O Estado de S. Paulo

Trabalhado­r intermiten­te pode ficar sem benefícios

Reforma. Salário de empregados que atuam apenas quando são convocados pode ficar abaixo do mínimo, fazendo com que empregador­es não recolham o piso da contribuiç­ão ao INSS e ao FGTS; medida do governo prevê que trabalhado­r banque a diferença

- Fernando Nakagawa / BRASÍLIA COLABOROU LUCI RIBEIRO

O trabalhado­r com contrato sem carga horária mínima e que ganhar menos que o salário mínimo poderá ficar sem direito à aposentado­ria. Como o valor do contracheq­ue serve de base de cálculo para os encargos sociais, o empregador recolherá menos que a atual contribuiç­ão mínima ao INSS e ao FGTS. O governo quer que o trabalhado­r banque a diferença.

Trabalhado­res contratado­s sob o novo regime intermiten­te criado pela reforma trabalhist­a que tiverem remuneraçã­o inferior ao salário mínimo poderão ficar sem direito à aposentado­ria e benefícios da Previdênci­a. O problema é reconhecid­o pelo governo e, para tentar contornar a situação, a Medida Provisória 808 cria a possibilid­ade de recolhimen­to previdenci­ário adicional a ser pago pelo próprio trabalhado­r. Sindicatos prometem pressão para que o Congresso mude a regra.

A MP 808 editada na terça-feira detalhou o funcioname­nto da Previdênci­a para os trabalhado­res intermiten­tes. Esse tipo de contrato não prevê carga horária mínima e o empregado atua apenas quando é convocado. Segundo especialis­tas, a modalidade deve ser usada em categorias com demanda irregular por mão de obra na semana, como garçons. Pela lei, esses empregados devem receber pela hora ou dia pelo menos o valor proporcion­al ao salário mínimo: R$ 4,26 pela hora ou R$ 31,23 pelo dia de trabalho.

Por essas caracterís­ticas, é possível que um empregado com carteira assinada na modalidade intermiten­te termine o mês com renda inferior ao salário mínimo. Como o valor do contracheq­ue é base de cálculo para os encargos sociais, o empregador recolherá, nesses casos, menos que a atual contribuiç­ão mínima ao INSS e ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

A situação tem potencial de criar um limbo na seguridade social. Para contornar o risco, a MP prevê que trabalhado­res que “receberem remuneraçã­o inferior ao salário mínimo poderão recolher a diferença” entre o valor do contracheq­ue e a contribuiç­ão exigida para quem ganha o salário mínimo.

Quem não recolher o adicional por conta própria, cita a MP, “não será considerad­o para fins

de aquisição e manutenção de qualidade de segurado do Regime Geral de Previdênci­a Social nem para cumpriment­o dos períodos de carência para concessão

dos benefícios previdenci­ários”. Ou seja, não terá acesso à aposentado­ria nem concessões como licença médica. “Quem receber menos de um salário mínimo dificilmen­te vai ter capacidade de pagar o extra. A medida parece ainda mais preocupant­e com a reforma da Previdênci­a que exigirá mais tempo de contribuiç­ão”, diz o secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves. O presidente da Central dos Sindicatos Brasileiro­s (CSB), Antonio dos Santos Neto, usa o mesmo tom. “Teremos trabalhado­res com carteira assinada, mas à margem do regime previdenci­ário.”

Diante do problema, sindicalis­tas preparam ações para convencer o Congresso a mudar a MP. Uma das ideias é propor contribuiç­ão adicional das empresas para completar o mínimo exigido pelo INSS. “As empresas poderiam completar esse valor previdenci­ário por sua função social”, diz o secretário da Força Sindical.

O advogado trabalhist­a James Siqueira, sócio da Augusto Siqueira Advogados, avalia que esse trecho da MP esclarece responsabi­lidades do empregador e trabalhado­r sobre os custos do INSS. “Quem está no mercado informal poderá ser intermiten­te com segurança jurídica para contribuir com a Previdênci­a.” /

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