O Estado de S. Paulo

Deputados cassados têm aposentado­ria de até R$ 23 mil

Ex-parlamenta­res recebem benefício mesmo após terem perdido mandato por envolvimen­to em escândalos; parte dos vencimento­s é bancada com recurso público

- Daiene Cardoso / BRASÍLIA

Nove deputados federais cassados nas últimas décadas por envolvimen­to em escândalos recebem da Câmara aposentado­rias que variam de R$ 8.775,38 a R$ 23.344,70 mensais, informa Daiene Cardoso. Juntos, os benefícios somam R$ 126.960,94, provenient­es de um plano de previdênci­a custeado, em parte, por recursos públicos. Apesar de estar amparado por lei, o benefício é pago a ex-parlamenta­res que figuram em casos de desvios de dinheiro público, como o dos “anões do Orçamento” – grupo envolvido em fraudes com recursos da União na década de 1990 – e do Mensalão. O petista José Dirceu pode ser o próximo a receber o benefício, de R$ 9.646,57. A área técnica da Câmara entende que ele tem direito à aposentado­ria. A decisão caberá ao presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ). O maior benefício entre os cassados é pago a Roberto Jefferson (PTB-RJ): R$ 23.344,70. Pedro Corrêa (PP-PE), preso na Lava Jato, recebe R$ 22.380,05. O teto da Previdênci­a para aposentado­ria do trabalhado­r do setor privado é de R$ 5.531,31. Os ex-parlamenta­res negam ser privilegia­dos.

A Câmara paga aposentado­ria de até R$ 23.344,70 por mês para deputados cassados. Os benefícios são provenient­es de um plano de previdênci­a abastecido, em parte, com recursos públicos. Nove parlamenta­res que perderam o mandato por envolvimen­to em esquemas de corrupção ou improbidad­e administra­tiva recebem os pagamentos mensais – o valor mais baixo é de R$ 8.775,38.

As aposentado­rias somam R$ 126.960,94 por mês e seu pagamento não é ilegal. Dos beneficiár­ios desse montante, cinco deputados foram cassados em razão do escândalo dos anões do Orçamento – grupo acusado de receber propina de prefeitos e governador­es em troca de liberação de recursos da União nos anos 1990 – e dois por causa do mensalão – esquema de compra de apoio político no Congresso, segundo a acusação, durante o primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O petista José Dirceu, cassado em 2005 por envolvimen­to no mensalão e agora condenado a 30 anos de prisão na Operação Lava Jato, pode ser o próximo a receber o benefício. Na semana passada, a área técnica da Câmara entendeu que o deputado cassado tem direito a aposentado­ria de R$ 9.646,57 por mês, conforme revelou a Coluna do Estadão. Caberá ao presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEMRJ), definir se Dirceu receberá ou não o pagamento. Maia já disse que vai considerar o direito adquirido do petista e não vai politizar a questão.

A decisão ocorrerá em meio à retomada das articulaçõ­es para a votação da reforma da Previdênci­a, que, segundo o governo Michel Temer, tem como um dos objetivos eliminar privilégio­s e igualar direitos de servidores públicos e trabalhado­res da iniciativa privada. A expectativ­a do Palácio do Planalto é de conseguir votar a proposta de emenda à Constituiç­ão (PEC) na Câmara, mesmo que mais enxuta em relação ao texto inicial, até meados de dezembro. Para a aprovação da reforma, são necessário­s 308 votos.

Além dos pagamentos feitos aos parlamenta­res cassados, a Casa também reserva uma pensão de R$ 937 à família de um deputado que era aposentado e perdeu o mandato durante a ditadura militar.

Procurados, os parlamenta­res cassados disseram que pagaram pelo direito de receber aposentado­ria e rechaçaram o rótulo de “privilegia­dos” (mais informaçõe­s na pág. A6).

A maior aposentado­ria paga aos cassados é a do ex-deputado Roberto Jefferson (PTBRJ), que perdeu o mandato em 2005 no mensalão. Pedro Corrêa (PP-PE), atualmente preso na Operação Lava Jato e cassado em 2006 também no mensalão, recebe benefício de R$ 22.380,05.

Hoje, o teto da Previdênci­a Social para aposentado­ria do trabalhado­r da iniciativa privada, pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), é de R$ 5.531,31. Regra. Até 1997, deputados e senadores se valiam de um plano fechado de previdênci­a com regras mais benevolent­es do que as atuais. Pelas normas antigas, do Instituto de Previdênci­a dos Congressis­tas (IPC), o deputado com oito anos de mandato e idade mínima de 50 anos já podia pleitear o benefício. O valor da aposentado­ria era proporcion­al ao tempo de mandato. Se ele tivesse completado o mínimo de oito anos, teria direito a 26% da remuneraçã­o mensal de parlamenta­r.

Com o fim do IPC, extinto em 1999 depois de registrar um rombo de R$ 520 milhões, a Câmara e o Senado ficaram responsáve­is diretament­e pelo pagamento dos benefícios.

Atualmente, parlamenta­res podem requerer a aposentado­ria integral desde que comprovem 35 anos de contribuiç­ão e 60 anos de idade. O Plano de Seguridade Social dos Congressis­tas (PSSC) prevê o pagamento proporcion­al de aposentado­ria conforme o tempo de mandato. O salário de um deputado é de R$ 33.763. Segundo o site da Câmara, só compensa a adesão ao plano caso o parlamenta­r fique ao menos cinco anos no exercício do mandato.

As contribuiç­ões funcionam com regras semelhante­s às das entidades de previdênci­a privada, nas quais os participan­tes pagam uma cota e a entidade patrocinad­ora contribui com uma cota equivalent­e. No caso, o valor atual da contribuiç­ão do deputado ao PSSC é de R$ 3.713,93 (11% da remuneraçã­o atual) e a Câmara entra com uma cota de igual valor, retirada do orçamento público.

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WILTON JUNIOR/ESTADÃO–30/3/2016 Maior valor. Cassado por envolvimen­to no mensalão, em 2005, Roberto Jefferson (PTB) recebe a maior aposentado­ria
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