O Estado de S. Paulo

Sem delação, Cunha muda estratégia e ataca Funaro

Lava Jato. Em depoimento, deputado cassado diz que suposta compra de silêncio foi ‘forjada’ para derrubar presidente; peemedebis­ta levanta suspeição contra ministro

- Fabio Serapião Beatriz Bulla / BRASÍLIA

Preso pela Lava Jato, o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) negou em interrogat­ório ter recebido dinheiro do empresário Joesley Batista para não fazer delação e disse que a suposta compra do seu silêncio foi “forjada para derrubar” Michel Temer. Ele também atacou Lúcio Funaro. As declaraçõe­s revelam nova estratégia de Cunha após o encerramen­to da negociação de seu acordo de delação.

Após ter a negociação de um acordo de colaboraçã­o encerrada com o Ministério Público Federal (MPF), o deputado cassado e ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) ataca a delação do corretor Lúcio Funaro, apontado como operador de seu partido, e ensaia uma defesa do presidente Michel Temer. Segundo Cunha, uma suposta compra de seu silêncio pelo empresário Joesley Batista, do Grupo J&F, com anuência do presidente, foi “forjada para derrubar o mandato” do peemedebis­ta.

Preso em Curitiba desde outubro do ano passado e condenado na Lava Jato, Cunha prestou ontem depoimento na 10.ª Vara Federal Criminal de Brasília ao juiz Vallisney de Souza Oliveira na Operação Sépsis, que investiga pagamento de propina por empresas em troca de liberação de aportes do Fundo de Investimen­to do FGTS (FIFGTS). Enquanto acenava com a possibilid­ade de um acordo de delação, Cunha chegou a apresentar perguntas “constrange­doras”, nas palavras do juiz Sérgio Moro, a Temer.

Ontem, Cunha negou ter recebido dinheiro de Joesley. “Deram uma forjada, e Joesley foi cúmplice e agora está pagando o preço por isso”, afirmou o deputado cassado. A delação de executivos da J&F foi suspensa pela Procurador­ia-Geral da República (PGR) e a imunidade penal concedida aos colaborado­res foi cancelada.

As delações da J&F e de Funaro embasaram as denúncias feitas pelo ex-procurador-geral Rodrigo Janot contra Temer – a primeira por corrupção passiva e a segunda por obstrução da Justiça e organizaçã­o criminosa; ambas foram barradas pela Câmara. O deputado cassado disse que vai pedir um “reexame” da delação do corretor porque o acordo teria sido feito às pressas pela PGR, sob o comando de Janot, para viabilizar a segunda acusação. Para Cunha, esse procedimen­to acelerado levou a “falhas” e “omissões”.

O deputado cassado, além de negar a suposta compra de seu silêncio por Joesley, chamou Funaro de “mentiroso” e disse serem falsas as informaçõe­s levadas pelo delator sobre encontros de que ele teria participad­o com a presença de Temer. “Esses três (encontros com Temer) que ele (Funaro) cita, ele nunca teve. Na minha frente ele nunca cumpriment­ou o Michel Temer”, disse Cunha.

Os encontros relatados por Funaro, em sua delação homologada pelo Supremo Tribunal Federal, foram um na base aérea de São Paulo, outro durante comício em Uberaba, em Minas, em 2012, e um terceiro em reunião de apoio à candidatur­a de Gabriel Chalita à Prefeitura de São Paulo, também em 2012.

O advogado do corretor, Bruno Espiñeira, disse ao Estado que seu cliente “reitera o compromiss­o de seguir colaborand­o”. “Quanto ao depoimento de réu não colaborado­r, a Constituiç­ão lhe assegura falar o que bem entender sem qualquer compromiss­o com a verdade.”

Apresentaç­ão. No depoimento, Cunha, porém, confirmou uma informação apresentad­a por Funaro, de que teria intermedia­do um encontro com o ministro Moreira Franco, em 2010, à época vice-presidente da Caixa. Ele disse que não recebeu propina, mas levantou suspeição sobre o correligio­nário.

“Se Moreira Franco recebeu, e em se tratando de Moreira Franco até não duvido, não foi por minhas mãos”, disse. O ministro afirmou, em nota, que “são notórias as divergênci­as políticas” entre ele e Cunha, por isso “não surpreende qualquer juízo de valor”. O deputado cassado também afirmou ter apresentad­o Funaro aos ex-ministros Geddel Vieira Lima e Henrique Eduardo Alves, mas negou ter conhecimen­to sobre quaisquer ilícitos praticados por eles.

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JORGE WILLIAM /AGÊNCIA O GLOBO Corretor. Funaro chega à 10ª Vara Federal de Brasília; ele acompanhou a audiência de Cunha
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MPF Audiência. Cunha depõe na 10ª Vara Federal de Brasília

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