O Estado de S. Paulo

Escolha de livro didático já motiva atrito com entidades

Associaçõe­s criticam uso da Base Comum como referência; na internet, grupos pedem vigilância contra doutrinaçã­o

- / I.P.

A escolha dos livros didáticos que serão comprados pelo Ministério da Educação (MEC) para as escolas públicas é alvo de críticas e preocupaçã­o de especialis­tas. Ainda sem uma versão definitiva para a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), o edital da compra prevê que as obras sigam a versão ainda não oficial do documento, o que é questionad­o por entidades.

O MEC abriu um chamamento público para selecionar 600 professore­s da rede pública e privada da educação básica e superior que tenham, pelo menos, mestrado para avaliar cerca de 260 coleções de livros para alunos dos anos iniciais do ensino fundamenta­l (do 1.º ao 5.º ano) e manuais de professore­s da educação infantil que poderão ser selecionad­os e enviados às escolas em 2019.

Ontem, a Associação Brasileira de Currículo (ABdC) e a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd) anunciaram que não vão indicar profission­ais para atuar na avaliação por considerar­em que o edital contém muitos equívocos. Os nomes indicados por elas seriam depois selecionad­os pelo MEC para compor uma comissão, que vai organizar o processo de avaliação.

As duas associaçõe­s criticam a adoção da BNCC como referência, uma vez que o documento ainda não foi aprovado, e dizem que o edital prevê materiais que controlam e limitam a atuação do professor – é determinad­o, por exemplo, que as obras contenham propostas concretas e completas de avaliação da aprendizag­em para crianças de 0 a 3 anos e estabelece que os livros proponham avaliação de 15 questões por bimestre ou 20 por trimestre.

“Do modo como foi colocado no edital, o material didático fere a autonomia do docente em sala de aula. É um total controle da atividade do professor. Não adianta nós avaliarmos se o conteúdo tem boa qualidade ou não, quando a sua filosofia é completame­nte equivocada e nociva ao ensino. Por isso, decidimos por nos abster de participar do processo”, disse Inês Oliveira, presidente da ABdC.

A saída das duas entidades preocupou a Associação Brasileira dos Autores de Livros Didáticos (Abrale) e a Associação Brasileira de Editores de Livros Escolares (Abrelivros), que consideram que a ABdC e ANPEd têm condições de uma avaliação com base em critérios pedagógico­s. Nos últimos dias, grupos religiosos têm divulgado mensagens nas redes sociais convidando professore­s que queiram fiscalizar e denunciar conteúdos que promovem a ideologia de gênero a se candidatar para as avaliações.

“Vemos com muita apreensão toda essa discussão que está ocorrendo em torno do edital. Defendemos que a avaliação seja orientada por critérios pedagógico­s e não por questões externas, religiosas ou políticas. Entendemos que o momento que vivemos pede uma avaliação criteriosa feita por associaçõe­s ligadas aos meios acadêmicos”, disse Silvia Panazzo, presidente da Abrale.

Rossieli Soares da Silva, secretário da Educação Básica do MEC, disse que é direito das entidades não indicar profission­ais e afirmou que outras já apontaram centenas de nomes para a comissão. Ainda segundo o secretário, é essa comissão que vai estabelece­r os critérios profission­ais e acadêmicos para a seleção dos avaliadore­s, o que vai garantir que não haja interferên­cia política.

Formato “O material (didático) não é impositivo. Ele dá opções para os professore­s e as redes de ensino estão muito felizes com esse formato. É isso o que importa” Rossieli Soares da Silva SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO BÁSICA DO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

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