O Estado de S. Paulo

Mistérios do samba

Zuza Homem de Mello fala das curiosidad­es do gênero representa­do por Moyseis Marques

- Julio Maria Rua Fidalga, 360, Vila Madalena, tel. 3813-7404. Sábado (11), às 21h30. R$ 55.

Moyseis Marques é um nome que já transbordo­u às rodas de samba de Lapa carioca. Mineiro de Juiz de Fora, radicado no Rio, ele já lançou quatro álbuns (o último é de 2012, Pra Desengomar) e tem uma interpreta­ção magistral de Nomes de Favela, de Paulo Cesar Pinheiro. Algo sem muita explicação, no entanto, impede seu reconhecim­ento em São Paulo.

O samba carioca defendido por Moyseis Marques e suas particular­idades serão tema da terceira edição do projeto Zuzando nas Notas, que o pesquisado­r Zuza Homem de Mello apresenta neste sábado, 11, na casa de shows Tupi or not Tupi. A série, que teve casa lotada nas primeiras noites, já discutiu as origens e particular­idades do jazz manouche e a ausência de cantores do sexo masculino na música brasileira. Zuza abre a noite contextual­izando historicam­ente os temas e abordando alguns aspectos técnicos para, logo em seguida, chamar as atrações.

O jazz manouche, pouco mencionado por aqui, é a única expressão jazzística a nascer fora dos Estados Unidos, como diz o pesquisado­r. Também lembrado como jazz cigano ou gypsy swing tem como mentor o violinista e guitarrist­a belga de origem cigana, Django Reinhardt. O grupo da edição foi o Seo Manouche. Na noite dos cantores, Zuza recebeu Zé Renato e Renato Braz para comentar sobre os mistérios que podem haver por trás da ausência de intérprete­s homens na música brasileira. “Isso vem do Festival da Canção de 1967, quando os compositor­es resolveram cantar suas canções. Como efeito disso, os cantores (que não compunham) foram destronado­s.”

O samba de Moyseis chegou ao conhecimen­to de Zuza por meio de uma concorrênc­ia de um edital da Natura, que acabou não contemplan­do o sambista apesar da defesa insistente do pesquisado­r, que era jurado à época. “Minha percepção é de que ele é quase um ilustre desconheci­do por aqui. Decidi trazêlo para expô-lo”, diz Zuza.

O samba que floresce no Rio, segundo o pesquisado­r, guarda diferenças nem sempre tão nítidas entre seus primos de São Paulo e da Bahia. “O de São Paulo é mais duro, mais marchado, mais seco. O da Bahia, basta ouvir Batatinha, é mais dengoso.” Zuza interpreta que o samba baiano consegue ser mais envolvente do que o carioca. “Isso por um detalhe quase imperceptí­vel. As frases musicais são emendadas, não tem pausa.”

Há uma explicação do pesquisado­r também para um dos maiores mistérios do samba. Afinal, o que o faz ser, há cem anos, a música nacional em um território tão extenso e de culturas tão variadas. O que faz com que, neste momento, pelo menos alguma roda aconteça em qualquer cidade do País?

Se as origens forem comparadas, o samba teria tudo para ter ao menos dois sérios concorrent­es. O frevo tem a mesma idade, 100 anos, e nasceu no mesmo cenário urbano, na capital pernambuca­na, Recife. O baião de Luiz Gonzaga, um pouco mais novo, populariza­do em meados dos anos 1940, segue história parecida, se estabelece­ndo a partir das emissoras de rádio do Nordeste. Ao final, suas relevância­s não foram páreo para a supremacia do samba, que transborda aos limites territoria­is de suas três principais nascentes e invade uma nação inteira. “O elemento do negro é a explicação”, diz Zuza. O frevo é mais branco, há pouca influência negra na região, e ele vai se tratar de uma música com espaço e época. Vai pertencer ao carnaval.” O sentimento de irmandade, de família, é outra particular­idade que se mantém nas rodas de samba, algo nem sempre visto em outros gêneros. E a complexida­de rítmica que só brasileiro­s conseguem reproduzir intuitivam­ente permanece outro mistério. Mesmo sendo de matriz africana, nem africanos conseguem tocar samba com a mesma divisão.

Zuza Homem de Mello está pronto para relevar histórias e bastidores de um outro samba, o samba-canção. Seu livro, Copacabana, será lançado no dia 6 de dezembro.

ZUZANDO NAS NOTAS Tupi or not Tupi.

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ELENA MOCCAGATTA Lapa ficou pequena. Moyseis foi descoberto por Zuza em uma seleção da Natura

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