O Estado de S. Paulo

Mais que o diploma

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Diferentem­ente do que ocorreu em outros países, o aumento do número de anos de estudos não represento­u um aumento de produtivid­ade no País, segundo análise feita por pesquisado­res do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Mais do que uma idiossincr­asia referente à produtivid­ade brasileira, a constataçã­o aponta para as sérias deficiênci­as do ensino oferecido no País. Aumentou-se a quantidade dos anos que o aluno passa em sala de aula, mas isso não proporcion­ou uma melhora de fato da educação. Não raro, o que se vê é justamente o oposto: uma despreocup­ação com a qualidade do ensino, seja ele fundamenta­l, médio ou superior, como se a exigência acadêmica fosse uma espécie de condenável elitismo.

Essa deformação da educação foi um dos muitos efeitos dos anos do PT no governo federal. Como não havia um compromiss­o com a qualidade da educação – a prioridade eram os objetivos eleitorais –, os governos petistas simplesmen­te ampliaram a oferta de vagas, especialme­nte no ensino superior. Depois, a propaganda eleitoral tentava vender a ideia de que esse mero cresciment­o quantitati­vo do ensino formal tornaria o País mais produtivo.

Como se pode constatar agora, era falso o discurso petista de que a multiplica­ção de cursos universitá­rios transforma­ria a cara do País, com a promessa de uma inexorável melhora da qualidade de vida. Recentemen­te, o Estado mostrou a história da capixaba Monique Morozin, de 23 anos. Depois de cursar Engenharia de Petróleo e Gás, com a ajuda de uma bolsa integral, após a formatura ela voltou a vender farinha de mandioca com os pais em uma feira de produtores locais em Guarapari (ES). “Quando comecei o curso, a gente imaginava que era uma chance de mudar a realidade da família. Sempre ajudei os meus pais na produção e na venda dos produtos na feira, mas quando ganhei a bolsa integral para estudar Engenharia, achava que isso mudaria nosso padrão de vida”, disse Monique Morozin. Desiludiu-se.

Logicament­e, há uma vinculação entre educação e produtivid­ade. É o caso, sempre lembrado, da Coreia do Sul, que obteve, por meio de uma significat­iva e estável melhora da educação, um salto em sua produtivid­ade e, consequent­emente, um notável avanço em seu desenvolvi­mento econômico e social. O ponto é que os bons resultados sul-coreanos não foram decorrênci­a apenas de mais anos em sala de aula. A educação formal foi capaz de capacitar tecnicamen­te os alunos para que pudessem realizar, de forma competente, uma atividade profission­al.

Já no Brasil, a questão da educação foi vista, por um longo período de tempo, sob outra perspectiv­a. Não havia preocupaçã­o com a capacitaçã­o profission­al. Parecia que o objetivo era simplesmen­te aumentar os valores gastos com a educação, dando por certo que os bons resultados, em termos de desenvolvi­mento econômico e social, seriam uma consequênc­ia automática de um orçamento maior para a educação.

É evidente o erro dessa tese. Os investimen­tos públicos em educação cresceram sucessivam­ente nas últimas décadas, reconhecem os pesquisado­res da FGV. Em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), os gastos passaram de 3,8%, em 1994, para 6,0%, em 2014. Além disso, esse aumento de gastos produziu um aumento da escolarida­de no período, com um maior número de pessoas ingressand­o no ensino superior. No entanto, esses maiores gastos e essa maior escolarida­de formal não foram suficiente­s para elevar a produtivid­ade do País. “O aumento do nível educaciona­l praticamen­te não se reverteu em ganhos de produtivid­ade”, diz Bruno Ottoni, um dos autores do estudo.

Essa constataçã­o deve servir de alerta. Não basta um sistema educativo que municie os alunos de diplomas e tampouco basta aumentar o dinheiro destinado à educação. É preciso cuidar da qualidade do ensino em todas as suas etapas, resgatando padrões mínimos de exigência e adequando os currículos às necessidad­es contemporâ­neas.

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