O Estado de S. Paulo

Roteiro para um ano difícil

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Protestos foram anunciados e já se mencionou a hipótese de greve. Também deverá haver resistênci­a no Congresso e o Executivo terá, mais uma vez, de negociar as mudanças.

O governo continuará batalhando no próximo ano para realizar os gastos obrigatóri­os, conter o Orçamento dentro do limite oficial – um déficit primário de R$ 159 bilhões – e, se possível, aplicar um pouco mais de dinheiro no Programa de Aceleração do Cresciment­o (PAC). O projeto de lei orçamentár­ia enviado ao Congresso no fim de agosto previa um buraco de R$ 129 bilhões nas contas primárias. Uma atualizaçã­o do projeto foi remetida ao Legislativ­o segunda-feira passada, com o saldo negativo revisto e novas projeções tanto da receita como de alguns grupos de despesas. Para maior segurança, o Executivo editou duas medidas provisória­s (MPs), uma com aumento de Imposto de Renda sobre fundos exclusivos, outra com providên- cias mais duras: o reajuste salarial de várias categorias do funcionali­smo será adiado de 2018 para 2019 e a contribuiç­ão previdenci­ária de alguns grupos de servidores passará de 11% para 14%. Este aumento valerá para a parcela dos salários acima do limite máximo fixado para os benefícios da Previdênci­a.

Representa­ntes do funcionali­smo já se manifestar­am contra o adiamento do reajuste salarial e a elevação das contribuiç­ões. Protestos foram anunciados e já se mencionou a hipótese de greve. Também deverá haver resistênci­a no Congresso e o Executivo, mais uma vez, terá de negociar a aprovação das mudanças. Mas quase certamente haverá problemas também na atualizaçã­o da proposta orçamentár­ia.

Por prudência, o governo manteve na versão revista a projeção de cresciment­o econômico de 2% em 2018 e de inflação de 4,2%, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Com esses e outros parâmetros, a arrecadaçã­o total estimada para o ano passou de R$ 1,44 trilhão para R$ 1,46 trilhão, com acréscimo de 1,32%. A expectativ­a de receita líquida, isto é, descontada­s as transferên­cias, subiu de R$ 1,33 trilhão para R$ 1,37 trilhão. A projeção de 2% de aumento do Produto Interno Bruto (PIB) é apontada por alguns como conservado­ra, porque a variação estimada pelo mercado já chegou a 2,5% e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, tem mencionado a hipótese de números melhores que esse.

Mais uma vez, como tem ocorrido regularmen­te há muito tempo, congressis­tas deverão apoiar uma revisão da receita prevista na mensagem do Executivo. O relator de receitas do Orçamento, senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO), já declarou a intenção de aumentar a arreca- dação projetada. A mudança, como sempre, criará espaço para aumento de gastos e, especialme­nte, para ampliação da parcela destinada às emendas de parlamenta­res.

Se os negociador­es do Executivo falharem no esforço de frear essa revisão, restará o recurso ao veto presidenci­al e a uma reorganiza­ção dos números, pela equipe econômica, antes da promulgaçã­o da lei orçamentár­ia. Essa arrumação também já tem ocorrido.

O principal desafio, nesta altura, é mesmo garantir o adiamento do reajuste salarial e o aumento da contribuiç­ão previdenci­ária dos servidores. Além disso, o Executivo reviu de R$ 969 para R$ 965 o salário mínimo previsto para o próximo ano, mas o valor poderá ser alterado com os números finais da inflação de 2017.

Fechar o ano com déficit primário (sem juros) igual ou inferior a R$ 159 bilhões será, apesar de tudo, apenas parte do esforço necessário para recompor as contas públicas. No fim do próximo ano a dívida pública ainda estará em cresciment­o. Pelas novas projeções, a dívida bruta do setor público passará de 75,7% do PIB previstos para o fim de 2017 para 80,7% em 2020. O pesado endividame­nto oficial será um dos piores componente­s, provavelme­nte o pior, da herança deixada para o próximo governo. O legado será bem melhor se a reforma da Previdênci­a for logo aprovada, de preferênci­a neste ano, como tem insistido o ministro da Fazenda.

Mas essa aprovação, assim como o encaminham­ento razoável da proposta orçamentár­ia, depende do compromiss­o dos parlamenta­res com o interesse nacional objetivo, reconhecid­o em seus componente­s materiais e aritmético­s. Isso é assunto para estadistas.

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