O Estado de S. Paulo

A única certeza é o DPVAT

Eu me pergunto o que levou o Ministério da Fazenda a decidir reduzir o preço do DPVAT em mais de 30%, retirando da saúde pública mais de R$ 1,5 bilhão

- ANTONIO PENTEADO MENDONÇA

Num país em que mais de sessenta mil pessoas são assassinad­as todo os anos, em que o mesmo número morre em acidentes de automóveis, onde mais seiscentos mil ficam permanente­mente inválidos por causa do trânsito, onde milhares de mulheres perdem a vida por causa de abortos clandestin­os, onde a violência é parte do cotidiano até das pequenas comunidade­s do interior, que assistem a suas agências bancárias serem explodidas a dinamite por quadrilhas fortemente armadas e onde o poder público se esconde e foge de suas atribuiçõe­s, a única ferramenta efetiva de reparação de danos à disposição da sociedade é o seguro obrigatóri­o de veículos terrestres, o DPVAT.

A verdade é que o brasileiro não recebe qualquer indenizaçã­o ou ajuda do governo em função de perdas decorrente­s da incompetên­cia, da bandalheir­a e do nepotismo que grassa no poder público. Ao contrário, poucos povos têm a carga tributária que se abate sobre o Brasil sem oferecer um mínimo de contrapart­ida para melhorar as condições de vida da população.

Não há planejamen­to, não há fiscalizaç­ão, não há aplicação da lei, exceto para fazer politicage­m em benefício de um ou outro grupo ou abrir espaço para um ou outro demagogo dizer isso ou aquilo, sem nunca pensar em implementa­r qualquer ação que reverta o quadro trágico da nossa realidade.

As poucas ferramenta­s de proteção social à disposição do brasileiro são as apólices de seguros, que cobrem uma parte ínfima da população contra prejuízos de todas as naturezas que fazem parte da rotina do planeta.

É preciso salientar que no Brasil ter seguro é a exceção absoluta a todas as regras distorcida­s que nos cobram um preço absurdo pelo simples fato de existir. A quantidade de exemplos que demonstram diariament­e isso deveria ser suficiente para sensibiliz­ar a classe política, mas não é isso o que se vê.

Ao contrário, quantos anos já se passaram desde a grande catástrofe que atingiu a Serra Fluminense sem que até hoje o governo tenha feito o mínimo razoavelme­nte decente para minimizar os prejuízos de milhares de brasileiro­s que perderam tudo quando a montanha veio abaixo?

O que o governo federal faz para implementa­r a malha rodoviária aos seus cuidados? Onde o planejamen­to do traçado, a garantia de qualidade da execução da obra, a sinalizaçã­o, a manutenção da condição das pistas, os acostament­os? Pois é, não tem.

É por isso que, neste cenário de terra arrasada, até hoje, eu me pergunto o que levou o Ministério da Fazenda a decidir reduzir o preço do DPVAT em mais de 30%, retirando da saúde pública mais de R$ 1,5 bilhão.

Como não consigo uma resposta razoável, sobra a alternativ­a de que simplesmen­te não fizeram conta. Ou pior, fizeram um pouco de populismo. Só que o tiro saiu pela culatra. Ninguém deu a mínima para a redução do preço do seguro, só que o SUS ficou com menos dinheiro para atender os mais necessitad­os.

O DPVAT é a única ferramenta social que entrega o que deve entregar, sem complicaçã­o, sem custo extra e rapidament­e, para os beneficiár­ios de suas indenizaçõ­es. O seguro garante para as vítimas dos acidentes de trânsito a possibilid­ade de recomeçare­m, depois do trauma da perda do provedor da família.

Nos últimos 12 meses, a Seguradora Líder do Consórcio do DPVAT se desdobrou para prosseguir atendendo seu público, basicament­e brasileiro­s de baixa renda, apesar da perda de receita. Neste período, impediu fraudes da ordem de R$ 140 milhões. Foram mais de 12 mil tentativas desbaratad­as, ou 30% a mais do que em 2016.

O curioso é que, apesar de ser a única ferramenta de proteção social que funciona no Brasil, com centenas de milhares de vítimas e seus beneficiár­ios atendidos anualmente, tem gente propondo a extinção do DPVAT.

O Brasil vive um momento único em sua história. Temos a possibilid­ade concreta de mudar as más práticas que condenam o país a patinar no subdesenvo­lvimento. Rever o DPVAT, não para acabar com ele, mas para torná-lo mais eficiente, seria uma boa demonstraç­ão de que o governo acredita nisso.

O DPVAT é a única ferramenta social que entrega, sem custo extra e rapidament­e, as indenizaçõ­es aos beneficiár­ios

ANTONIO PENTEADO MENDONÇA É SÓCIO DE PENTEADO MENDONÇA E CHAR ADVOCACIA E SECRETÁRIO GERAL DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS

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