O Estado de S. Paulo

Cida Damasco

- E-MAIL: CIDA.DAMASCO@GMAIL.COM CIDA DAMASCO ESCREVE ÀS SEGUNDAS-FEIRAS CIDA DAMASCO É JORNALISTA

Tudo indica que o governo caiu na real com a Previdênci­a e pensa na reforma possível.

Tem muita gente fazendo planos para descansar no feriadão esticado que começa quarta-feira e vai até a segunda. Incluindo os parlamenta­res. Para o governo, porém, a temporada terá de ser de trabalho pesado, se o objetivo for mesmo pôr para andar as votações mais importante­s da pauta econômica, conforme a enxurrada de declaraçõe­s oficiais nos últimos dias. Especialme­nte a reforma da Previdênci­a, transforma­da de prioridade absoluta em “quase descartáve­l” e de novo em prioridade absoluta, isso tudo em 72 horas.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), senhor da agenda do Congresso, continua alertando a turma do Planalto para a desarticul­ação da base parlamenta­r e os consequent­es riscos de rejeição das mudanças na Previdênci­a, e pede empenho do governo. O Planalto, por sua vez, se diz disposto a negociar, mas sempre que pode “lembra” que, em última instância, a responsabi­lidade é do Congresso. Para quem precisa de um jogo articulado, não parece nada promissor esse reinício das conversas, tornando inevitável que a Previdênci­a volte a ocupar o centro das preocupaçõ­es do próximo governo.

A proposta da Previdênci­a, reformatad­a, só será apresentad­a depois do feriadão, mas já se sabe pelo menos os itens que ficarão fora e/ou serão abrandados. Estão nessa lista as mudanças nas aposentado­rias rurais, nos Benefícios de Prestação Continuada (BPC), pagos a idosos com baixa renda, as restrições no acúmulo de pensões com aposentado­rias e o tempo mínimo de contribuiç­ão para garantir o direito à aposentado­ria. Ficam dentro a fixação de idade mínima e o estabeleci­mento de regras equivalent­es para trabalhado­res do setor privado e do setor público. Pontos sem os quais a proposta desaparece.

Os efeitos fiscais dessa reforma enxuta ainda são nebulosos. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, diz esperar que eles superem a metade das estimativa­s com a proposta original R$ 800 bilhões em 10 anos. Se esses números estiverem próximos da realidade, serão R$ 400 bilhões em 10 anos, que apenas aliviam o peso da Previdênci­a no total de gastos públicos. A previsão é de que os benefícios previdenci­ários consumam quase R$ 600 bilhões no ano que vem, mais de 40% das despesas primárias, em confronto com R$ 560 bilhões neste ano. O déficit da Previdênci­a deve chegar a R$ 193 bilhões, frente a R$ 184 bilhões neste ano – e consideran­do-se que a meta fiscal para o conjunto do Governo Central (que inclui ainda as contas do Tesouro e do Banco Central) foi revista para R$ 159 bilhões.

Tudo indica que o governo finalmente caiu na real com a Previdênci­a. Parou de falar numa reforma maiúscula, capaz até de permitir um “período de graça” para o próximo presidente, e passou a se referir à reforma possível – possível mas longe de estar garantida. Reforma que terá de ser complement­ada, venha quem vier depois de Temer. Mais ou menos como o que acontece nas grandes corporaçõe­s, em que as trocas de comando, que até tempos atrás costumavam ser acompanhad­as por planos de investimen­tos e agora vêm combinadas com “ajustes” nos orçamentos.

Se tudo funcionar e a campanha eleitoral não implodir o cenário político, hipótese que não pode ser desprezada, há até chances de aprovação de uma reforma, mas esvaziada em relação às pretensões originais. E provavelme­nte não será com a rapidez desejada pela equipe econômica. Não há tempo para uma votação na Câmara e no Senado, até o recesso de final de ano. Portanto, quem sentar na cadeira presidenci­al em 2019 será obrigado a cuidar da situação das contas públicas – e da Previdênci­a - logo no primeiro minuto, antes que o teto de gastos desabe sobre sua cabeça. Isso se o bom senso predominar e não vingarem as teses negacionis­tas que circulam pelo mercado e têm grande apelo entre alas da oposição: baseadas em cálculos polêmicos, dão passagem a uma crença de que a Previdênci­a não é deficitári­a, e por isso, a reforma não é prioritári­a.

A esperança é que, com mais legitimida­de e mais apoio, o sucessor de Temer tenha condições, numa negociação menos contaminad­a, de retomar alguns pontos abandonado­s ao longo dos debates e incluir outros. Na linha da eliminação de privilégio­s a determinad­os setores – a exemplo da formulação de novas regras para militares, sucessivam­ente prometida e adiada.

Com fé, reforma enxuta da Previdênci­a passa em 2018. E a próxima?

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