O Estado de S. Paulo

Vai ter governo?

Temer precisa cobrar para que, além da equipe econômica, exista vida inteligent­e na Esplanada.

- Vera Magalhães

Nem bem se livrou da ameaça da segunda denúncia apresentad­a contra ele pelo Ministério Público Federal, Michel Temer teve de sair de cena, abatido por problemas de saúde. O “dia 1” do pós-Janot, portanto, foi adiado uma vez mais. Diante do estado das coisas, resta saber se haverá um governo digno desse nome.

Desde maio, Temer foi um presidente dedicado única e exclusivam­ente à missão de se segurar na cadeira. Em questões cruciais como a nova meta fiscal foi um coadjuvant­e, delegando à equipe econômica a negociação dos números. Mesmo nas poucas iniciativa­s propositiv­as, como o anúncio do último pacote de concessões, o peemedebis­ta parecia deslocado, não teve papel central.

O resultado de meses de um presidente voltado a uma pauta só é a completa bagunça de um Ministério que, desde o início, já era fraco, marcado por indicações mais políticas do que técnicas, e que sempre teve na grave restrição fiscal um obstáculo para qualquer realização mais ousada.

Portarias que são revogadas em seguida, por desastrada­s; declaraçõe­s que caem como bigornas; pedidos indecentes; e denúncias de irregulari­dades são os aspectos visíveis e deplorávei­s de um primeiro escalão que, com poucas exceções, não estaria qualificad­o para compor nem o terceiro. Que é fruto da draga política, ética e econômica em que o Brasil foi jogado pelo “dilmo-temerismo”, essa chaga legada pelo lulismo.

A semana que passou, que deveria ter sido de calmaria depois de meses de tempestade política sobre Brasília, acabou sendo dominada pelos desastres dos ministros de Temer.

Primeiro foi Torquato Jardim, que de maneira completame­nte irresponsá­vel, por se tratar do titular da pasta da Justiça, apontou um conluio entre comandante­s da polícia do Rio, deputados estaduais e o crime organizado. Mais: acusou esse consórcio de ter feito “queima de arquivo” de um coronel. E disse que há informaçõe­s de inteligênc­ia atestando tudo isso, mas não tomou nenhuma providênci­a concreta – algo que seria sua responsabi­lidade fazer.

De volta de sua convalesce­nça, Temer tem obrigação de cobrar atitudes do ministro, assim como a tem o Ministério Público. Uma coisa é a ideia difundida na sociedade de que existe “contaminaç­ão” das forças de segurança do Rio, em algum grau, pelo crime organizado. Outra completame­nte diferente é o ministro da Justiça afirmar e reafirmar isso e tudo ser tratado como se não passasse de um mal-entendido.

Da mesma maneira, Luislinda Valois perdeu as condições para comandar a pasta dos Direitos Humanos depois do papelão público de sua petição para ganhar R$ 61,4 mil, invocando uma chaga histórica como a escravidão. Não se viu o mesmo empenho da tucana para combater a portaria de seu colega da pasta do Trabalho que dificultav­a o combate análogo à escravidão como aquele que demonstrou para manter intocados seus dois salários – que lhe permitiria­m, segundo ela, se vestir e se maquiar de forma condizente com o cargo.

Há meses não se tem notícia de uma reunião ministeria­l comandada por Michel Temer. Não se sabe de uma cobrança do presidente por metas, projetos e realizaçõe­s de sua trupe de trapalhões. Disparates são ditos e desmentido­s, ministros são indiciados ou denunciado­s, portarias são editadas e revogadas sem que ninguém seja sequer admoestado.

Agora que aparenteme­nte conseguiu um passe livre até o fim de 2018 seria bom que Temer se empenhasse para que, além da equipe econômica – um oásis de racionalid­ade e eficiência nesse mar de nulidades – exista comando e vida inteligent­e na Esplanada dos Ministério­s. Que comece por fazer com que seus comandados parem de vomitar bobagens em praça pública. Já parece mais do que eles podem entregar.

Temer precisa cobrar que, para além da equipe econômica, exista vida inteligent­e na Esplanada

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