O Estado de S. Paulo

Torquato Jardim

Troca na Polícia Federal enfraquece ministro da Justiça.

- Vera Rosa / BRASÍLIA

A escolha do delegado Fernando Segóvia para comandar a Polícia Federal enfraquece­u o ministro da Justiça, Torquato Jardim. Nos bastidores, o PMDB fez pressão para que o sucessor de Leandro Daiello na PF fosse alguém ligado ao partido após a Operação Lava Jato atingir o núcleo político do governo Michel Temer. A cobrança aumentou depois que um relatório da Polícia Federal apontou o presidente como chefe do “quadrilhão” do PMDB.

Em setembro, Torquato convenceu Daiello – que já havia pedido para sair e desejava se aposentar – a permanecer no cargo. À época, o nome de Segóvia já era dado como o mais cotado. Ex-superinten­dente no Maranhão, ele tinha o apoio do ex-senador José Sarney (PMDB-AP).

O delegado contava também com o aval do ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, investigad­o na Lava Jato e denunciado pela Procurador­ia-Geral da República por obstrução da Justiça e organizaçã­o criminosa. A denúncia, que inclui Temer e o ministro Moreira Franco (Secretaria-Geral), foi barrada na Câmara. Segóvia foi apresentad­o a Padilha pelo ministro Augusto Nardes, do Tribunal de Contas da União (TCU).

As negociaçõe­s para a troca da direção na PF estavam sendo feitas entre Daiello e Torquato desde que ele assumiu a Justiça, no fim de maio. O então diretor-geral da PF havia sugerido a escolha de um delegado com experiênci­a e bom trânsito na corporação. Em conversas reservadas, Segóvia sempre foi visto como “homem do PMDB”.

Troca na Justiça. Torquato queria emplacar o número 2 da Polícia Federal, Rogério Galloro, no comando da instituiçã­o, mas não conseguiu. Ontem, um dia após a troca do diretor-geral, Galloro foi nomeado secretário nacional de Justiça, no lugar de Astério Pereira dos Santos.

Segundo o ministro da Justiça, Santos pediu demissão, mas isso nada tem a ver com a entrada de Segóvia. “Foi uma questão de foro íntimo”, afirmou Torquato ao Estado.

No Palácio do Planalto, o comentário era de que a nomeação de Galloro para a Secretaria Nacional de Justiça foi uma “compensaçã­o” para Torquato e uma ala da PF que queria ver o delegado como diretor-geral.

Galloro também vai acumular o cargo no ministério com o Comitê Executivo da Interpol.

Pressão. Em recente jantar com peemedebis­tas dissidente­s, um deputado com trânsito no Planalto relatou aos presentes que Sarney estava fazendo “muita pressão” pela rápida nomeação de Segóvia.

Quando Torquato deu entrevista, na semana passada, dizendo que “comandante­s da Polícia Militar são sócios do crime organizado no Rio”, Temer o chamou e pediu que ficasse em silêncio. Padilha acompanhou de perto esse movimento e, a portas fechadas, não escondeu a contraried­ade com os petardos lançados pelo titular da Justiça.

As declaraçõe­s de Torquato serviram como combustíve­l para o PMDB voltar à carga pela saída do diretor-geral da PF. A manifestaç­ão do ministro foi interpreta­da no partido e no núcleo do governo como “vazamento” de investigaç­ões conduzidas pela PF, então sob o controle de Daiello.

O fato, somado ao relatório da PF sobre o chefe do “quadrilhão” do PMDB e à ação que resultou na descoberta do “bunker” do ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB), em Salvador, com R$ 51 milhões, selou o destino de Daiello. Além disso, esvaziou o poder de Torquato. Amigo de Temer, o ministro foi escolhido na “cota pessoal”, sem ter vínculo partidário.

Segurança pública. Em mais de uma ocasião, Torquato contou que, ao convidá-lo para o cargo, o presidente lhe deu como prioridade a tarefa de cuidar da segurança pública. No Congresso, parlamenta­res do PMDB argumentam que ele perdeu a autonomia e hoje passa a imagem de “rainha da Inglaterra”, que reina, mas não governa. Não seria nem mesmo um conselheir­o de Temer.

Ao Estado, Torquato disse ter ficado “surpreso” com a interpreta­ção de que havia sido atropelado pelo Planalto na nomeação de Segóvia. Em nota, divulgada anteontem logo após a colunista Eliane Cantanhêde antecipar no estadao.com.br a troca do comando na PF, o ministro afirmava que “o senhor presidente da República escolheu nomear o delegado Fernando Segóvia como novo diretorger­al”. Em seguida, expressava “agradecime­nto pessoal e institucio­nal” a Daiello.

“Ali eu disse o óbvio. Quem nomeia é o presidente da República. A decisão final é sempre dele”, comentou Torquato. / COLABOROU TÂNIA MONTEIRO

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TÂNIA RÊGO/AGÊNCIA BRASIL-30/8/2017 Mudança. Ministro da Justiça, Torquato Jardim, durante evento no Rio em agosto; segundo ele, decisão final é do presidente

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