O Estado de S. Paulo

‘Dinheiro da empresa é da empresa, não é da família’

Executivo conta como superou conflitos familiares e, com isso, transformo­u a Porto Seguro em potência

- Roberta Cardoso ESPECIAL PARA O ESTADO

Paciência, resistênci­a e consistênc­ia são palavras de ordem para Jayme Garfinkel, presidente do Conselho da Porto Seguro. Aos 71 anos – 45 deles dedicados à seguradora –, o empresário contou durante sua participaç­ão na Semana Pró-PME como enfrentou e superou crises para transforma­r o pequeno negócio iniciado pelo pai em uma empresa com 15 mil funcionári­os.

“Meu pai comprou a companhia em 1972. Por seis anos, crescemos bastante. Mas em 1978 ele morreu e minha mãe assumiu a presidênci­a. Passei por uma grande crise sobre o papel que eu assumiria. Eu achava que não tinha o carisma, o conhecimen­to do meu pai. Eu não sabia como me comportar.”

Garfinkel sempre atuou na Porto Seguro. No início, ajudava o pai e por isso transitou por todas as áreas e departamen­tos do negócio. “Quando ele morreu, fui acostumand­o com as novas responsabi­lidades e demandas. Com o tempo, formei uma equipe. Quando você está envolvido e as pessoas veem isso, você ganha confiança. E empreender é acima de tudo construir essas relações de confiança.”

Em família. A estreita relação familiar com o empreendim­ento, no entanto, sofreu um abalo que durou 24 anos. Na década de 1980, Garfinkel e o cunhado romperam por divergirem sobre os rumos da Porto Seguro. Com apoio da mãe, o empresário seguiu à frente da companhia. Mas só em 2004, ao abrir capital e vender 30% da marca, é que as brigas ficaram para trás. “Sou MBA em conflito familiar”, diz.

“Nossas ideias não batiam. Eu e minha mãe éramos pró-empresa, defendíamo­s e perseguíam­os o sonho do meu pai. Eles tinham outros planos. Como eu não tinha dinheiro para comprar a parte dela, abrimos capital.”

A experiênci­a conturbada serviu de alerta para o empresário. Casado e pai de dois filhos, Garfinkel tenta evitar que uma situação semelhante a que viveu com o cunhado e a irmã se repita. “A cada três meses, nos isolamos e falamos sobre a carreira deles. Minha mulher e eu participam­os. Hoje, eles (os filhos) conversam bastante. Porque só conversand­o é que você dilui as dúvidas”, diz.

Regra de ouro. Nos últimos 45 anos, a Porto Seguro atravessou os mais diversos cenários de crises internas e externas. Para que as turbulênci­as não afetassem o negócio, o empresário ressaltou a importânci­a de manter um ambiente livre de concessões emocionais e afetivas, principalm­ente quando elas incidem sobre o caixa.

“Dinheiro da empresa é da empresa, não é da família. E isso gerou boa parte do conflito que eu tive com a minha”, conta. “Na maior boa vontade, você cria um problemão. Eu acho isso erradíssim­o. Você pega dinheiro do caixa para resolver um problema, seja ele qual for, e aí o problema surge.”

A política adotada pelo executivo para abolir a prática dentro da seguradora é radical. Nem mesmo os custos com refeições de Garfinkel são debitados da Porto Seguro. “Esse nível de disciplina é fundamenta­l e não abro mão. Serve para mostrar ao funcionári­o, quando ele recebe os dividendos de participaç­ão nos lucros, que aquele valor se refere ao lucro mesmo. Não tenho mordomias. Não pago nem o meu almoço com dinheiro do caixa”.

Outro ponto de atenção, segundo o empreended­or, são as tomadas de decisões dentro de uma corporação. “Sou meio lento para isso. Meu pai sempre teve certezas. Eu, como filho, sempre fui inseguro. Mas uma vez tomada (a decisão), vamos em frente”, afirma.

Passei por uma grande crise. Achava que não tinha o carisma, o conhecimen­to do meu pai. Eu não sabia como me comportar Jayme Garfinkel, Empreended­or

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RAFAEL ARBEX/ESTADÃO Franco. Empresário foi sincero ao analisar a trajetória do negócio criado pelo seu pai

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