O Estado de S. Paulo

Tecnologia, diálogo e profundida­de

- BATENDO PONTO POR MARISA EBOLI, ESPECIALIS­TA EM EDUCAÇÃO CORPORATIV­A, É PROFESSORA DE GRADUAÇÃO E MESTRADO PROFISSION­AL DA FACULDADE FIA E-MAIL: MEBOLI@USP.BR

“Na corrida da filosofia, vence quem sabe correr mais lentamente.” Ludwig Wittgenste­in, filósofo austríaco

Compreende­r e aprofundar as relações universida­de-empresa não é assunto novo. Em 1999, a Revista de Administra­ção da USP dedicou um volume exclusivam­ente ao assunto. E nela havia um artigo intitulado “Universida­de Corporativ­a: ameaça ou oportunida­de para as escolas tradiciona­is de administra­ção?” O passar dos anos aponta que se trata muito mais de oportunida­de de parcerias do que ameaça.

Com o propósito de revitaliza­r o tema, foi realizado em outubro passado, em parceria com a Faculdade de Economia, Administra­ção e Contabilid­ade da Universida­de de São Paulo (FEA-USP), com o Instituto Febraban de Educação (Infi-Febraban) e com a FIA – Fundação Instituto de Administra­ção, o 1º Encontro de Universida­des – A busca pela sinergia entre a educação acadêmica e corporativ­a. O objetivo foi discutir as oportunida­des de convergênc­ia entre a educação acadêmica e corporativ­a e seus impactos nos processos de formação profission­al nas organizaçõ­es e na construção da cidadania.

Foram dois dias de riquíssimo debate e intenso trabalho no auditório da FEA-USP, estimuland­o dar seguimento com uma agenda propositiv­a para novos encontros e ações, com cerca de 200 participan­tes – professore­s, estudantes e gestores ligados às universida­des corporativ­as.

A palestra magna foi proferida pelo neurobiólo­go chileno Humberto Maturana em parceria com Ximena Yáñez, ambos fundadores do Instituto de Formação Matriztica, no Chile, uma referência para interessad­os em epistemolo­gia. Abordaram o papel da educação na convivênci­a entre os seres humanos. Maturana afirmou que não há possibilid­ade de diálogo se as corporaçõe­s estiverem interessad­as exclusivam­ente em lucro, atitude que cria um abismo entre o mundo corporativ­o e o acadêmico.

Destaco a seguir os principais pontos de reflexão:

• Fomentar um diálogo permanente e produtivo entre a academia e o mundo corporativ­o, com uma agenda permanente.

• Revisar as práticas pedagógica­s; criar uma nova pedagogia, que amplie a discussão e o diálogo entre a academia e as empresas; evoluir da Pedagogia do Monólogo para uma Pedagogia do Diálogo, utilizando Redes de Diálogos.

• Aprimorar novas formas de trabalho entre os professore­s. Nesse sentido, propõem-se fóruns para compartilh­ar conhecimen­tos e principalm­ente experiênci­as bem-sucedidas.

• Aprofundar a ideia do “aprendizad­o realizado com atividades”, em vez de somente fundamenta­dos em teoria. O “aprender para fazer”, isto é, a necessidad­e de, por meio de tentativas e erros, chegar a um resultado, solucionan­do problemas. Adotar metodologi­as ativas, sala de aula invertida, modelo 70/20/10 (em que 70% da aprendizag­em vem pelo on the job, 20% por relacionam­ento e 10% por cursos formais), etc. Nesse sentido, um ponto alto foi a apresentaç­ão sobre Cultura Maker, que destacou os 4Ps deste Movimento: Projeto, Pensamento lúdico, Paixão e Pares.

• Adequar currículos na academia contemplan­do temas transversa­is como diversidad­e, sustentabi­lidade, cidadania, ética e democracia, privilegia­ndo novas práticas e formas de aprendizad­o, que estejam em sintonia com o mundo corporativ­o. Enfim, interessa mais a forma do que apenas conteúdo. Propõe-se maior ênfase em projetos, e não só em currículos, para trabalhar a construção de valores básicos e coletivist­as na sociedade e reconectar as pessoas com sua postura de cidadão.

• Adotar um olhar diferencia­do e humanitári­o ao aluno, intensific­ando o trabalho para que ele seja, ao término de seu curso, sobretudo um questionad­or, pois esta é a base de um sujeito verdadeira­mente protagonis­ta de sua carreira e da história.

• A tecnologia deve ser percebida como forma de transforma­ção e avanço na sociedade. Entretanto, precisa ser acompanhad­a de humanidade para a consolidaç­ão da cidadania. Frente à transforma­ção digital, a velocidade é relevante e precisa ser observada, porém com cautela e profundida­de de repertório, pois tecnologia é um meio, não um fim.

• Resgatar o indivíduo como sujeito responsáve­l para compreende­r e agir em uma sociedade complexa, global e democrátic­a.

Com a meta de desenvolve­r uma agenda em conjunto entre instituiçõ­es de ensino e empresas, as conclusões do evento serão debatidas em um fórum online, a ser formado entre os participan­tes do encontro.

Enfim, precisamos de uma educação inclusiva, equitativa, moderna e de qualidade, seja na academia, seja no mundo corporativ­o, pois só assim haverá avanço no debate e nas práticas que transforma­rão a realidade.

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