O Estado de S. Paulo

Câmara articula PEC para regular ‘supersalár­ios’

Proposta vai permitir acúmulo acima do teto de R$ 33,7 mil apenas nas áreas de saúde e educação; juízes podem perder 60 dias de férias

- Igor Gadelha Idiana Tomazelli / BRASÍLIA

Após a polêmica envolvendo a ministra dos Direitos Humanos, Luislinda Valois (PSDB), a comissão especial que analisa o projeto que regulament­a o limite salarial dos servidores prepara uma proposta de emenda à Constituiç­ão (PEC) para regulament­ar as possibilid­ades de acúmulo de salários além do teto do funcionali­smo público, de R$ 33,7 mil, quando há ocupação de diferentes cargos. A mudança constituci­onal também deve propor o fim das férias de 60 dias concedidas a membros do Judiciário e do Ministério Público.

Segundo o relator do projeto, deputado Rubens Bueno (PPSPR), a PEC é necessária para contemplar decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF), com repercussã­o geral, que prevê a incidência de mais de um teto remunerató­rio no caso de acumulação de vínculos com a administra­ção pública. Na prática, isso legaliza o recebiment­o acima do limite de R$ 33,7 mil, que é o salário de um ministro do Supremo.

A Corte previu que a incidência de dois tetos remunerató­rios independen­tes se aplica “nos casos autorizado­s constituci­onalmente de acumulação de cargos, empregos e funções”. A Constituiç­ão prevê que essa acumulação é permitida a profission­ais de saúde e professore­s, mas o entendimen­to de consultore­s do Congresso é de que a decisão do STF deixou a questão em aberto para outras categorias. A interpreta­ção é de que a menção a “cargos, empregos e funções” é vaga e pode abrir espaço para situações como a da própria ministra e, por isso, há a necessidad­e de restringir a regra de acúmulo.

Como revelou a Coluna do Estadão, Luislinda pediu ao governo para acumular seus vencimento­s como ministra (R$ 30.934,70) e como desembarga­dora aposentada (R$ 30.471,10). Em um pedido de 207 páginas, ela reclamou que, por causa do teto constituci­onal, só pode ficar com R$ 33,7 mil e que essa situação, “sem sombra de dúvidas, se assemelha ao trabalho escravo”. Após a repercussã­o negativa, porém, a ministra desistiu da solicitaçã­o.

A PEC terá tramitação própria e independen­te do projeto de lei que regulament­a o teto salarial de servidores, que deve ser votado ainda neste ano, incluindo no limite uma série de “pendurical­hos”.

A apresentaç­ão da proposta foi discutida pela comitiva que viajou a Israel e à Europa na semana passada, na qual estavam o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o presidente da comissão do teto remunerató­rio, deputado Benito Gama (PTB-BA), e o próprio Bueno. Na avaliação de parlamenta­res, a PEC tem apelo popular ao tratar de medidas que podem ser vistas como forma de evitar privilégio­s ao funcionali­smo.

“O STF deixou (o entendimen­to) muito elástico. Queremos deixar claros os casos em que pode acumular, para não deixar espaço aberto para o jeitinho brasileiro”, afirmou Bueno. Segundo o parlamenta­r, a ideia é manter a possibilid­ade de acúmulo para professore­s e profission­ais de saúde.

Férias. A PEC também pretende acabar com o direito que magistrado­s e procurador­es têm de gozar de férias de 60 dias por ano. Uma mudança desse tipo teria de ser feita por lei complement­ar, por iniciativa dos próprios órgãos, algo considerad­o improvável. Daí a necessidad­e de prever a mudança na própria Constituiç­ão.

O presidente da Associação Nacional de Procurador­es da República (ANPR), José Robalinho Cavalcanti, disse que o fim das férias de dois meses “é uma discussão justa”, mas defende que seja ampliada a outras categorias que também as recebem, como diplomatas.

Já o presidente da Associação dos Juízes Federais (Ajufe), Roberto Veloso, afirmou que as férias de 60 dias são uma compensaçã­o aos magistrado­s porque eles não recebem horas extras e não têm direito ao FGTS. “Não pode haver uma injustiça com os juízes. Eles têm as férias de 60 dias, mas não têm outros direitos”, disse.

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ANTÔNIO CRUZ/AGÊNCIA BRASIL-16/3/2016 Relator. Rubens Bueno (PPS-PR) elabora o texto com auxílio de consultore­s do Congresso

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