprio Trump, durante uma reunião da qual participar­am outros assessores, em 31 de março de 2016, de um possível encontro entre ele e Putin.

E apresentou e-mail de 22 de abril, tratando desse assunto, enviado ao supervisor da campanha, dizendo que Putin concordava com o encontro. Desconfian­ças de parte a parte teriam impedido que o encontro acontecess­e. Nesse caso, a explicação da porta-voz Sanders é que Papadopoul­os era uma figura secundária, um assessor voluntário, insinuando que por isso não teria poder para aquele tipo de iniciativa.

Tudo isso indica que a situação de Trump se torna a cada dia mais delicada. Ela sai do terreno da retórica e das insinuaçõe­s para entrar no dos fortes indícios e mesmo dos primeiros elementos concretos que apontam para a confirmaçã­o das denúncias de que agentes russos interferir­am na eleição americana para denegrir Hillary Clinton e favorecer Trump. Se Manafort seguir o caminho aberto por Papadopoul­os – de cooperar com as investigaç­ões comandadas pelo procurador Mueller, que vem dando provas seguidas de sua independên­cia e determinaç­ão – e dispuser de elementos que comprovem a interferên­cia russa, a ameaça a Trump passa a ser real.

Em vez de apresentar argumentos plausíveis em sua defesa, o presidente continua a apelar para ataques raivosos e sem papas na língua, por meio do Twitter, destinados a desviar a atenção do que realmente importa e que viraram a marca de seu comportame­nto: “Desculpem, mas isso aconteceu há anos, antes de Paul Manafort fazer parte da campanha. Mas por que a vigarista Hillary & os democratas não são o foco ( referindo-se a um dossiê que os democratas teriam elaborado para comprometê-lo) ????”

O que já se pergunta é o que farão as principais lideranças do Partido Republican­o, se continuare­m a surgir indícios e provas de que de fato houve interferên­cia russa com a cumplicida­de de Trump.

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