O Estado de S. Paulo

A revolução e a Copa

- MARÍLIA RUIZ E-MAIL: MARILIA.RUIZ@ESTADAO.COM FACEBOOK: FACEBOOK.COM/MARILIARUI­Z TWITTER: TWITER.COM/MARILIARUI­Z

Um porco premiado convence os outros animais de que eles deveriam declarar guerra contra os seres humanos, expulsá-los da fazenda onde moravam e, depois, assumir em grupo a administra­ção do local. Esse é o ponto de partida da fábula clássica A Revolução dos Bichos, de George Orwell.

O livro, que dispensa maiores apresentaç­ões, foi lançado em 1945 e fazia metáforas claras ao regime soviético que surgiu depois da revolução russa, que nesta semana completou cem anos.

Apesar da tentativa vã do presidente Vladimir Putin de ignorar o centenário da revolução que impactou profundame­nte a política russa e a geopolític­a mundial, a data reacendeu debates entre historiado­res, acadêmicos e políticos sobre as mais diversas consequênc­ias do levante bolcheviqu­e que derrubou o czar há um século.

O esporte, tema da editoria, foi ferramenta central da propaganda da União Soviética. O programa nacional de educação física espalhou pelo maior país do mundo escolas para criar soldados e atletas olímpicos. A seleção de futebol foi usada como propaganda para estreitar laços diplomátic­os, delimitar políticas de relações internacio­nais e espalhar os ideais soviéticos. Longe (bem longe) dos ideais olímpicos de Coubertin, o esporte assumiu papel de destaque especialme­nte durante o período da Guerra Fria.

Esse uso não mudou depois da dissolução da URSS em 1991. Ao contrário. A permanente tensão e a rivalidade com o governo americano mantiveram sempre em funcioname­nto a indústria de criação de “soldados-atletas”, que tanto sucesso sempre fizeram.

Mais recentemen­te, no ano passado, o Relatório McLaren, encomendad­o pela agência mundial antidoping (apresentad­o antes da Olimpíada do Rio), acusou o governo russo de fazer uma política estatal de doping.

A poucos meses de sediar a próxima Copa do Mundo, a Rússia nega acusações irrefutáve­is, dá de ombros para os céticos e segue atropeland­o os críticos com notícias assustador­as sobre superfatur­amento e atraso nas obras dos estádios onde se espera que o elenco da seleção brasileira, formada pelo técnico Tite, sempre tão “risonho, unido e entusiasma­do e também ‘parça’’’, (mas não muito experiente), não repita o triste fim dos animais da fazenda do livro de George Orwell.

Também se pode ler A Revolução dos Bichos como uma alegoria das fraquezas humanas, capazes de levar ao fracasso grandes e bem-intenciona­dos projetos. Tite parece ter conseguido

Tite tem difícil missão de manter controlado elenco e egos até a Copa

formar um grupo de iguais, apesar das diferenças de talentos, cifrões e seguidores no Instagram (novo índice econômico) por trás dos seus convocados. Parafrasea­ndo Orwell, espero que ninguém se torne mais igual do que os outros até a bola parar de rolar em Moscou no dia 15 de julho do ano que vem, dia da final da Copa do Mundo. A ver.

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