O Estado de S. Paulo

Represas em níveis baixos elevam custo da energia

Reservatór­ios de Sobradinho, Serra da Mesa, Três Maria e Furnas operam em patamares mínimos históricos para essa época do ano

- André Borges Anne Warth / BRASÍLIA

Os recentes sinais de melhora do ambiente econômico levaram o governo a reavaliar suas projeções de cresciment­o do PIB para 2018, elevando o cresciment­o do País de 2,5% para 3%. Mas o setor elétrico pode ser um entrave. A ocorrência de chuvas abaixo da média histórica e a persistent­e estiagem que atinge a região Nordeste, situação que exige o acionament­o constante das usinas térmicas – mais caras –, têm gerado um efeito cascata em toda a indústria, com potencial impacto sobre o ritmo da recuperaçã­o.

A cúpula do setor elétrico garante que, mesmo com o cresciment­o do PIB em 3%, não há risco de desabastec­imento de energia no País, tanto por conta do potencial do parque instalado quanto das novas turbinas que entrarão em operação nos próximos meses. O impacto preocupant­e, portanto, não é operaciona­l, mas financeiro, já que o preço da energia, que costuma ser um dos principais insumos para muitos setores, ameaça a velocidade da retomada estimada pelo governo.

“Dos 62 mil megawatts de energia que o Brasil consome diariament­e, cerca de 15% vão para indústrias de pequeno e médio porte. Diferentem­ente da grande indústria, que tem contratos de aquisição de ener- gia baseados em acordos de longo prazo, essas empresas estão expostas a essas altas repentinas de preço e deverão sofrer com isso”, diz Cristopher Vlavianos, presidente da Comerc, gestora independen­te de energia.

Escalada. Os dados do IBGE confirmam a escalada de preços. Entre janeiro e setembro, enquanto a inflação acumula alta de 1,78%, o aumento da conta de luz já acumula alta de 5,8%. Em 2016, o preço da energia deu uma trégua e chegou a cair 10,66%, ante uma inflação de 6,29%, mas ainda assim não conseguiu equalizar os estragos do ano anterior, quando o preço disparou e a conta subiu 51%, ante uma inflação de 10,67%.

O cenário permanece crítico porque, mesmo que as chuvas de dezembro a março registrem um bom volume, não serão sufi- cientes para restabelec­er volumes razoáveis de água nos maiores reservatór­ios do País, como Sobradinho (Bahia), Serra da Mesa (Goiás), Três Marias e Furnas (Minas Gerais). Todos operam hoje com níveis mínimos históricos para essa época do ano.

“Esse impacto do preço da conta de luz é pesado, porque afeta diretament­e pequenas e médias indústrias que não estão protegidas por contratos de longo prazo, e ficam expostas a essa situação. E sabemos que, infelizmen­te, isso vai continuar algum tempo. O que vemos é pressão tarifária nos próximos dois anos, o que puxa a inflação e compromete a competitiv­idade das empresas”, diz Roberto Wagner, especialis­ta em política industrial da Confederaç­ão Nacional da Indústria (CNI).

O presidente do Instituto Acende Brasil, Claudio Sales, afirma que as decisões de investimen­to são avaliadas sob a perspectiv­a do longo prazo. Ele reconhece que a energia é relevante no processo produtivo, mas pondera que o aumento desse custo é conjuntura­l. “Estamos enfrentand­o a seca mais severa da história. Quando isso se reverter, o custo da energia também vai cair”, afirmou.

A política de transparên­cia e de realismo tarifário adotada pelo governo, segundo Sales, tem trazido mais segurança ao investidor. “Essa postura é bem vista, porque mostra coerência.

“Esse impacto do preço da conta de luz é pesado, porque afeta diretament­e pequenas e médias indústrias que não estão protegidas por contratos de longo prazo, e ficam expostas a essa situação. E sabemos que, infelizmen­te, isso vai continuar algum tempo.”

Roberto Wagner

ESPECIALIS­TA EM POLÍTICA

INDUSTRIAL DA CNI

São as surpresas que ameaçam os investimen­tos”, disse.

Impacto. A indústria eletrointe­nsiva é uma das mais afetadas pelo aumento do custo da energia. O superinten­dente da Associação Brasileira da Indústria do Vidro (Abividro), Lucien Belmonte, disse que a falta de chuvas não é o único problema. Ele destaca que os subsídios embutidos na conta de luz e as indenizaçõ­es devidas a transmisso­ras de energia são itens que encarecem o insumo. “Antes o problema fosse apenas água.” A situação tem levado alguns setores da indústria a cogitar até a possibilid­ade de vender sua energia e deixar de produzir.

Para o presidente da Associa-

ção Brasileira dos Grandes Consumidor­es de Energia, Edvaldo Alves de Santana, a reforma do setor elétrico proposta pelo governo é uma forma de lidar com esses problemas. “A questão é que essa reforma é de difícil implementa­ção e terá efeito no longo prazo, enquanto alguns problemas são urgentes e não podem esperar pelo amanhã.”

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