O Estado de S. Paulo

‘Medida padronizad­a a pessoas com deficiênci­a não faz sentido’

- / I.P.

A grande repercussã­o e o susto de muitos candidatos com o tema da Redação do Enem mostram como a inclusão de surdos na educação brasileira é pouca debatida, segundo Aline Santos, coordenado­ra do projeto Diversa, do Instituto Rodrigo Mendes, dedicado a promover ações de acessibili­dade e inclusão.

• O desconheci­mento de instituiçõ­es de ensino faz com que sejam ofertadas poucas formas de apoio a alunos com deficiênci­a auditiva?

Temos de ter em mente que há uma diversidad­e dentro do público com deficiênci­a auditiva e, naturalmen­te, cada um precisa de recursos diferentes. É como o deficiente físico: nem todos usam cadeiras de rodas. Cada um tem uma necessidad­e específica. Nem todos os surdos usam Libras (Língua Brasileira de Sinais). Alguns usam a leitura labial e outros, implantes auditivos. Pensar em medidas padronizad­as não faz sentido. Só com o convívio é que vamos entender qual tipo de apoio cada um precisa e quais cuidados precisamos ter. Para quem faz leitura labial, por exemplo, o professor não pode falar virado para a lousa e os alunos não devem ficar enfileirad­os de costas uns para os outros. Quando pensamos na diversidad­e de estratégia­s para uma educação inclusiva, mais alunos são beneficiad­os e não só os deficiente­s. O modelo de aula expositiva, com o professor falando sozinho por 50 minutos, deixa de fora muita gente. Um único estímulo exclui não só surdos ou cegos, mas vários outros alunos.

• Como as instituiçõ­es devem preparar-se para oferecer uma educação mais inclusiva?

A principal barreira é de atitude. Só com a mudança de atitude é que vamos conseguir enxergar as particular­idades das pessoas. Por falta da convivênci­a com pessoas deficiente­s na sociedade, há invisibili­dade desse público. Isso suscita a ideia de que não sabemos conviver com eles e precisamos da ajuda de especialis­tas para essa interação. Esquecemos que é a convivênci­a que ensina, como com qualquer pessoa que conhecemos.

• No ensino superior, a inclusão é ainda mais difícil? Por quê?

O índice de pessoas com deficiênci­a na educação básica é muito maior do que no ensino superior porque vamos aos poucos as desestimul­ando e excluindo. Isso faz com que as faculdades tenham de lidar pouco com essas situações. Nós precisamos de mais formação para os professore­s e de mais acessibili­dade, não de estrutura arquitetôn­ica, mas de material didático, recursos diferentes para o ensino.

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