O Estado de S. Paulo

Conselho flexibiliz­a as normas para barriga de aluguel

Saúde. Resolução de órgão de Medicina ainda prevê que solteiros passem a ter direito a recorrer à cessão temporária de útero e pessoas sem problemas reprodutiv­os possam congelar gametas. Redução do prazo de descarte de embriões pode baratear técnica

- Lígia Formenti / BRASÍLIA

Sobrinhas e filhas de mulheres impossibil­itadas de levar uma gravidez adiante poderão atuar como barriga de aluguel, segundo o Conselho Federal de Medicina. A regra hoje vale para mãe, avós, tias e primas da paciente. Solteiros também poderão recorrer ao método e será permitido que pessoas sem problemas reprodutiv­os congelem gametas e embriões.

O Conselho Federal de Medicina (CFM) ampliou a possibilid­ade de cessão temporária de útero, a barriga de aluguel. A partir de agora, mulheres que não puderem levar a gravidez adiante poderão recorrer a sobrinhas ou a filhas para a gestação por substituiç­ão. A regra atual permitia a cessão temporária de útero apenas de mãe, avó, irmã, tia e prima da paciente.

A inclusão de parentes consanguín­eos descendent­es faz parte da resolução atualizada que deverá ser publicada hoje no Diário Oficial. A nova regra torna mais clara e amplia as possibilid­ades para o emprego dessa técnica. Pessoas solteiras também passam a ter direito a recorrer à cessão temporária de útero – algo que não era previsto em resoluções anteriores. Além disso, a nova regra formaliza algo já adotado na prática dos consultóri­os: a possibilid­ade de pessoas sem problemas reprodutiv­os recorrerem ao congelamen­to de gametas, embriões e tecidos germinativ­os.

“Hoje, mais de 30% das mulheres começam a planejar a gravidez depois dos 30 anos, quando a chance de engravidar começa a se reduzir”, afirma o coordenado­r da Comissão para revisão da resolução de Reprodução Assistida, José Hiran da Silva Gallo. A estratégia do congelamen­to também é adotada por pacientes que vão passar por tratamento­s com risco de infertilid­ade, como quimiotera­pia.

O texto reduz ainda de cinco para três anos o tempo necessário para que embriões não utilizados sejam descartado­s pelas clínicas. O prazo vale tanto para os casos da vontade expressa dos pacientes quanto para o abandono. “Há um custo envolvido nessa manutenção. Além disso, muitos casais, depois de ter um filho, acabavam abandonand­o embriões ou gametas”, afirma Gallo.

O médico especialis­ta Giuliano Bedoschi elogia a mudança. “A manutenção por cinco anos exige investimen­to significat­ivo dos pacientes, que têm de pagar anuidade para a conservaçã­o”, observa. De acordo com ele, na hora de se planejar para fazer o tratamento de reprodução assistida, pacientes acabam levando em consideraç­ão também esse gasto. “Com a redução, mais pessoas poderão recorrer à técnica”, disse.

Estudos mostram que espermatoz­oides congelados podem ser usados na reprodução até 30 anos depois de serem coletados. No caso de óvulos, o uso pode ocorrer até 14 anos depois da coleta. Ano passado, foram descartado­s pelos centros nacionais 55.381 embriões.

Revisões. A resolução do CFM sobre reprodução assistida é revista periodicam­ente (mais informaçõe­s ao lado). Estão cadastrado­s na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) 141 serviços especializ­ados em reprodução assistida. São Paulo, Minas, Paraná, Rio e Rio Grande do Sul são os Estados mais atuantes, com mais casos de transferên­cia de embriões.

Gallo acredita que a nova versão também torna mais clara a regra para gestação compartilh­ada, usada geralmente nos casos de casais homossexua­is femininos. O embrião obtido com a fecundação do óvulo de uma mulher é transferid­o para o útero de sua parceira.

Bedoschi considera um avanço também a mudança nas regras para doação de óvulos. O texto agora está mais flexível.

Estabelece que a doadora tem de apresentar uma semelhança com a receptora, mas é algo mais genérico. A resolução anterior mencionava “compatibil­idade máxima”.

“Profission­ais procuravam doadoras que tivessem até o tipo sanguíneo da receptora. O formato atual é mais amplo, refletindo justamente o anseio

das pacientes nos consultóri­os. Muitas mulheres não fazem questão de o bebê ser semelhante”, diz Bedoschi.

Estão mantidos os prazos para a idade máxima de doador na reprodução assistida: 35 anos para mulheres e 50 anos para homens. O limite para mulheres receberem embriões é de 50 anos, mas o texto também deixa

mais clara a possibilid­ade de exceções, como no caso de a mulher reunir todas as condições de levar a gravidez adiante.

Integrante da Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida e membro do comitê revisor da resolução, o médico Adelino Amaral afirmou que outras exceções também podem ocorrer, como na barriga de aluguel.

“Há casos em que mulheres não têm familiares dispostos ou em condições de ceder temporaria­mente o útero. Nesses casos, para ter a barriga de aluguel é preciso de autorizaçã­o no Conselho Regional de Medicina”, diz Amaral. “Para os casos previstos na resolução, a autorizaçã­o é automática. A clínica não precisa fazer consulta.”

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