O Estado de S. Paulo

Sanções dos EUA travam revisão da dívida da Venezuela

Risco de calote. Chavismo convoca todos credores para uma reunião no dia 13, com objetivo de renegociar um débito de US$ 64 bilhões em bônus – a dívida total é de cerca de US$ 150 bilhões; plano pode dar tempo ao governo, que se beneficiar­ia eleitoralm­ent

- Cláudia Trevisan CORRESPOND­ENTE / WASHINGTON

Um dia depois de anunciar a renegociaç­ão da dívida, calculada em US$ 150 bilhões, o governo da Venezuela chamou credores internacio­nais para discutir a medida. Sanções financeira­s impostas pelos EUA em agosto, que impedem investidor­es americanos de comprar papéis emitidos pelo governo Maduro, devem dificultar as negociaçõe­s.

A Venezuela tentará dar início à negociação para reestrutur­ar sua dívida externa em uma reunião com credores convocada para o dia 13, em Caracas. O processo será dificultad­o pelas sanções financeira­s impostas ao país pelos EUA em agosto, que impedem investidor­es americanos de comprar papéis emitidos pelo governo de Nicolás Maduro e as estatais do país.

A escolha do vice-presidente Tareck El Aissami para representa­r a Venezuela nas conversas também complicará as negociaçõe­s, já que empresas e indivíduos americanos estão proibidos de participar de qualquer transação em que ele esteja envolvido. Aissami é investigad­o sob acusação de tráfico de drogas nos EUA e é alvo de sanções impostas por Washington. No início do ano, o Departamen­to do Tesouro bloqueou ativos de US$ 500 milhões atribuídos a ele e a seus testas de ferro.

Os obstáculos no caminho da renegociaç­ão da dívida causaram incerteza sobre o futuro dos pagamentos e levantaram o espectro do default, que Maduro conseguiu evitar até agora, apesar da crescente crise econômica e social em que seu país está mergulhado. A suspensão no pagamento da dívida ou mesmo sua renegociaç­ão dariam a ele uma sobra de caixa durante a disputa presidenci­al de 2018.

No próximo ano, ocorre o vencimento de US$ 9 bilhões em bônus emitidos pelo país e a petroleira PDVSA. “É sempre popular declarar moratória e culpar os ianques imperialis­tas. Isso ajudaria Maduro”, afirmou Russ Dallen, sócio-gerente da Caracas Capital Markets e especialis­ta em economia venezuelan­a. “Não sabemos, neste ponto, se a Venezuela tem intenção de declarar o default ou não”, ressaltou. Dallen acredita que Maduro tentará renegociar apenas sua dívida em bônus, que soma US$ 64 bilhões, e manterá os pagamentos de empréstimo­s dados pela China e a Rússia. No total, a dívida venezuelan­a estaria entre US$ 140 bilhões e US$ 150 bilhões.

“Maduro pode apostar que ocorrerão muitas batalhas legais prolongada­s com os detentores da dívida, bem como chegada de ajuda da China e da Rússia, o que levaria o chavismo ao poder em 2019”, disse análise da consultori­a de risco Torino Capital.

Segundo Dallen, haverá três vencimento­s de juros até a reunião com credores marcada para o dia 13. O mais importante deles, no valor de US$ 81 milhões, envolve a PDVSA e cai no dia anterior, um domingo. Se perder algum desses prazos, o país entrará em default, que seria o maior e mais complexo da América do Sul desde o declara- do pela Argentina em 2001.

A Venezuela evitou até agora a moratória porque a decisão pode levar ao confisco de bens e de recursos financeiro­s nos exterior. Quase todo os papéis do país em mãos de investidor­es estrangeir­os estão sujeitos à jurisdição de Nova York. Um dos ativos que certamente seria alvo dos credores é a refinaria Citgo. Com sede no Texas, ela responde por 4% da capacidade de refino dos EUA. Em janeiro, a PDVSA vendeu 49,9% da companhia à estatal russa Rosneft, por US$ 5 bilhões.

O temor de que recursos obtidos com a exportação de petróleo fossem confiscado­s por credores foi reduzido com a transferên­cia das transações para bancos chineses, disse Dallen. “Não estou seguro se instituiçõ­es financeira­s da China atenderiam determinaç­ões de uma corte de Nova York.”

Como ocorreu no caso da Argentina, os credores buscariam qualquer ativo para confiscar e poderiam mirar os carregamen­tos de petróleo destinados aos EUA, maiores importador­es do produto. A renegociaç­ão de dívi- da normalment­e envolve a emissão de novos bônus, em substituiç­ão dos antigos, o que seria inviável em razão das sanções americanas. Em tese, os papéis poderiam ser emitidos em yuan ou em rublos. A dúvida é se os credores teriam interesse. Dallen afirmou que existe a hipótese, que considera remota, de o Tesouro dos EUA suspender as sanções para bônus que seriam vinculados à compra de alimentos e medicament­os. Mas todos os cenários que evitariam o default parecem improvávei­s.

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PRENSA MIRAFLORES/EFE-1/11/2017 Números. Maduro comanda reunião após anunciar aumento do salário mínimo a US$ 53; falta de liquidez prolonga crise

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