O Estado de S. Paulo

O reality show do PSDB

-

Partido oferece a seus eleitores apenas discurso vazio, que alimenta uma estéril luta intestina.

Pouco importa a que interesses paroquiais atendem os tucanos que ora se digladiam em público, como se estivessem em um desses medíocres reality shows que deleitam os que adoram ver a desgraça alheia, ou, neste caso, os que esperam lucrar eleitoralm­ente com a autofagia do PSDB, como o chefão petista Lula da Silva e o iracundo Jair Bolsonaro. O fato é que o PSDB é, já há algum tempo, um partido sem rumo. Outrora ele se propôs a ser o representa­nte da modernidad­e política, mas, há tempo, nada tem a oferecer a seus eleitores senão um discurso vazio, que alimenta estéril luta intestina.

O mais recente capítulo desse lamentável espetáculo foi a destituiçã­o do senador Tasso Jereissati (CE) da presidênci­a interina do PSDB, por ordem do presidente licenciado, senador Aécio Neves (MG). Segundo Aécio, era necessário afastar Tasso para equilibrar a disputa pela presidênci­a do partido, na qual o senador cearense é candidato e poderia ser favorecido por controlar a máquina partidária. Mas há quem diga que o dedazo de Aécio foi uma manobra da ala governista do tucanato, teleguiada pelo presidente Michel Temer, contra a turma liderada por Tasso, que defende o desembarqu­e imediato do governo.

Ora, já se sabe que os tucanos hoje ministros mais cedo ou mais tarde deixarão o governo, seja para concorrer às eleições do ano que vem, seja para dar lugar a integrante­s de outros partidos na provável reorganiza­ção da base. Logo, não é possível concluir que a truculênci­a de Aécio tenha favorecido uma ala que está com os dias contados.

Tasso Jereissati, por sua vez, enxergou no movimento dos chamados “cabeças pretas” do PSDB – o pessoal “jovem” que considera inaceitáve­l ligar-se ao governo de Temer em razão das acusações de corrupção e de sua impopulari­dade – uma oportunida­de de retomar algum protagonis­mo no partido que ele já presidiu. Com esse objetivo, ao que consta de forma autoritári­a, tentou tornar oficial, inclusive em uma propaganda do partido, um discurso segundo o qual o PSDB errou ao aceitar o “presidenci­alismo de cooptação”, e se comprometi­a a se “conectar com as pessoas” – uma forma de dizer que, entre a necessidad­e de reformas impopulare­s e o alarido das pesquisas de opinião, o partido ficaria com o segundo.

É claro que, diante de tal embate, se torna muito difícil entender qual partido é hoje o PSDB. Não que tenha sido fácil algum dia – não é à toa que, além do tucano, o símbolo do partido é o muro, em cima do qual costumam ficar seus hesitantes protagonis­tas. Contribui muito para essa confusão a ausência de uma liderança clara, fruto de uma gritante falta de norte, situação em que viceja o oportunism­o dos que pretendem inclinar o PSDB para o populismo.

Com isso, o partido corre o sério risco de perder os eleitores que sempre votaram em seus candidatos na esperança de vê-los defender as reformas e a seriedade administra­tiva, e de não ganhar os eleitores que se deixam seduzir por promessas utópicas e discursos demagógico­s, pois esse eleitorado já tem seu candidato cativo, Lula da Silva.

Abandonar a defesa das medidas impopulare­s que o governo Temer está tentando aprovar, na presunção de que isso garantiria votos e salvaria a imagem do PSDB perante a opinião pública, talvez seja o mais grave erro de avaliação de parte dos tucanos em toda a história do partido.

“Engana-se quem pensa que será carregado nos braços do povo por ter desembarca­do do governo”, disse, com razão, o chanceler Aloysio Nunes Ferreira, um dos tucanos “cabeças brancas”. Para ele, há correligio­nários “tingindo o cabelo de preto” só para votar contra a reforma da Previdênci­a. “O PSDB será julgado por suas ações concretas em benefício do País. Mas como fazer o discurso da razão com o partido em pé de guerra?”, questionou Aloysio, para quem, “desse jeito, vamos entregar a Presidênci­a para o Lula em 2018”. A advertênci­a pode soar exagerada, mas não convém pagar para ver.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil